Rodoviária de Juiz de Fora terá câmeras com reconhecimento facial
Revista pessoal indiscriminada não é autorizada por lei, mas empresa investe em sistema de segurança interligado com órgãos públicos
O sequestro de um ônibus interestadual na última terça-feira (12) no Terminal Rodoviário Novo Rio, que deixou gravemente ferido o morador de Juiz de Fora Bruno Lima da Costa Soares, de 34 anos, baleado por três tiros no tórax, acendeu a discussão sobre a segurança nas rodoviárias e a circulação de armas. De acordo com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), “a responsabilidade sobre a administração de terminais rodoviários ou fiscalização de concessão dos espaços é dos estados ou prefeituras”. Desta forma, a ANTT não é responsável por regulamentar o funcionamento e a segurança desses locais, e não há legislação que autorize a revista pessoal indiscriminada de passageiros, como acontece nos aeroportos.
Em Juiz de Fora, depois de 18 meses de contrato emergencial, a AMD Services assinou, em outubro do ano passado, novo termo de concessão com a Prefeitura (PJF) para continuar prestando serviços no Terminal Rodoviário Miguel Mansur. O acordo com a empresa sediada na própria cidade tem duração de dez anos e pode ser renovado pelo mesmo período, sendo a segurança interna de responsabilidade da gestora.
Na época, o diretor da AMD Services, Marco Nicolau, divulgou algumas das ações previstas, entre elas a instalação de câmeras com reconhecimento facial ligado diretamente ao sistema de segurança pública do Município e do Estado, para inibir a passagem de pessoas procuradas pela Justiça, por exemplo. Em entrevista à Tribuna nesta quarta (13), Marco assegurou que o projeto está em andamento. “Vamos começar a colocar o sistema em funcionamento. Assinamos contrato nesta semana com o fornecedor, que já tem o sistema utilizado pelos órgãos públicos. Todas as câmeras do terminal serão capazes de fazer o reconhecimento e, à medida que formos avaliando outros pontos de risco, vulnerabilidade, vamos introduzindo outras”.
Segundo o diretor da AMD Services, atualmente há cerca de 40 equipamentos de vigilância instalados em diversas áreas do Terminal Miguel Mansur, por onde circulam, diariamente, cerca de seis mil passageiros, chegando a dez mil em picos de feriados. A população flutuante diária também alcança esse mesmo número, se forem levados em conta os acompanhantes, trabalhadores, moradores do entorno que utilizam o espaço como passagem e usuários de serviços existentes no local, como o INSS. As câmeras atuais serão adaptadas à tecnologia por meio de softwares, enquanto outras já contarão com o recurso de inteligência artificial (IA).
Paradas fora da rodoviária dificultam controle
O diretor da concessionária que administra o Terminal Miguel Mansur, Marco Nicolau, ressalta que as rodoviárias não têm a mesma norma de segurança dos aeroportos, os quais possuem canais de inspeção. “Não existe isso para verificar se a pessoa está armada, não podemos fiscalizar, abrir mala, usar detector de metais, porque também é um meio de revista, e não tem lei que autorize, é um poder de polícia. Para que isso acontecesse, teria que ser através de lei, e acho que é o momento de se discutir isso, porque há segurança no transporte aéreo, enquanto o ilícito vai pelo rodoviário”. A dificuldade, ele pondera, estaria no fato de que os ônibus fazem paradas no decorrer dos trajetos, como para alimentação, o que não garantiria em 100% a segurança, por mais tecnologia que houvesse na rodoviária, além dos casos de embarque e desembarque fora dos terminais. “No caso dos aeroportos, há regulamentação pela Anac, então deveria ter regulação por parte da ANTT também”, sugere.
Para além das câmeras, a AMD Services projeta, em uma reforma futura, criar uma base para os órgãos de segurança pública poderem atuar com mais conforto no Terminal Rodoviário Miguel Mansur. “Já temos contato com Guarda Municipal (GM), Polícia Militar, Samu e Bombeiros, que chegam rapidamente ao terminal. A resposta é rápida, dependendo da demanda. A GM chega em primeiro lugar, porque é área do município. Mas, depois, com a integração do sistema, vai mudar a forma de trabalhar com eles, porque vão passar a ter acesso ao sistema, e a resposta será mais rápida”, acredita Marco. “Nos próximos anos, a rodoviária de Juiz de Fora vai ser uma das mais modernas e seguras do país”, vislumbra.
Estado faz abordagens a ônibus interestaduais nas rodovias
Questionada sobre a segurança no transporte público rodoviário, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) informa que diversas ações preventivas, repressivas e de inteligência voltadas ao combate à criminalidade são realizadas pelas forças de segurança do estado, incluindo abordagens a ônibus interestaduais nas rodovias, por parte da Polícia Militar, com o objetivo de coibir o tráfico de drogas e armas e prender foragidos da Justiça.
“Especificamente em relação aos terminais rodoviários, o policiamento no entorno é uma importante e eficaz ação para a inibição de atos criminosos. A atuação dentro dos terminais ocorre quando a corporação é acionada”, destaca. A Sejusp acrescenta que os usuários desses locais também podem auxiliar as forças de segurança, denunciando possíveis situações suspeitas, por meio do Disque Denúncia Unificado 181. “A denúncia é colhida de forma totalmente anônima”.
Já a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) diz que “a responsabilidade da segurança do Terminal Rodoviário Miguel Mansur é da empresa que administra o local, conforme está previsto no edital de concessão”.
Professor defende políticas de segurança para rodoviárias
Professor da Faculdade de Comunicação da UFJF e pesquisador do Núcleo de Estudos em Politicas de Drogas, Violência e Direitos Humanos (NEVIDH-UFJF), Ricardo Bedendo avalia que a ocorrência violenta na rodoviária do Rio de Janeiro não mobilizou apenas a polícia, pois impactou diversos setores. “Se observarmos o contexto e as consequências do fato, o sistema de saúde foi afetado, porque houve pessoas feridas; a economia foi atingida, porque as empresas de ônibus e as lojas da rodoviária e da região pararam; houve restrição da mobilidade urbana, e a vida social ficou prejudicada; a própria polícia, que mobilizou 200 homens, poderia estar fazendo outro trabalho preventivo; além da Justiça, porque o cidadão (sequestrador) estava descumprindo o uso da tornozeleira eletrônica”.
No caso específico das rodoviárias, ele aponta a necessidade urgente de políticas de segurança para esses espaços, principalmente nas grandes e médias cidades, como Juiz de Fora, assim como acontece nos aeroportos. “Talvez a partir dos próprios editais de contratação dessas empresas que administram, mas esses editais precisam estar pautados em uma política nacional. Isso é importante para não termos outros episódios como esse”.
Instalar câmeras, na visão dele, é uma boa iniciativa, mas não resolve a questão. “A fiscalização é importante, necessária e fundamental em relação às políticas de acesso às armas de fogo no nosso país (…) É preciso desconstruir essa cultura de uma parcela da população que acredita nas fake news de que as pessoas armadas vão melhorar o cenário da segurança pública”.