Apesar de R$ 16 milhões gastos, obras de teleférico e trenó de montanha da UFJF seguem paradas
Estudo de viabilidade econômica e financeira projeta gastos superiores a R$ 19 milhões caso UFJF instale equipamentos. Valor global do contrato com a Topus Construtora S/A supera R$ 30 milhões
Inicialmente prevista para ser entregue em julho de 2014, a construção do teleférico e do trenó de montanha do Jardim Botânico da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) segue paralisada. O contrato firmado entre a instituição e a Topus Construtora S/A – 192/2012 – é objeto de ação cível, ainda em tramitação, na 2ª Vara Federal de Juiz de Fora. A empresa pleiteia a rescisão contratual e indenização da UFJF por danos materiais na ordem de R$ 5 milhões. Ainda que o Jardim Botânico tenha sido inaugurado, em abril último, sem as estruturas, a instituição soma, entre 2014 e 2016, R$ 16.176.005,26 em repasses à Topus, referentes aos R$ 30.580.297,89 do valor global do contrato, conforme registrado no Portal da Transparência. Entretanto, há obras inacabadas e, outras, nem iniciadas. Em relatório técnico de análise de viabilidade da instalação do teleférico e do trenó de montanha, a universidade projeta investimento de R$ 19.553.073 em caso de instalação, ou de R$ 14.172.187, apenas para finalizar as obras para outro fim.
Com o contrato paralisado, a indefinição sobre a instalação e a operação do trenó de montanha e do teleférico cresce. Enquanto o trenó encontra-se armazenado em depósitos do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (Caed), no Campus de Juiz de Fora, as cabines do teleférico permanecem, há cinco anos, armazenadas em contêineres em Dübendorf, Suíça, sob a responsabilidade da fabricante Rowema AG, como confirmado à Tribuna pelo seu gerente geral, Andreas Knapp. Questionada pela Tribuna sobre os equipamentos, a UFJF pondera, em nota, que “toda decisão da instalação do teleférico ou do trenó de montanha será objeto de deliberação do Conselho Superior (Consu) e dos órgãos técnicos do Jardim Botânico, respeitadas as decisões judiciais. (…) Quer dizer, só depois de vencida a questão judicial haverá a possibilidade de garantias institucionais para a importação”. Indagada, por sua vez, sobre os valores dispendidos mensalmente para a manutenção das cabines junto à empresa suíça, a UFJF não respondeu.
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Como manifestado em juízo pela Topus, o impacto de entraves burocráticos da UFJF na execução do cronograma físico-financeiro originalmente pactuado e o desequilíbrio econômico-financeiro contratual levaram-na, em maio de 2017, a ajuizar ação em busca de indenização por danos materiais, além da rescisão contratual. Em junho daquele ano, o juiz da 2ª Vara Federal, Marcelo Motta de Oliveira, concedeu tutela de urgência parcial favorável à Topus, suspendendo as obrigações da empresa em importar as cabines do teleférico. Procurada pela Tribuna, a Topus Construtora S/A limitou-se, também em nota, a declarar que “o contrato em questão é objeto de ação que tramita na Justiça Federal de Juiz de Fora”. O acordo entre a UFJF e a Topus foi celebrado ainda durante a administração do reitor de Henrique Duque.
Após a decisão, a UFJF, portanto, passou a ser responsável pelas “despesas e encargos decorrentes da manutenção do bem adquirido e armazenado junto ao fabricante; cabendo-lhe decidir e executar as medidas necessárias para sua guarda ou conservação; ou, ainda, proceder sua alienação ou importação”. A instituição impetrou agravo de instrumento contra a decisão, mas o recurso ainda não foi julgado. O processo está em fase de instrução, e, por isso, de acordo com a Seção Judiciária de Minas Gerais, “não há previsão para prolação de sentença, (…) estando pendente de decisão sobre as provas requeridas pelas partes”. Conforme a Justiça Federal, foi tentada a conciliação em três audiências, mas sem acordo.
Obras inacabadas
Diante da incerteza sobre o projeto de instalação dos equipamentos, a UFJF estabeleceu uma comissão para produzir um relatório técnico a partir da análise da viabilidade econômica e financeira de ambos. O grupo é formado por professores da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis e servidores da Pró-Reitoria de Infraestrutura e Gestão. A Tribuna obteve, por meio da Lei de Acesso à Informação, o relatório apresentado, em agosto de 2018, à Administração Superior. Se as obras civis do teleférico estão praticamente finalizadas, “faltando apenas as instalações elétricas, hidráulicas, incêndio, metais e acabamento”, as do trenó de montanha, em contrapartida, “carecem ainda de serem iniciadas”, bem como os trabalhos referentes aos componentes de infraestrutura elétrica.
De acordo com o documento, a maioria das obras de infraestrutura foi executada pressupondo também a integração entre a sua operação e áreas social do Jardim Botânico, como a estação de lançamento, localizada no Bairros Santa Terezinha. “A estação motriz (de lançamento) foi projetada para comportar não só parte das instalações e infraestrutura necessária à operação do teleférico, mas também como área social do Jardim Botânico, de modo que na mesma edificação estão previstas a instalação de lanchonete, sala de recepção, bilheteria, entre outros.” Entretanto, o grupo de trabalho ressalta que, ao contrário da estação de lançamento, “a estação de reenvio foi projetada principalmente para este fim, sendo impactada diretamente pela definição do destino dado a ela (sic)”.
A Topus informou, nos autos do processo, ter repassado à Rowema, em novembro de 2016, o valor integral referente ao equipamento, mas, “por absoluta ausência de recursos orçamentários (da UFJF), não tem condições de arcar com os custos da importação do produto”. Questionada pela Tribuna, a UFJF relata que, ainda em outubro de 2013, “fez um adiantamento no valor de R$ 6.417.912,97 à Topus Engenharia S/A a título de quitação parcial do teleférico e trenó de montanha, projetos executivos e despesas de importação. (…) Especificamente sobre o teleférico, ainda restam aproximadamente R$ 1 milhão para quitação final, referente ao seu residual, acrescidos de R$ 150 mil para transporte e seguros”.
No entanto, os trabalhos referentes ao trenó de montanha encontram-se em situação mais delicada. Além de a infraestrutura civil e elétrica não ter sido iniciada, a UFJF precisará, em caso de eventual construção, obter novo Documento Autorizativo para Intervenção Ambiental junto à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais, uma vez que “trata-se de uma área de montanha já coberta pela vegetação” e a autorização anteriormente pleiteada já vencera. Além disso, segundo o relatório técnico, houve a necessidade de alteração da estação de nível inferior e a criação de uma estação em nível superior do projeto inicial do trenó. “A estação do trenó de montanha foi inicialmente projetada contemplando apenas uma edificação. Esta situação não atendia às necessidades para as quais o equipamento foi projetado, ou seja, dar acesso à área superior do Jardim Botânico, região onde havia a previsão de serem instaladas coleções de vegetações específicas.” A instalação do trenó será permitida somente se atestada a sua viabilidade ambiental.
Problemas
Procurada pela Tribuna, a UFJF pontuou que inúmeros problemas, ao longo da obra, comprometeram sua plena realização. “A obra em questão, com ordem de serviço em 21 de dezembro de 2012, apresentou na sua origem diversos problemas, como, por exemplo, ausência de propriedade da UFJF do terreno localizado no Mirante do Alto Eldorado, local destinado à execução do contrato; altura das torres x copa das árvores, que demandou ajuste na altura; e incompatibilidade de projetos arquitetônicos, estrutural e complementares.” Na ação impetrada, a Topus enumerou eventos como “a demora na formalização de processo destinado à aquisição da área da estação de reenvio (do teleférico) (apenas em maio de 2014); o atraso na obtenção do licenciamento ambiental (em maio de 2015); o replanejamento do contrato por insuficiência de recursos (em outubro de 2015); o atraso no pagamento pela UFJF; bem como as sucessivas revisões de projeto determinadas pela UFJF, diante da inadequação e incompatibilidade com as condições do local de sua execução” para embasar questionamento sobre entraves burocráticos responsáveis por atrasar o cronograma inicial da obra.
Gastos com eventual instalação
Além do montante de R$ 16 milhões já pagos à Topus Construtora S/A, o estudo de viabilidade econômica da instalação do teleférico e do trenó de montanha projeta dois cenários distintos de investimentos necessários às obras. Ao passo que o primeiro prevê gastos adicionais somente com a instalação, o segundo estima custos apenas para a adequação dos espaços para utilização distinta da que a originalmente pensada. No primeiro cenário, a estimativa aponta para gastos totais de R$ 14.904.725, referente ao teleférico, e R$ 4.648.348, ao trenó de montanha. No segundo, por sua vez, de não implantação, os gastos cairiam para, respectivamente, R$ 9.896.368 e R$ 4.275.819. Isto é, mesmo não implantados, os equipamentos exigirão gastos à UFJF para finalizar as edificações.
A quantidade é significativamente reduzida porque os custos iniciais, isto é, os “gastos necessários para a finalização das obras e montagem da estrutura”, caem. No caso do trenó de montanha, por exemplo, caso venha a optar pela não implementação, a UFJF economizaria R$ 372.529 em despesas que seriam direcionadas à construção das estações de embarque e desembarque. Já em relação ao teleférico, a economia seria de R$ 4.501.584, previstos para a finalização das estações de lançamento e reenvio. O relatório, entretanto, não contabiliza os custos de armazenamento do trenó e do teleférico, respectivamente, no campus sede e na Suíça.
Como os equipamentos têm vida útil de 20 anos – período considerado, uma vez que, depois, “supõe-se que os equipamentos não terão valor recuperável e as obras civis precisem de reestruturação” -, o relatório técnico levanta também a arrecadação anual necessária à UFJF ao longo da vida útil dos equipamentos para recuperar o investimento, bem como suportar os gastos originados pela operação. Em caso de implantação, por exemplo, a UFJF necessitaria arrecadar, por ano, para cobrir as despesas do teleférico e do trenó de montanha, respectivamente, R$ 1.352.699 e R$ 421.867. Já em caso de não implantação, as somas cairiam para R$ 898.159 e R$ 388.058.
Exploração comercial
Em razão dos custos anuais, o grupo de trabalho simula, por fim, uma tabela de “valores dos ingressos individuais do trenó e do teleférico a serem revertidos à UFJF como compensação” em caso de opção da instituição por explorar comercialmente os equipamentos por meio de concessão onerosa. As simulações também seguiram os cenários anteriormente projetados. Caso o Jardim Botânico atinja a sua capacidade máxima diária – 300 visitantes – nos cinco dias por semana em que funciona, a UFJF cobriria os custos anuais ao cobrar, por viagem, R$ 5,41 do trenó de montanha e R$ 17,34 do teleférico, conforme a tabela. Em caso de eventual utilização das estruturas para outros fins, os valores suficientes para as despesas anuais seriam, respectivamente, R$ 4,98 e R$ 11,51. Para tanto, o Jardim Botânico deveria receber 1.500 visitas semanais e 78 mil anuais.