Cobertura de vacinas infantis está abaixo da meta em JF desde 2019

Aplicação dos nove imunizantes obrigatórios não atingiu 90% do público-alvo; índices do município são inferiores às médias nacional e estadual


Por Gabriel Silva, sob supervisão da editora Rafaela Carvalho

04/11/2021 às 07h43

A cobertura vacinal dos principais imunizantes voltados ao público infantil passa pelo momento de pior baixa em Juiz de Fora. Dados do Programa Nacional de Imunizações (PNI) emitidos pelo Datasus mostram que nenhuma das nove vacinas infantis obrigatórias atingiu a meta de 90% do público-alvo em 2019 e 2020 em Juiz de Fora. As taxas de vacinação foram as menores nos dois últimos anos desde o início do monitoramento do Ministério da Saúde (MS) no município, em 1997.

As vacinas obrigatórias para o público infantil, conforme o PNI, são a BCG, a tríplice viral e os imunizantes contra as hepatites A e B, febre amarela e rotavírus, além da meningocócica C (protege contra a meningite C), da pneumocócica (atua contra dez subtipos da bactéria pneumococo) e da pentavalente (protege contra hepatite B, coqueluche, tétano, difteria e bactéria Haemophilus tipo B). Em 2019 e em 2020, todos os nove imunizantes atingiram menos de 70% de cobertura vacinal do público-alvo em Juiz de Fora.

Para além da dificuldade de alcançar a meta de vacinação, algumas das vacinas tiveram quedas drásticas na procura em comparação com anos anteriores. É o caso da BCG, que protege contra formas graves da tuberculose. O imunizante, que é aplicado no primeiro mês de vida da criança, atendeu a 62,47% do público-alvo em Juiz de Fora em 2020, sendo que, em 2019, apenas 43,56% dos bebês receberam a vacina. Restando dois meses para o fim de 2021, 31,17% das crianças que deveriam receber a dose foram imunizadas neste ano, conforme dados parciais coletados nesta quarta-feira (3).

Uma observação importante é que, entre 1997 e 2019, a aplicação da vacina BCG nunca havia deixado de atender à totalidade do público-alvo em Juiz de Fora (ver arte), segundo os dados do Datasus. Em 2018, por exemplo, a cobertura foi de 120,53%. Ou seja, naquele ano, a imunização atingiu um público superior ao que era tido como prioritário para a vacina.

O Datasus também mostra que a maior cobertura vacinal entre os nove principais imunizantes foi atingida com a primeira dose da tríplice viral, em 2019. Naquele ano, 67,81% do público-alvo foi atendido em Juiz de Fora, número que caiu para 63,36% em 2020. Em 2021, até esta quarta, a porcentagem era de 41,20%.

Comparação

A cobertura vacinal juiz-forana dos nove imunizantes obrigatórios para o público infantil é baixa mesmo se comparada às médias mineira e brasileira. Durante os anos de pandemia, entre 2020 e 2021, Minas Gerais e o Brasil também tiveram dificuldades para alcançar o patamar desejável de 90% do público-alvo atingido. Entretanto, os índices estadual e nacional se mostram mais positivos do que o juiz-forano.

Em Minas, todas as nove principais vacinas chegaram a mais de 80% das pessoas pretendidas em 2020. Já os dados parciais de 2021 apontam para cobertura próxima ou superior a 60% no estado para todos os nove imunizantes. No Brasil, a porcentagem é inferior à estadual, mas fica acima da taxa municipal. Com a exceção da vacina contra a febre amarela, que teve cobertura vacinal de 57,18%, todas as outras oito vacinas atingiram mais de 70% do público-alvo no último ano. Os dados parciais de 2021 apontam para taxas entre 50% e 58% de cobertura a nível nacional.

PJF admite cobertura baixa, mas alega subnotificação

Em nota, a Secretaria de Saúde de Juiz de Fora admitiu que a cobertura vacinal sofre queda nos últimos anos. “Os motivos são vários, eles vão desde a percepção enganosa de parte da população de que não é preciso mais vacinar porque as doenças teriam desaparecido, passando pelas campanhas antivacinação surgidas nos últimos anos e chegando ao impacto da pandemia”, enumera.

Entretanto, a pasta municipal também alega haver subnotificação nos dados locais. Uma das razões para tal, segundo a Prefeitura, é a mudança na plataforma de informação ao PNI, “antes alimentado pelas doses aplicadas, passando para o registro nominal”. Outro problema apontado pelo Executivo municipal é o aumento na demanda de trabalho das unidades de saúde durante a pandemia, o que deixa a rotina dos funcionários mais atribulada e, de acordo com a PJF, “muitas vezes não é possível subir os dados da multivacinação no sistema do SUS, o que leva a uma subnotificação das vacinas aplicadas”.

Impacto pode ser sentido nos próximos anos

“A queda da cobertura vacinal pode comprometer toda a saúde pública do Brasil”. É assim que, de imediato, o alergista e imunologista Fernando Aarestrup define os possíveis impactos da baixa cobertura. O especialista lembra que a imunização levou ao controle de doenças infecciosas como sarampo, HPV, febre amarela, tuberculose e pneumonia bacteriana. O progresso na área, dessa forma, é colocado em risco em momentos de baixa na aplicação das vacinas. “Podemos ter futuramente o retorno de doenças infecciosas que foram completamente controladas. Temos que orientar a população da nossa região. A Covid-19 não é a única ameaça para a saúde das pessoas”, alerta Aarestrup.

Apesar de significar um alto risco para a saúde coletiva, os efeitos da queda vacinal atual serão sentidos no futuro, de acordo com o imunologista. “O impacto da perda da cobertura vacinal será observado nos próximos anos, e não imediatamente, pois quando vacinamos as pessoas criamos uma imunidade coletiva que depende da continuação das estratégias de imunização”, explica.

Para Aarestrup, as estratégias de vacinação devem ser políticas de Estado, de modo que se mantenham constantes independentemente de quem estiver chefiando o Governo. A solução, na visão do especialista, passa por atuação conjunta na conscientização e no incentivo para que as pessoas voltem a procurar os postos. “Profissionais de saúde, imprensa e governo devem atuar juntos nessa missão de demonstrar que a imunização para várias doenças infecciosas é a única maneira de salvar vidas e promover uma proteção coletiva”, aponta.

Campanha de multivacinação continua

Com tendência de piora na cobertura vacinal em 2021, após já ficar abaixo da meta em 2020, ano em que a pandemia influenciou a baixa procura por vacinas, todo o país segue longe da meta de colocar a caderneta de vacinação de 90% de crianças e adolescentes menores de 14 anos de idade em dia. Por esse motivo, os meses de outubro e novembro são marcados pela realização da Campanha Nacional de Multivacinação.

Em Minas Gerais, os postos de vacinação tiveram horário de funcionamento diferenciado nos dias 2 e 16 de outubro. Mesmo assim, a situação ainda preocupa. No último dia 14, o secretário de Estado de Saúde, Fábio Baccheretti, fez um apelo para que as famílias procurassem regularizar a imunização das crianças. “Lembrando, aos pais de crianças: vamos buscar a vacinação de todas as doenças. Nós temos vacinas disponíveis para todas as crianças (…). Quem ainda não vacinou o seu filho, busque essa vacinação porque são doenças evitáveis por vacina. Não tem como a gente esquecer que existem outras doenças (além da Covid-19)”, disse Baccheretti.

A campanha tinha previsão terminar em 29 de outubro. Entretanto, o Ministério da Saúde decidiu prorrogar a ação até 30 de novembro. Em todo o Brasil, a pasta contabiliza 3,2 milhões de doses aplicadas. Minas Gerais representa mais de 260 mil doses desse total, o que coloca o estado como o terceiro que mais vacinou durante a campanha, atrás de São Paulo (450 mil doses aplicadas) e Bahia (280 mil).

A Secretaria de Saúde da Prefeitura de Juiz de Fora (SS/PJF) foi questionada pela reportagem sobre o nível de adesão dos juiz-foranos à campanha, mas não respondeu. Por outro lado, informou que trabalhou na divulgação da campanha pelas redes sociais, pelo site da PJF e pela imprensa.

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