Condição do transporte público em Juiz de Fora ainda é alvo de críticas
Problemas com horários, rotas, troca e recarga de cartões e a estrutura física dos ônibus foram os mais citados pela população à Tribuna
As dificuldades enfrentadas pelos usuários do transporte público são reais e diárias, muito em função das limitações dos modos de transporte público e de prioridades de ações que costumam privilegiar os usuários e os proprietários de veículos individuais.
A mobilidade urbana interfere na vida de todos os cidadãos, particularmente com a falta de disponibilidade de modos diferenciados de transporte público e a precariedade, muitas vezes percebida por quem depende do sistema.
Em menos de um mês, dois ônibus de circulação municipal foram motivo de atenção ao pegarem fogo durante a operação, preocupando quem depende do modal no dia a dia. Por isso, a Tribuna foi às ruas para ouvir usuários sobre as condições e os problemas enfrentados ao utilizar o sistema.
Entre as várias reclamações, a condição das carrocerias, a falta de manutenção, a falta de precisão no rastreio dos ônibus, a falta de compromisso com horário e rota das linhas, a retirada de pontos de ônibus importantes para o deslocamento daqueles que necessitam de mais de uma linha para concluir seu trajeto e, recentemente, a dificuldade e a demora no processo de troca do cartão antigo para o novo “Moov” são as mais frequentes entre os usuários
Rotas
Alguns moradores da Cidade Alta, usuários da linha 548 (Adolpho Vireque / Jardim Casa Blanca / Morada do Serro), reclamaram da alta rotatividade de motoristas que têm contribuído para o descumprimento da rota prevista.
“Saindo do Vireque, a linha, no horário de 12h50, prevê extensão até a Escola Municipal Tancredo Neves. No entanto, desde que as obras da BR 440 foram iniciadas, o prolongamento do trajeto só é executado por alguns motoristas. A questão é que os motoristas antigos sabem dessa extensão, os novatos, não. Os usuários têm que contar com a boa vontade do motorista, para fazer valer o seu direito de seguir no trajeto previsto”, comentou uma usuária do 548, que preferiu não ser identificada.
Ela ainda acrescentou que, independente do período de férias escolares, há passageiros que só utilizam o ônibus devido à extensão prevista que, muitas vezes, não é cumprida, fazendo os usuários pagarem passagem em vão.
Tatiane Lopes Eurico é moradora do Bairro Borboleta e trabalha em São Pedro, bairro vizinho ao seu, e, ainda sim, precisa pegar dois ônibus, aumentando seu gasto e o tempo de transporte. Para ela, a rota estipulada de algumas linhas não atende as necessidades dos usuários.
Na avaliação dela, se a rota de algumas linhas fosse revista, de forma a contemplar também o São Pedro, os trabalhadores não precisariam ficar esperando muito tempo para pegar outro ônibus, que costuma estar cheio. “Seria importante ampliar a rota tanto do 514 quanto do 516, para fazer o trajeto de forma mais abrangente, pegando mais passageiros e atendendo melhor as necessidades deles. Eu, por exemplo, conseguiria pagar apenas duas passagens ao invés de quatro.”
Estrutura física dos carros
Outra queixa relatada à Tribuna é que diversas linhas não contam mais com acompanhamento em tempo real por GPS, o que faz com que o horário de parada nos pontos seja sempre estimado e, na maioria das vezes, não condizente com a realidade devido ao trânsito e a possíveis imprevistos na rota.
Em entrevista, o Consórcio Via JF, responsável pelo transporte público na cidade, disse estar dentro dos padrões da PJF. “Nós estamos dentro dos parâmetros definidos pela PJF para cumprimento de horários. Existe um trabalho sendo feito pela Secretaria de Mobilidade Urbana (SMU) no sentido de corrigir algumas questões que dizem respeito ao trânsito mesmo – para que esses horários se cumpram de forma mais assertiva possível.”
A SMU, ao ser questionada sobre as reclamações de não cumprimento de horários e rotas, disse que fiscaliza o respeito às normas previstas. “A fiscalização da SMU também é ativa e atua junto aos problemas relacionados a veículos e também ao não cumprimento de horários e itinerários.”
Tatiane também relatou à Tribuna as dificuldades de locomoção que ela enfrenta no trajeto entre a sua casa e o seu local de trabalho. “Eles (ônibus) não atendem a atualidade que nós vivemos. Hoje a demanda de passageiros aumentou e os ônibus, além de estarem antigos, muitas vezes estão em estado precário.”
A reclamação sobre a estrutura física dos ônibus vai além do conforto. “Muitas das vezes, consegue deixar até os usuários no meio do caminho, tendo que fazer uma baldeação para um outro transporte devido a situação do carro estar precária”, disse Tatiane à Tribuna.
Idade da frota
Apesar de o contrato, firmado em 2016 entre o Consórcio Via JF e a Prefeitura de Juiz de Fora, prever que os ônibus utilizados na frota municipal não devem ultrapassar os dez anos de uso, sendo a média máxima de cinco anos, não é raro ver carrocerias anteriores a 2014 rodando pela cidade, principalmente em bairros afastados. O professor da UFJF Fabio Lima, especialista em mobilidade urbana e coordenador do grupo urbanismo.mg, explicou como os ônibus com maior tempo de uso impactam a mobilidade da cidade.
“Se em outras cidades, como Belo Horizonte e São Paulo, o tempo de uso é de cinco anos, Juiz de Fora deveria adotar o mesmo critério, considerando o fato de ser uma cidade polo. O tempo de uso reduzido vai significar mais conforto e segurança para os cidadãos. Além disso, há a questão da emissão de gases poluentes. Cabe ressaltar que, quanto mais obsoleto, em termos de uso, mais sujeito a defeitos e a emissões maiores de poluentes fica o veículo.”
Ao ser questionada sobre a manutenção dos carros e a fiscalização das condições dos ônibus, a Secretaria de Mobilidade Urbana afirmou que a manutenção é realizada periodicamente pelas empresas responsáveis, além da vistoria anual na frota. “Além da fiscalização preventiva da SMU, as empresas prestam contas rotineiramente sobre a manutenção dos carros.”
Moov
A troca dos antigos cartões de vale-transporte pelo novo cartão Moov também gera dor de cabeça a usuários. A professora Ana Paula Fernandes reclama da demora no atendimento para troca. “Eu e minha filha ficamos 1h15 na fila do lado de fora só para entrar e pegar uma senha. Eu peguei a senha 101 pra trocar o cartão – e estava na 38.” Segundo Ana Paula, na falta de estrutura para atender a demanda de usuários, muitas pessoas tiveram de sentar no chão.
“Devia ter umas duas mil pessoas lá dentro. Os idosos sentados no chão, as pessoas com deficiência, também. Mesmo com as filas preferenciais, eles não estavam sendo atendidos a tempo.” Ana Paula e sua filha passaram cinco horas dentro da unidade, o que consideram uma situação absurda.
‘Condição exclusiva e limitada’
Mesmo com todos os problemas que o transporte público apresenta na cidade, para o professor Fábio Lima, uma possível solução seria a integração de novos modais. “Em Juiz de Fora, temos apenas o transporte rodoviário, sendo que a cidade já teve no passado o transporte ferroviário e o bonde. Além da limitação dos modos possíveis, estes não se mostram suficientes nos horários de maior demanda. Outros modos a serem pensados são o metrô de superfície, o teleférico e o transporte hidroviário. Ou seja, falta um planejamento que consiga reverter essa condição exclusiva e limitada do transporte público na cidade.”
Para ele, com a implementação de modos diferenciados de transporte público, a população seria beneficiada com qualidade de vida e mais facilidade de deslocamento não apenas para o trabalho, mas também para momentos de lazer. “Uma cidade com mobilidade urbana e modos diferenciados de transportes públicos permite o acesso das comunidades dos vários setores aos equipamentos culturais, sociais, esportivos e econômicos. Além disso, a ansiedade dos dias atuais vai ser reduzida nos itinerários para as escolas e para o trabalho, mas também para a cultura e o lazer.”