Uso irregular de galpão da Cacique de Lins barra projeto social

Espaço foi cedido pela Prefeitura ao Grupo Cultura Viva Lins, que está inoperante por conta do funcionamento de um estacionamento no local


Por Mariana Floriano

02/05/2023 às 07h44

CACIQUE DE LINS ESTACIONAMENTO interna by Felipe Couri
Fachada do galpão onde funcionava a Cacique de Lins e hoje é ocupado por um estacionamento irregular (Foto: Felipe Couri)

O antigo galpão da escola de samba Cacique de Lins, no Bairro Linhares, Zona Leste de Juiz de Fora, está sendo utilizado de forma irregular como estacionamento. O lote de 1.075 metros quadrados deixou de pertencer à agremiação em fevereiro de 2022, através do decreto número 15.097. Naquele ano, uma outra decisão, número 15.761, outorgou a permissão do uso da área ao Grupo Cultural Viva Lins. No entanto, procurado pela Tribuna, o presidente do grupo, Rodrigo Mendonça, afirmou que, por conta da ocupação irregular, a entidade permanece inoperante, sem ter onde realizar seus projetos sociais.

A Tribuna foi até o galpão e constatou que diversos carros estavam estacionados no espaço. No momento em que a reportagem estava no local um homem chegou, abriu o cadeado que fecha o portão e estacionou o carro lá dentro. Ele afirmou que estava guardando o carro da prima, que mora no bairro, e não sabia quem era o responsável pelo estacionamento, nem se ele era regular. De acordo com o homem, que não se identificou, a chave que deu acesso ao galpão pertencia à prima dele, que recorrentemente guardava o carro no local.

O impasse envolvendo o uso do espaço público se arrasta há anos. No mais recente decreto de outorga, assinado em 2023, está definido que o uso da área destina-se a: “realização de atividades ligadas à cultura, assistência social, educação, esporte e lazer em favor da população dos Bairros Linhares e Bom Jardim, bem como à manutenção, limpeza e conservação da área, vedada edificação ou construção, ou qualquer utilização comercial do bem público”. No entanto, conforme o presidente do Grupo Viva Lins, nada disso pode ser feito enquanto não houver a desocupação do espaço. Ele afirma que não foi realizada a entrega oficial das chaves, portanto o grupo não possui posse legal do galpão, sendo este ainda de responsabilidade da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF).

Rodrigo Mendonça afirma que não vai iniciar as atividades do grupo até que as pendências estejam resolvidas, para não prejudicar a imagem do projeto e evitar qualquer ligação da entidade ao empreendimento clandestino. Além da ocupação irregular, o representante apontou a presença de lixo no galpão, estruturas danificadas e até mesmo a ocorrência de animais peçonhentos. O grupo exige que a PJF notifique o responsável e realize o fechamento do estacionamento, além da atuação do Demlurb e da equipe de Zoonoses.

Processo administrativo tramita na Prefeitura

As exigências do Grupo Cultural Viva Lins tramitam na Prefeitura através de um processo administrativo. O documento reitera que a área pública municipal está sendo utilizada por terceiros como estacionamento e garagem de veículos mediante pagamento de valores a um administrador. Um petição, assinada em abril de 2023, mostra que, até então, não havia notificação para desocupação do bem público. O texto usa inclusive uma reportagem da Tribuna de Minas de 2021 para mostrar que a invasão não é recente.

Na referida matéria, a Tribuna discutia a formação de uma Mesa de Diálogo e Mediação de Conflitos por parte do Município para tratar da revogação da outorga de permissão de uso de escolas de samba da cidade. A Cacique de Lins estava entre as incluídas na negociação. A matéria já apontava o uso irregular do galpão como estacionamento. Em junho de 2019, o imóvel fora objeto de um requerimento do vereador Juraci Scheffer (PT) para que a outorga fosse repassada à Associação Pró-Melhoramentos do Bairro Linhares “para sua utilização pública em favor da comunidade local em parceria com o Município”. À época, o então subsecretário de Dinâmica Administrativa da Secretaria de Administração e Recursos Humanos, Orlandsmidt Riani, respondeu que, como o espaço já estava outorgado à Cacique de Lins, a Secretaria de Governo precisaria revogar a permissão de uso. “Aí, sim, trataríamos de nova permissão para a SPM-Linhares, a qual deverá protocolar no Espaço Cidadão a solicitação com cópia do estatuto, ata de eleição da atual diretoria e documentação do senhor presidente”, concluiu.

Como estava sendo discutido, a revogação da outorga à Cacique de Lins veio a ocorrer em 2022. A decisão se deu, segundo o Departamento de Administração Patrimonial de Juiz de Fora, pois, “em razão do descumprimento de regras pactuadas entre as partes, foi constatado que o local estava sendo utilizado por terceiros em total desacordo com os termos fixados”. O repasse do espaço a uma entidade sociocultural se manteve, porém a vencedora da petição foi o Grupo Cultural Viva Lins e não a SPM-Linhares, como foi levantado na época.

Mau estado do galpão

galpao cacique de lins reproducao
Fotos anexadas ao processo administrativo mostram o estado precário das instalações (Reprodução)

O processo administrativo contém imagens que mostram situação de abandono do galpão, com descarte de tecidos e outros materiais que eram usados pela Cacique de Lins. No documento consta, inclusive, que “conforme os relatos do futuro permissionário existe a possibilidade de animais peçonhentos no local”. Há também a solicitação de solda do portão principal, por onde os veículos entram no imóvel, “sugerindo a substituição dos trincos e/ou fechaduras do portão de pedestre, permitindo assim apenas o acesso de pessoas no interior do imóvel público”.

Rodrigo Mendonça, que também é advogado, afirma que já realizou uma visita técnica ao local, e as condições encontradas se mostraram inviáveis para o funcionamento do projeto. Conforme ele, com a outorga de permissão do uso do espaço, o grupo passa a ter posse direta do bem. “No entanto, em se tratando de um bem imóvel, a tradição se dá através de documento assinado pelas partes que comprove a transmissão da posse e, consequentemente, se tratando de um imóvel, com a efetiva entrega das chaves. E isso não aconteceu com o Viva Lins até o momento. Portanto, o Viva Lins não tem a efetiva posse desse bem, sendo de inteira responsabilidade da Prefeitura qualquer evento relacionado ao imóvel.”

A Tribuna entrou em contato com a Prefeitura de Juiz de Fora e a questionou acerca da desocupação do espaço e também dos trabalhos de zeladoria que o galpão necessita. Em nota, a Administração respondeu que no dia 25 de fevereiro de 2023 foi outorgada a permissão de uso ao Grupo Cultural Viva Lins. “Contudo, não é de responsabilidade da PJF quaisquer ações fiscais e de zeladoria no local, visto que se trata de uma área de uso particular.”

Grupo Cultural Viva Lins

A intenção é que, quando o projeto estiver na ativa, ele seja um ambiente de assistência social, jurídica, esportiva e cultural para todos os públicos, “crianças, adolescentes, adultos, idosos e pessoas com deficiência”, afirma Rodrigo Mendonça. Segundo ele, diversas iniciativas já estão estruturadas, mas ainda não saíram do papel por conta da inviabilidade de ocupação do espaço.
“Já estamos com um projeto de escolinha de futebol, que vai aproveitar o campo de várzea que tem ali do lado. Estamos com uma equipe de voluntários fisioterapeutas, para fazer trabalho com os idosos. Também já temos voluntários para um projeto com música, com alguns instrumentos que serão doados.”

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