Queda nas temperaturas acentua preocupação com a população de rua
Entidades já identificaram aumento da demanda por comida e agasalhos; PJF prepara plano de contingência
A temperatura mínima registrada nesta quinta-feira (1º), de 7 graus, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), deve ser o ápice da influência da massa de ar polar que atua no Sudeste brasileiro. A máxima ao longo da quinta-feira não deve ultrapassar os 20 graus. A tendência é de que as baixas temperaturas permaneçam, pelo menos até a próxima terça-feira. Nesse período, as mínimas devem ficar próximas a 10 graus e as máximas, de 20 graus. As condições climáticas somam mais uma vulnerabilidade às pessoas que vivem em situação de rua: o frio intenso.
Nas instituições que atendem esse grupo, há perceptível ampliação da demanda por assistência com a chegada do inverno. “A nossa média diária de pessoas que procuram a Fundação era de 120 a 130 pessoas, mas já aumentou. A quantidade de pães que nós costumamos oferecer já não está sendo suficiente e temos que ir até a dispensa para completar”, conta a vice-presidente vice-presidente da Fundação Maria Mãe – Obra dos Pequeninos de Jesus, Marta Helena Meireles de Resende, sobre o que observa na rotina de trabalho.
Ela afirma que esta é a época do ano em que a população em situação de rua mais sofre. “Infelizmente, a infraestrutura de acolhimento não é suficiente para todos, tem aqueles indivíduos que permanecem nas ruas.” Para conseguir atender às necessidades mais urgentes, a instituição reforça a alimentação com comidas mais quentes, como angu baiano, canjica e caldos, além de oferecer bebidas como chocolate quente. A demanda por roupas de frio e cobertores é constante, mesmo fora dos horários de atendimento da instituição, que acaba recebendo as pessoas por uma questão de humanidade, diante do estado de necessidade em que se encontram.
“Outro dia estava saindo e um migrante chegou, disse que alguém tinha falado da instituição, e ele nos procurou. Precisava de roupa, de cobertor, de comida. Nós fizemos o atendimento, mesmo fora do horário oficial”, conta Marta. “Nunca sobra agasalho”, ela avisa. “Todos querem casacos e cobertores. Chega ao ponto de termos que pegar roupas na triagem, quando não temos na rouparia.” Marta salienta que todas as contribuições de roupas que ajudem a amenizar a sensação de frio ajudam, blusas de manga comprida, casacos, calças, meias, toucas, todos os itens são importantes.
No momento em que há demandas urgentes, a primeira forma de colaborar diretamente, segundo a coordenadora do Centro de Referência em Direitos Humanos (CRDH), Érica Herzog, é conhecer o trabalho dos serviços prestados no município, tanto os que são oferecidos pelo governo, quanto por instituições filantrópicas e sem fins lucrativos. “Nesse caso, ações imediatas mesmo, seja para que tenham acesso a banho, comida, ou agasalho, ou ainda para que sejam orientados quanto às questões de saúde, que sejam impactadas pelo frio.” O CRDH também está aberto para receber doações de itens que possam ser direcionados para a população em situação de rua, tanto em matéria de vestuário, como roupas e cobertores, quanto de alimentos.
Saiba como ajudar
Nesse ano, a Fundação Maria Mãe também está levantando recursos para encomendar roupas de moletom. As doações servem para custear a confecção dos conjuntos. Todos os contatos e meios de colaborar com a Fundação podem ser acessados nas redes sociais @fundacaomariamae e por meio do site www.mariamae.org.br.
Outras entidades que também realizam campanhas de arrecadação de donativos em função do frio e estão com ações em andamento são: Grupos Amigos por Doação, Sopa dos Pobres, Grupo Espírita Alfredtz Halzeirening Müller; Anjos da Rua, Sociedade Beneficente Mão Amiga; e Programa de Atendimento a Pessoas em Situação de Vulnerabilidade Social e Situação de Rua.
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Prefeitura vai implantar de Plano de Contingência
A Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) publicou, nesta quarta-feira (30), o Decreto 14.628, dispositivo que institui o Comitê Permanente de Gestão de Situações de Baixas Temperaturas, com a atribuição de planejar, elaborar e implantar o Plano de Contingência para Situações de Baixas Temperaturas. A medida visa a concentrar esforços de enfrentamento das situações decorrentes de frio intenso, por meio da proposição de uma série de medidas voltadas para a população em vulnerabilidade.
Há cerca de 20 dias, segundo o secretário Especial de Direitos Humanos da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), Biel Santos Rocha, a prefeita Margarida Salomão (PT) acionou algumas secretarias para construir medidas e orientações ao Município para o enfrentamento das situações causadas pelo frio. Com isso, o comitê foi formalizado e o plano de contingência está em processo de finalização.
“A Defesa Civil, por exemplo, vai monitorar a situação climática. Se detectou que a temperatura vai abaixar, imediatamente vai acionar a rede, que conta com a assistência, segurança, mobilidade, saúde e direitos humanos”, explica Biel.
Uma das ações previstas, segundo o secretário, é a criação de alojamentos emergenciais em outros pontos da cidade, para além das vagas hoje ofertadas pelos equipamentos que já acolhem a essa população. “São lugares em que essas pessoas vão encontrar condições de segurança e dignidade para passar a noite e se proteger do frio. Temos um levantamento que indica que há mais de mil pessoas dormindo e trabalhando nas ruas em Juiz de Fora. A pandemia empobreceu muito essa população. Enquanto durar o frio, o plano vai fazer esse atendimento.”
Haverá, segundo Biel, um reforço nas ações de abordagem. O titular da pasta de Direitos Humanos ainda reforça que estão previstos meios de a população colaborar com esse trabalho, seja na identificação das famílias e pessoas em vulnerabilidade, com contatos que serão disponibilizados pela Prefeitura, assim como na mobilização para a doação de itens que serão necessários nesses abrigos, como colchões e cobertores novos. “Estamos com a campanha ‘Juiz de Fora Solidária no Frio’, que vai ajudar a levantar o material necessário para equipar esse alojamentos. Mas precisamos da colaboração, porque a Prefeitura não tem condições nem orçamento para atender essa emergência.”
Biel reforça o caráter inédito da iniciativa e explica que a prevenção é importante para evitar a ocorrência de problemas extremos. “Nunca houve um planejamento como esse na cidade. Isso é um absurdo. Ano passado, três pessoas faleceram em decorrência do frio na rua. Vieram a óbito em 2020, e nós não queremos que isso volte a acontecer.” Ele reforça que as pessoas em vulnerabilidade continuarão sendo abordadas para que possam acessar os equipamentos públicos disponíveis, mas que o trabalho sempre será de acordo com a decisão delas, a vontade delas será completamente respeitada.
CRDH defende criação de abrigos provisórios
Além da doação direta de itens que possam ajudar a passar pelo período de baixas temperaturas, a coordenadora do CRDH, Érica Herzog, reforça que é preciso reforça a necessidade de criação de abrigos provisórios, que tenham baixas exigências, para que a população possa acessar os equipamentos com maior facilidade.
“Chamamos de abrigos provisórios, porque eles teriam entrada imediata, emergencial. Que sejam ampliadas as casas de acolhimento, mas levando em consideração as questões colocadas pelas pessoas que estão em situação de rua, como o horário ampliado de entrada e saída, para que elas possam fazer seus trabalhos de coleta e reciclagem, vendas nos sinais, entre outras atividades”, detalha Érica.
Ainda de acordo com ela, além de permitir um horário mais flexível, é importante garantir que essa população tenha como guardar seus pertences. “Precisamos entender que eles têm os pertences deles, que não podemos considerar esse objetos como lixo. Eles precisam ser respeitados e ter um lugar em que possam ficar e levar suas coisas.”