Pneumonia silenciosa preocupa médicos pelo avanço discreto e aumento de casos no país
Casos crescem especialmente em São Paulo e levantam alerta por sintomas leves que dificultam diagnóstico precoce
Um tipo de pneumonia conhecida como “silenciosa” tem despertado preocupação entre médicos e pais. Embora apresente sintomas iniciais mais discretos, essa forma da doença — também chamada de pneumonia assintomática, atípica ou subclínica — pode evoluir para quadros graves se não for diagnosticada e tratada corretamente.
Diferente da pneumonia “típica”, causada pela bactéria *Streptococcus pneumoniae* e caracterizada por febre alta, tosse intensa e dor no peito, a versão silenciosa se manifesta de forma mais sutil. Os sinais costumam aparecer apenas nos estágios mais avançados da infecção, o que aumenta o risco de hospitalização, sobretudo entre crianças.
Por isso, é fundamental que pais e responsáveis fiquem atentos a sintomas como dificuldade para comer, cansaço excessivo, chiado no peito, retração das costelas, pouca vontade de urinar e episódios de febre baixa — todos associados a infecções pulmonares.
Entre os principais causadores da pneumonia silenciosa estão microrganismos como *Mycoplasma sp.*, *Chlamydophila sp.* e alguns vírus respiratórios, incluindo os da gripe e o coronavírus Sars-CoV-2, responsável pela Covid-19. “Embora os sintomas sejam diferentes, a patologia é a mesma. Não se trata de uma nova doença nem de uma nova variante”, afirma a pneumologista Marcela Costa Ximenes, da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT).
Mesmo sem ser de notificação obrigatória no Brasil e com limitações nos exames para identificação do agente causador, a pneumonia — especialmente em suas formas atípicas — representa um desafio para o sistema de saúde. A escassez de dados específicos dificulta o entendimento da real dimensão do problema.
Segundo o DataSUS, em 2024 o número de internações por pneumonia no SUS cresceu 5% em relação a 2023, chegando a 701 mil casos contra 666,9 mil no ano anterior. O número de mortes também subiu: foram 73.813 óbitos, um aumento de 12% em comparação aos 65.846 registrados em 2023.
O estado de São Paulo apresentou crescimento acima da média nacional tanto em internações quanto em óbitos. Diversos municípios também relataram aumento de casos de pneumonia sem febre, o que acende o alerta para as formas atípicas da doença que dificultam a detecção precoce.
De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, as internações por pneumonia aumentaram 6,7% no estado, enquanto as mortes cresceram quase 13% entre 2023 e 2024, passando de 23.084 para 25.983. Não houve distinção entre os tipos de pneumonia nesse levantamento.
Segundo Ximenes, análises laboratoriais apontam que a pneumonia atípica representa entre 30% e 40% dos casos totais da doença, o que equivale a uma incidência de um a quatro casos assintomáticos para cada mil pessoas.
Por que os casos estão aumentando?
Para o pneumopediatra Luiz Vicente Ribeiro, do Hospital Israelita Albert Einstein, o surto atual está ligado à maior circulação das bactérias *Mycoplasma sp.* e *Chlamydophila sp.*. Antes da pandemia de Covid-19, essas bactérias seguiam um ciclo de sazonalidade de dois a três anos, mas isso parece ter mudado.
“As pneumonias em crianças sempre foram comuns. Mas, com o afastamento dos alunos das escolas durante a pandemia, houve uma redução drástica na circulação de agentes respiratórios”, explica Ribeiro. Como consequência, muitas crianças não desenvolveram imunidade contra esses microrganismos.
Com a volta à rotina escolar, a exposição a vírus e bactérias aumentou, tornando a população mais suscetível. “Agora, essas crianças estão em ambientes lotados e em contato com agentes para os quais não possuem resistência”, afirma o médico.
A expectativa é que esse cenário persista até que a população desenvolva novamente imunidade. Até lá, surtos de pneumonias atípicas, como a silenciosa, devem continuar ocorrendo com mais frequência, especialmente durante o outono e o inverno.
Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico da pneumonia silenciosa é semelhante ao da forma típica. Envolve avaliação clínica, ausculta pulmonar e radiografia de tórax. Em alguns casos, pode-se recorrer a exames laboratoriais como o de proteína C-reativa (PCR) para análise de material respiratório, embora nem sempre sejam realizados, já que não costumam alterar a conduta médica.
O tratamento depende do histórico clínico do paciente. Pneumonias típicas geralmente são tratadas com antibióticos como a penicilina, que, no entanto, não são eficazes contra o *Mycoplasma sp.*, um dos principais causadores das formas atípicas.
A demora na procura por atendimento pode agravar o quadro clínico, levando a complicações como insuficiência renal, pulmonar ou cardíaca, AVC, necessidade de entubação, sepse, diálise e até encefalite.
Como prevenir
A pneumonia silenciosa é transmitida pelo contato com secreções contaminadas, por isso as medidas de prevenção são semelhantes às adotadas durante a pandemia de Covid-19: uso de máscaras em ambientes fechados e cheios, higienização das mãos com água e sabão ou álcool em gel, e evitar contato com pessoas com sintomas gripais.
A vacina pneumocócica, embora proteja apenas contra a pneumonia causada pela *Streptococcus pneumoniae*, continua sendo recomendada para grupos vulneráveis, como crianças, idosos e pessoas com doenças crônicas. Ela está disponível gratuitamente no SUS durante as campanhas anuais de vacinação.
Diante de sintomas respiratórios persistentes, é importante procurar atendimento médico. “Mesmo com a mudança de sazonalidade e os riscos associados à pneumonia sem sintomas evidentes, essa não é uma doença nova. Já a conhecemos bem”, reforça a pneumologista Ximenes. “Não é motivo para pânico, mas sim para atenção.”