Abusando dos tecidos coloridos
As cangas, itens obrigatórios para quem pretende aproveitar os dias de sol na praia, na piscina ou no campo, ganham outras funcionalidades além de adornar corpos femininos e masculinos. Com criatividade, elas ficam perfeitas dentro de casa, compondo paredes e móveis, criando uma atmosfera leve e cheia de referências à cultura hippie, movimento sessentista americano centrado no amor livre e na não violência, que contestava o poder militar e econômico. Estes conceitos chegaram ao Brasil na década de 1970, unindo-se ao tropicalismo, liderado por músicos como Caetano Veloso e Gilberto Gil. A estética em ambos os movimentos, sobretudo o hippie, era marcada por estampas florais, étnicas e indianas, sempre em cores vibrantes, além de jeans e materiais em fibras naturais.
A origem das cangas, porém, vem do século XIX na África, com as capulanas em Moçambique, um tecido feito de algodão com estampas em padrões e cores vivas usado pelas mulheres como vestimentas a partir de amarrações pelo corpo. Em países como Quénia, Congo e Senegal, o adorno possui a grafia “Kanga”, semelhante a qual nós, brasileiros, nos referimos à peça. “As cangas, em grande maioria, sempre muito estampadas e com contraste de cores vibrantes, podem muito bem integrar uma decoração mais conceitual e com personalidade”, destaca o designer de interiores Filipe Lima. Ele lembra que, recentemente, o estilo “Boho”, que é uma releitura moderna dos elementos hippies, vem ganhado muitos adeptos. “Veio forte na moda e no estilo de vida de muitas pessoas e logo abraçaria a decoração. É uma decoração que envolve sentimentos e lembranças”, observa.
O designer destaca que as cangas na decoração não simbolizam apenas o verão ou um improviso, mas sim algo que foi pensado, com histórias e significados mergulhados em emoções e positividade. “Por isso podemos aplicar esse estilo de várias formas na nossa decoração, desde deixar o nosso quarto estiloso e com energias positivas até a utilização em detalhes como colchas, lençóis e almofadas”, sugere. Segundo Filipe, as cangas também podem ser adaptadas como cortinas e detalhes no teto, criando um ambiente aconchegante e com boas vibrações. Ele ainda pontua que, no caso de cangas que foram deixadas de lado por terem rasgado ou manchado, a dica é transformá-la em um suporte para vasos em um jardim suspenso, utilizando a técnica de macramê. “É uma decor sensacional que combina com toda essa positividade. Esse estilo de decoração só depende da sua percepção em combinar cores, estampas e, principalmente, histórias de verão que vão compondo um “cantinho” de boas emoções”, destaca.
Pelas tramas
Outro detalhe que pode casar muito bem com o estilo de decoração pretendido é o tipo de tecido da canga. O professor do bacharelado em Moda da UFJF Javer Volpini explica que cada tecido possui diferentes funções não só no vestuário, mas nas demais maneiras de utilizá-lo. “A escolha é realizada de acordo com as características de cada um deles, que são expressas pelo tipo de fibras nas quais estes tecidos são compostos”. Segundo ele, o setor têxtil trabalha basicamente com três tipos de fibras: naturais, artificiais ou sintéticas. “As naturais são encontradas diretamente na natureza, podendo ser de origem vegetal, animal e até mineral. Destacamos o algodão, o linho, o rami e a juta. As artificiais são aquelas que apresentam características similares às naturais, porém são desenvolvidas de forma industrial, a partir da matéria prima natural. E por último, temos as sintéticas, mais conhecidas por filamentos, totalmente produzidas em laboratório, a partir de produtos sintéticos, como os derivados de petróleo”.
Para a confecção de cangas, Javer aponta o uso de tecidos naturais, como o algodão e o linho, e os artificiais, como a viscose. “O algodão e o linho proporcionam elevado poder de absorção, oferecendo maior conforto térmico. Mas estes tecidos possuem características negativas para as cangas: demoram a secar e amarrotam com grande facilidade. A opção viável é a viscose, que é uma fibra artificial produzida a partir de refugos de algodão ou celulose de madeira, considerado um “genérico” do algodão. Ela apresenta as mesmas características do algodão, porém é mais fina, com secagem mais rápida e pouco enrugamento, além de apresentar um valor de produção bem menor”.
Javer destaca que tanto a viscose quanto o algodão são ótimas opções de tecidos para receber o processo artesanal de estamparia como o tie dye, que proporciona uma explosão de cores de acordo com as amarrações feitas durante o processo de tingimento. “Tecidos como crepes ou chifons, que podem ser de algodão, seda ou ainda receber a adição de fibra sintética, são ideais para receber vários processos de estamparia, inclusive a digital, muito difundida na moda contemporânea.” O professor ainda pontua as tendências da moda praia que podem ser adaptadas para as nossas casas: estampas temáticas, como as paisagens do Rio de Janeiro; motivos étnicos, como as africanas e de países asiáticos; e as cores quentes, predominantes no verão brasileiro.