A juiz-forana Amanda Marques salta das plataformas digitais para o livro físico

Por Marisa Loures

amanda marques
Amanda aposta em personagens maduros no novíssimo “Não resisto”

Amanda Marques me disse que escreve, sempre, pensando que seu leitor quer ser surpreendido. Não me causa admiração uma declaração como essa depois de eu ter terminado a leitura de “Não resisto” (autografia, 382 páginas). Devorei o livro em um dia e uma noite. Para ser mais exata, comecei num sábado às 8h e terminei na madrugada de domingo, por volta das 5h. Quando virei a última página, senti-me órfã dos dramas da protagonista Lina, uma mulher com seus 37 anos e  não uma mocinha inocente, como costumamos encontrar nesses livros românticos de óbvios finais felizes.

Lina está casada há 15 anos com Fábio. Para ela, a rotina e a falta de altos e baixos na relação eram os sinais de que tudo ia bem. No entanto, sem mais nem menos, escuta um inesperado pedido de separação. Fábio avisa que vai morar com outra mulher, e na mesma casa em que sempre viveu com ela. Sem chão e com a esperança de que um dia terá seu marido de volta, Lina se muda, arrasada. O que ela não esperava é que, rapidamente, Miguel entraria em sua vida. Além de ser um advogado bastante seguro nos negócios, esse homem é lindo e o sonho de consumo de qualquer mulher na situação dela. O problema é que não demora muito para que os antigos e mal acabados casos desse Dom Juan comecem a atormentar sua vida. Por estar já muito apaixonada e com medo de se expor a mais uma derrota amorosa, ela decide manter o relacionamento, mesmo sofrendo com a aparente indiferença e traições de seu novo amor. Definitivamente, não é um livro para quem quer que a trama se resolva em dois tempos.

Lançada na Bienal do Rio de 2017, a publicação é a segunda obra da autora, que já é conhecida por quem é adepto das plataformas digitais. Juiz-forana radicada em Paranavaí (PR), Amanda descobriu-se escritora há cerca de dois anos, e o início de tudo é o livro “Minha intenção”. Foi de mansinho, sem muitas pretensões, que ela entrou nesse universo da literatura, mas agora ela tem certeza de que não quer mais parar. A terceira obra já está sendo gestada. “Quero leitores. Comecei sem saber o que esperar, mas comecei a ver que tenho conseguido divertir desde minhas amigas até gente que me manda mensagens pelas plataformas on-line. E , se estou conseguindo isso, quero mais. Acho que a escrita é uma profissão portátil. Aonde eu for, posso levá-la. Descobri um prazer que nem eu sabia que tinha”.

Marisa Loures – A Lina é formada em Letras como você. O que você tem mais em comum com sua protagonista?

Amanda Marques – Ela é bem diferente de mim na verdade. Também já fiz muita correção de texto. A Lina é uma mulher que passou muito tempo totalmente alheia às próprias vontades, aos desejos, a tudo que ela queria para a vida. Ela não sabia o que queria para a vida, só seguia o que o marido falava. Às vezes evitava até de ter amizades para não chateá-lo e evitar uma discussão. Foi uma mulher muito pacata e ficou alheia a tudo durante muito tempo. Tirando a profissão, não temos muito a ver.

– Por que um autor que já é conhecido nas plataformas digitais segue para o livro físico numa época em que muitos leitores estão migrando para o e-book?

Fiz o caminho inverso. Preferi não ir direto para o físico e tentar ir direto para as plataformas on-line. Por que fiz isso no primeiro livro? A gente quer, é óbvio, que a família compre, que os amigos leiam, mas eu queria sair desse círculo. Eu queria ser conhecida no país, e a plataforma on-line tem isso. Se você para, abre uma prateleira de livros numa livraria on-line, você vai descobrindo. Você tem a possibilidade de ter 20% do livro grátis. Então, acho que isso faz a gente adquirir leitores. Minha estratégia foi esta: quero que as pessoas que conheço leiam, mas eu quero tornar isso maior. Quero entrar nesse nicho de romance.

– E o que o livro físico representa na sua carreira?

O livro físico é você sentir a carreira concretizada. Muito gente, também,  que conheço ainda não se acostumou com as plataformas digitais. Então, o livro físico é necessário. Quando lancei o “Minha intenção”, não lancei o físico, e muitos simplesmente falaram “ah, não consigo ler em tablet e em celular. Não vou ler”. Assim que lancei o de papel, as pessoas começaram a comprar. Aí que percebi que, realmente, a plataforma digital ainda tem um longo caminho.

– É por causa da sua boa atuação nas plataformas digitais que a editora te procurou, ou foi você quem a procurou?

Como sou uma escritora relativamente nova no mercado, a gente tem uma visão do que vê em filme. Que um dia você vai mandar seus originais, e uma editora vai te descobrir e falar: “Ah, vou te lançar.” E não é assim. As grandes editoras do nosso país pegam, geralmente, autores consagrados internacionalmente. Então, descobri que não é isso. A gente investe mais numa editora do que uma editora investe na gente. Fiz tudo o que uma pessoa leiga faz. Fui mandando para várias editoras. A partir das respostas que fui recebendo, escolhi a editora que mais se adequava ao que eu pensava naquele momento.

– Seu livro foi lançado na Bienal do Rio e você não pôde estar lá. A Thalita Rebouças costuma contar que, quando começou na carreira, ia a esses eventos e subia até na cadeira para chamar atenção do público. Não seria a oportunidade de você mostrar seu trabalho?

É uma boa oportunidade sim, mas, no caso da Bienal, toda a imprensa estava mais voltada para os lançamentos de sucessos conhecidos pela mídia, como o livro do Lázaro Ramos. No caso da Thalita, vejo que é muito da personalidade da pessoa também. Ela é uma escritora e, ao mesmo tempo, sabe ser muito performática e chamar atenção. Não sei se seria o meu caso. Mas pretendo ir às próximas, estou me programando para isso.

– “Não resisto” traz personagens mais maduros, e você fala muito sobre isso em entrevistas. Era uma falta que você sentia no mercado?

Senti que, quando a gente está numa idade em que a gente tem mais tempo e, de repente, mais vontade para ler algum tipo de romance, eu me pegava lendo livros e vendo protagonistas com 25 anos já casada. Eu pensava “ai caramba, e a gente que já passou dos 30, a gente não cabe mais nestas histórias românticas? O que está acontecendo?” E eu me aproveitei desse nicho, vi que era um mercado que tem muita chance de crescer, porque depois tive retorno dos leitores: “Que legal a gente pegar uma protagonista, e ela não ser uma garota, ser uma mulher e, mesmo assim, ela estar envolvida em situações engraçadas.” Ela já é uma mulher formada, independente, mas tem as questões que todas nós temos. Senti essa falta e quis passar isso.

– Você se inspirou em alguma outra autora?

Exatamente em um não, mas a gente pega influência em certas coisas. Tenho lido muito de romance ultimamente a Carina Rissi, que é o maior nome de romance no mercado brasileiro ultimamente. Gostei muito do jeito dela de escrever, do jeito que ela também anda procurando outros nichos, não só a parte da fantasia, mas encaixando histórias bem bacanas. A gente vai descobrindo caminhos.

– Por falar em Carina Rissi, ela diz que, para ela, uma boa história precisa de um final feliz. Como é um bom final para você?

Não acho que toda boa história tem que ter um final feliz. Mas, no meu caso, no tipo de romance que escrevo, o que mais busco, além da história, do romance do protagonista, é mostrar a mulher se desenvolvendo, a mulher se descobrindo. Mostrar que ela dá a volta por cima apesar de situações que ela passa. Nos meus dois livros, busco isso, e, se não é a felicidade de ela encontrar um grande amor, é a felicidade de ela ter se descoberto, de ela ter descoberto o papel dela na sociedade, o papel dela na vida. Então, escrevo para distrair. Adoro, também, leituras com finais felizes, mas não acho que seja prioridade, não acho que um bom livro tenha que ter um final feliz.

– Li seu livro em um dia e em uma noite. Parece que você sabia o que a gente queria daquela história. Quando você escreve, pensa no leitor?

– Penso que o leitor quer ser surpreendido, porque eu, como leitora, adoro ser surpreendida. Então, neste caso, penso quais são os possíveis caminhos que meus leitores pensariam que eu iria? E aí tento surpreender, porque assim sei que estou agradando o meu leitor, sei que meu leitor fica surpreso à leitura. Todo mundo fala o mesmo que você falou, que lê o livro muito rápido, porque quer logo saber o que vai acontecer. Acho que estou indo bem no que me proponho a fazer, porque estou conseguindo que as pessoas deixem de fazer algumas coisas para se concentrar na leitura, porque ficam naquela expectativa de terminar para saber o fim.

– Como começou sua história com a literatura?

Também dava aula de Português em Juiz de Fora e em Bicas. Chegou um momento da minha vida em que eu tive que largar porque meu marido é engenheiro e fui seguindo-o por vários motivos. Chegou um ponto da minha vida em que meu filho já estava mais independente, já estava adaptado à escola, e eu sabia que não estaria na cidade por mais tempo. Então, não tinha muito motivo para colocar o menino num período integral e, de repente, sair para trabalhar, sabendo que, em pouco tempo, partiria da cidade para outra. O que fiz? Comecei a ler. Sempre gostei de ler, só que estava no ritmo de ler dois por semana. E no meio de ler dois livros por semana pensei: “Gente, está tudo tão previsível, será que consigo escrever uma história?” E foi assim. Consegui terminar, mandei para uma amigona que adora romance ler. Disse que precisava de uma leitura crítica. E tem dado certo.

– Você ainda mantém relação com Juiz de Fora?

Há muito tempo não moro mais aí. Morro de saudades de tudo, adoro saber que sei andar na cidade, todos meus amigos estão aí, minha família está aí. Voltar para aí é um prazer. Pretendo, daqui a um tempo, voltar de vez.

 

capa livro Amanda Marques

“Não resisto”

Autora: Amanda Marques

Editora: autografia (382 páginas).

 

 

Marisa Loures

Marisa Loures

Marisa Loures é professora de Português e Literatura, jornalista e atriz. No entrelaço da sala de aula, da redação de jornal e do palco, descobriu o laço de conciliação entre suas carreiras: o amor pela palavra.

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