Beth Sacchetto: “Crianças não nascem com computadores e celulares. Elas aprendem a usá-los”

Por Marisa Loures

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Beth Sacchetto convida os pequenos leitores a se aventurarem pelas páginas de “Tatá, a tartaruga sonhadora”, o primeiro livro de uma coleção que trabalha, principalmente, o tema “aceitação” – Foto: Acervo pessoal

A coluna Sala de Leitura ainda está no clima da Semana da Criança. Dessa forma, a entrevista de hoje é com a escritora juiz-forana Maria Elizabeth Sacchetto, que acaba de lançar “Tatá, a tartaruga sonhadora” (Franco Editora, 16 páginas). Com ilustração assinada pela professora e artista plástica Pollyana Faria, a obra é a primeira de uma coleção de cinco títulos, intitulada “Bichos sonhadores”. A temática recorrente é a “aceitação”. “Acredito que as crianças leitoras descobrirão, por meio desses livros, que os sonhos nos impulsionam para a realização, mas que há sonhos que não conseguimos concretizar por motivos diversos, e será preciso conviver com essa impossibilidade, sem se frustrar, procurando aceitar a realidade e buscando novos e possíveis sonhos”, conta a autora.

Nessa primeira aventura, a protagonista é uma tartaruga amarela. Seu maior desejo, desde pequenina, é viver em um jardim. E, em breve, a meninada será apresentada a “Jajá, o jacaré sonhador”, “Lulu, a lula sonhadora” e “Fofó, a foca sonhadora”. De acordo com a escritora, a previsão é que o último livro, ainda sem título, seja publicado no segundo semestre de 2025.

Beth Sacchetto tem uma vida dedicada à educação. Também é professora de Língua Portuguesa e doutora em literatura. Ama crianças e ama escrever para elas. Antes de terminar esta entrevista, ela deixa um convite para seus pequenos leitores. “Venham sonhar comigo e com esses bichinhos sonhadores.”

– Apresente o primeiro livro para os leitores. Quem é a Tatá?

Tatá é uma tartaruga-amarela, e há outras denominações para ela, que pertence, atualmente, à única espécie do gênero Caretta. Ela é uma tartaruga marinha, cujo habitat são os oceanos, e só vem às praias para desovar. É muito baixa a capacidade reprodutora dessa espécie, que atinge a maturidade sexual entre os 17 e os 33 anos. Em média, vive de 47 a 67 anos. Por ser marinha, possui nadadeiras e não patinhas. A Tatá sonhadora, desde pequenina, alimenta o sonho de viver em um jardim, mas esse sonho não condiz com a natureza da espécie a que ela pertence. Quando ela volta à praia para deixar os seus ovinhos, não quer voltar para o mar com as outras tartarugas e se separa do grupo, mas, intimamente, ela sabe que o jardim não é o seu lugar. Assim, ela volta para o mar, aceitando a sua realidade, sem se frustrar.

– A tartaruga Tatá não consegue realizar o que mais deseja e sei que os outros protagonistas também não. Mas tudo muda no último livro, pois, juntos, os personagens sonharão um sonho possível. A ideia é mostrar que “juntos somos mais fortes?”

Essa é uma das mensagens do último livro, que ainda não tem um título definido. Estou em processo de escolha, mas ele já se encontra planejado. Há, entretanto, uma outra mensagem nele: a escolha de um sonho que se tornará possível, se for abraçado por todos, e que não fere a natureza de nenhum personagem, dependendo, apenas, da mudança de atitudes. Mas isso é segredo, e não quero dar spoiler, apesar de estar dando. Os jovens leitores terão uma surpresa. Não quero adiantá-la. Penso que a curiosidade mexerá com as cabecinhas deles e os conduzirá à expectativa do desfecho da coleção.

– O livro traz uma mensagem de aceitação. Como trabalhar essa ideia com as crianças de hoje de forma que elas não se frustrem?

A literatura é caminho adequado para se trabalhar com qualquer tema, independentemente da idade do leitor. Na realidade, os livros dessa coleção são destinados a crianças, mas podem ser lidos por adolescentes e adultos, porque o tema central visita a todos durante a vida. Quantas pessoas não se aceitam, não aceitam a realidade, vivem frustradas e infelizes. Trabalhar a aceitação com crianças talvez seja mais fácil. Isso vai depender de quem irá conduzir essa reflexão. O pedagogo francês Daniel Pennac, no livro “Comme um Roman”, fala sobre esse trabalho com a leitura, principalmente sobre a responsabilidade dos pais, da família e dos professores. Costumo dizer que o amor é sempre a forma perfeita para tudo. Educar é um exercício amoroso, e toda criança entende essa linguagem. Não há impossibilidade no entendimento infantil.

– A literatura voltada para crianças é recheada de bichos. Qual é o segredo da bicharada?

O imaginário infantil é habitado por animais, e eles têm um grande poder, exercem uma magia, ainda mais quando apresentam características humanas, com sentimentos e, principalmente, porque falam. Esse antropomorfismo gera uma conexão, uma certa empatia, um encantamento. O fantástico permite que temas relevantes possam ser abordados de forma lúdica e leve e, desse modo, o escritor fabulista consegue chegar à criança, levando-a a um entendimento da realidade, apesar de estar produzindo ficção. Crianças amam essa interação, amam aprender com esses coleguinhas, ainda mais porque há diversidade de animais, que possuem características próprias, que mexem com a fantasia. A literatura é porta aberta para ensinamentos e para entretenimento.

– E a história da tartaruga Tatá é toda rimada. Os versos são o pulo do gato para conquistar os leitores mirins?

Textos que se valem de rimas trazem musicalidade, e as crianças gostam de música, gostam de cantar, gostam de dançar. Tudo isso as atrai. Fica mais fácil para elas reproduzirem a história. Preferi usar verbos de 1ª conjugação e manter a rima com “ar”. Em algumas passagens, mudei a rima, mas com pouco variação. Tudo isso foi pensado. Quando Tatá repete “nadei, nadei, nadei”, alterei a rima predominante, mas o verbo é de 1ª conjugação. O objetivo é fazer que a criança imite o movimento sugerido pela fala de Tatá e, imaginariamente, nade. O lúdico está presente, a criatividade da criança é acionada e ela dá vazão à brincadeira. Essa repetição também traz a realidade de Tatá: nadar, estar na água. Os livros se apresentam para uma leitura compartilhada a partir dos 3 anos e, para uma leitura individual, a partir de 7 anos.

– Você tem uma vida dedicada ao ensino. Também tem se dedicado a escrever para os pequenos. Como fazer as crianças que já nasceram numa época tecnológica se aventurarem pelas páginas de um livro? O que uma boa história infantil deve ter?

Crianças não nascem com computadores e celulares. Elas aprendem a usá-los, e querem usá-los, porque veem, nos ambientes nos quais se inserem, esse uso. Se elas passarem a ver, nesses ambientes, a presença de livros físicos, terão interesse por eles, assim como se interessam por tablets, computadores, celulares e outros. É tudo uma questão de hábito, de exemplo. Pais que leem motivam os filhos a lerem. Quando se presenteia uma criança, pode-se dar um brinquedo, ou uma roupa, ou algo de que ela goste, mas sempre acompanhado de um livro. A biblioteca infantil em um lar deve ser iniciada enquanto a criança ainda estiver no ventre materno, e tenderá a crescer e a garantir que um leitor se forme. Ler é demasiadamente prazeroso. Ouvir uma história também. Escreve-se uma boa história com pesquisa, com planejamento, com objetivos bem definidos, com tema bem selecionado, com enredo bem construído, com personagens interessantes e bem elaboradas, com linguagem adequada ao público a que se destina e muito mais.

– Que caminho “Tatá, a tartaruga sonhadora” vai percorrer a partir de agora? 

O caminho de Tatá é estar com as crianças nas escolas, nos lares, despertando, nelas, essa magia que a literatura é capaz de promover, esse gosto gostoso de, pelas palavras e, também, pelas imagens, descortinarem o mundo e darem asas à imaginação, tornando-as ainda mais felizes.

capa do livro tata a tartaruga sonhadora

“Tatá, a tartaruga sonhadora”

Autora: Maria Elizabeth Sacchetto

Ilustradora: Pollyana Faria

Editora: (Franco Editora, 16 páginas)

Marisa Loures

Marisa Loures

Marisa Loures é professora de Português e Literatura, jornalista e atriz. No entrelaço da sala de aula, da redação de jornal e do palco, descobriu o laço de conciliação entre suas carreiras: o amor pela palavra.

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