Amizade, perda e luto na emocionante HQ ‘Meu amigo morto’

Por Júlio Black

 

Oi, gente.

A visão dos “civis” a respeito das histórias em quadrinhos mudou para melhor nos últimos anos, principalmente por causa dos filmes de super-herói, mas ainda existe uma galera que vê as HQs como coisa de criança, que é tudo “Turma da Mônica”. Sabem de nada, inocentes igual o Jon Snow, sobre o potencial da nona arte para contar histórias emocionantes. É o caso da ótima “Meu amigo morto”, do sueco Simon Gärdenfors, que chegou este ano ao Brasil pela Todavia.

Lançada lá fora em 2019, a HQ foi a maneira que Gärdenfors encontrou para compartilhar com o mundo um dos momentos mais dolorosos de sua vida: em 4 de janeiro de 1996, quando tinha apenas 17 anos, ele recebeu um telefonema informando que seu melhor amigo, Kalle Petersen, havia morrido de forma fulminante após contrair meningite. Como ele conta nas três páginas do prólogo, Simon mal se lembra do que foi dito na ligação feita do hospital onde Kalle morreu, mas que sua reação foi deitar no chão por perceber que não conseguiria se manter em pé.

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“Meu amigo morto” passa, então, a mostrar como os dois adolescentes se tornaram amigos e as histórias que compartilharam, incluindo garotas, sexo, brincadeiras, piadas, brigas, aventuras e todas as descobertas que acontecem nessa fase da vida. Ao sabermos como a história entre os dois vai acabar, a história não deixa de passar a angústia que todos nós temos quando perdemos uma pessoa querida: e se tivéssemos aproveitado mais um pouco esse tempo juntos? E se não tivesse feito isso, falado aquilo, ter brigado por uma coisa tão besta?

Mas a trama dos quadrinhos não se resume à vida antes da morte de Kalle, que ocupa menos da metade da HQ, pois também acompanhamos como ficou a vida de Simon após a perda do melhor amigo e o quanto isso afetou seus relacionamentos familiares, de amizade e amorosos por vários anos, marcados pela depressão, raiva e desorientação, entre tantos outros sentimentos. Nós sabemos que a morte afeta a todos em níveis diferentes, e Simon Gärdenfors sabe muito bem retratar seus traumas pessoais nas páginas da revista, mesmo quando precisa mostrar o quanto ele magoou outras pessoas no caminho em sua busca por encontrar sentido numa vida que precisa seguir em frente, apesar do que se perdeu.

Com um total de 176 páginas, “Meu amigo morto” é uma belíssima história sobre amizade, perda, luto, descoberta, superação e amadurecimento, e o quanto é difícil para um adolescente lidar com uma tragédia pessoal desse tamanho. É notável como Simon Gärdenfors consegue tratar dessas questões com sensibilidade, humor e muita coragem, apoiadas por um belíssimo trabalho nas ilustrações e design, com o traço cartunesco, as cores chapadas e uma narrativa capaz de fazer o leitor só parar a leitura quando chegar à ultima página.

É uma história envolvente, emocionante, que mostra o quanto é complexa a vida com suas alegrias e tristezas, mas que encontra sentido quando lembramos das pessoas que amamos, mesmo que não estejam mais conosco. E que ainda tem mais sentido quando lemos uma HQ com essa qualidade única.

Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.

Júlio Black

Júlio Black

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