Foi crime e não dá para passar o pano 

Por Marcos Araújo

Quero aqui propor um exercício. Um exercício endereçado aos homens. Aos machos que pensam que estão no topo da hierarquia. Que se sentem líderes e poderosos. Que se sentem confiantes e irresistíveis. Que se acham qualificados para a arte da sedução e da conquista. Resumindo, aos que se acham. Minha proposta é simples: que tal tentarem se colocar no lugar do outro? Que tal se colocarem no lugar de pai, irmão e namorado daquelas estudantes importunadas sexualmente por alunos do curso de Medicina durante uma partida de vôlei? E se nem essa camaradagem de gênero ainda é suficiente para fazê-los refletir, que tal se colocarem no lugar daquelas jovens? Imaginem como seria ser mulher e ter medo pelo simples fato de ser do sexo feminino. Imaginem que nem mesmo na hora da prática de uma atividade esportiva, realizada em ginásio lotado, seria possível sentir segurança. 

Esse tipo de empatia por parte dos homens se faz mais que necessário, porque mais do que nunca está claro que aquele sujeito que bate no peito como forma de exibir sua masculinidade não consegue dominar seus impulsos. Definitivamente, o que ocorreu durante aquele jogo universitário não foi uma brincadeira de jovens com alto teor de testosterona no sangue. Não dá para usar a tribuna e fazer piada, pois o que aconteceu contra aquelas alunas foi crime e não dá para passar o pano. 

A masturbação coletiva, como o infeliz episódio ficou conhecido, é mais um horrendo exemplo da misoginia presente em nosso cotidiano. Essa aversão às mulheres é fruto do patriarcado, um sistema social que mantém o homem em sua primazia e insiste em deixar a mulher em situação subordinada. As cenas dos rapazes nus abaixo da cintura, mesmo que em baixa qualidade, são repugnantes e remetem a outros eventos de importunação contra as mulheres tão comuns no transporte público coletivo. É preciso que nossa indignação chegue até as instâncias necessárias, para que haja a punição dos envolvidos. Não dá para deixar que esse fato sirva de sinalização para que mais homens se sintam autorizados a cometer esse tipo de crime. 

Não dá para dissociar o que aconteceu contra as alunas de São Carlos, no interior de São Paulo, com a epidemia de estupro vivida pelo Brasil, que assiste a uma escalada de crimes sexuais. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram que, em 2022, foram registrados 74.930 estupros no país. O total é recorde na série que analisa esses números desde 2011. Diante dessa realidade, relegar a atitude dos estudantes machos a algo menor, como se fosse apenas um êxtase da juventude, é passar uma mensagem negativa, que terá consequências trágicas para o dia a dia das mulheres. 

Ao que parece, esse episódio não é um fato isolado e, se a tradição é o que oferece motivação para que se tire a roupa e se masturbe na frente de colegas durante uma competição de esporte, já passou da hora para que esse costume seja abolido. O que aconteceu contra as vítimas, além da expulsão dos envolvidos, deve ser tratado com penalidade jurídica. Sem isso, toda essa repercussão só servirá de lenha em uma fogueira de vaidade fálica.

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