
Abro a janela do meu quarto e vejo que, lá fora, a vida está em constante movimento: o som dos motores dos carros, a batida do martelo na obra mais à frente, o latido do pet do vizinho, resquícios de conversas que escapam das casas com suas janelas também abertas. A vida carrega essa ideia de fluidez permanente. E acho que esse processo se repete dentro de nós. Em nosso interior, sempre tem algo germinando: um pensamento, um desejo, um medo, uma lembrança, um sonho, uma tristeza, uma alegria.
A toda hora, algo nasce dentro da gente sem anunciar nem pedir licença, simplesmente surge. Às vezes, pode ser um pensamento tímido, que se desfaz como um sopro, ou uma esperança firme, que se agarra ao peito e insiste em ficar. Nasce a lembrança que aquece, nasce o medo que paralisa, nasce o desejo que empurra para frente, nasce a saudade que chama para trás.
É como quando eu ando pela rua e, de repente, a música que toca em algum carro parado no sinal me transporta de volta para uma cena da minha infância, ou quando o cheiro de café que acaba de ser passado desperta a memória da minha primeira casa, com minha mãe e meu pai conversando na cozinha, uma sensação de família, de porto seguro. São pequenos nascimentos que acontecem sem aviso e que me transformam um pouco a cada instante.
A reflexão que aqui proponho é que, a cada hora, uma parte da gente se reinventa. Esse processo contínuo impacta nossa existência de formas que nem sempre reconhecemos. Há momentos em que acreditamos ser os mesmos de sempre, repetindo gestos e caminhos, mas, no fundo, já não somos. A vida nos move por dentro, mesmo quando insistimos em permanecer no mesmo lugar. Uma dor inesperada pode nos ensinar sobre resiliência. Uma alegria simples pode despertar gratidão. Um encontro fortuito pode nos revelar desejos que nem sabíamos carregar.
E, se olharmos para o mundo sob essa perspectiva, tudo ganha nova cor. Ao perceber que, dentro de nós, há sempre algo nascendo, aprendemos a respeitar os ciclos da vida. Assim, podemos aprender que o mundo deixa de ser um bloco fixo e passa a ser visto como um campo vivo de possibilidades. Desse modo, mesmo diante de crises e desesperanças, conseguimos encontrar a chama do recomeço, porque entendemos que nada está finalizado de forma absoluta.
Compreendo que esse nascimento constante, por vezes, pode ser desconfortável. Ele exige que abandonemos versões antigas de nós mesmos, que deixemos cair as folhas secas para que novas possam surgir. Mas é justamente nesse desprender-se que reside a beleza da existência. Nunca somos iguais ao que fomos ontem, e é nesse movimento que se renova a chance de sermos mais inteiro, mais abertos, mais humanos.