Crônica de primavera

Por Marcos Araújo

Motivos não faltam para que a crônica de hoje trate de questões políticas: discurso sobre uma realidade paralela na ONU, constrangimento internacional, refeições na rua devido às restrições impostas pelo passaporte sanitário, ministro flagrado por câmeras ao fazer gestos ofensivos para manifestantes, o mesmo ministro testando positivo para Covid-19 em plena viagem oficial aos Estados Unidos. Ou seja, um “mal-estar” atrás do outro, mostrando que o Brasil desempenha com perfeição a condição de pária aos olhos do mundo.

Sobre o episódio da pizza fora do restaurante, alguns dirão que se trata daquela situação de “gente como a gente”. Mas, ao que parece, trata-se mesmo de um truque de marketing. Assim como a história do pão com leite condensado, porque, na real, segundo o que a grande mídia vem mostrando, de janeiro a agosto deste ano, já foram gastos R$ 5,8 milhões no cartão corporativo.

Todavia, não vou usar mais do espaço de hoje para falar desses aborrecimentos nossos de cada dia. Sabemos que, depois desses, surgirão outros e muitas vezes equivalentes aos que agora nos enchem de vergonha. Então, que fiquem para outras oportunidades.

Quero abordar um tema mais ameno, que sirva de bálsamo para estes tempos absurdos e de pouco afeto. Quero falar da primavera. Sim, a primavera, que chegou nesta quarta-feira independentemente de qualquer coisa, sem qualquer vínculo com o que esteja acontecendo na realidade da política brasileira nada primaveril.

Cecília Meireles escreveu uma crônica sobre a primavera. Sob o seu olhar poético, ela descreveu a primavera como aquela que chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. Pensei na primavera, quando me coloquei para escrever este texto, porque estava reflexivo sobre a vida, sobre o quanto somos feitos de ciclos e o quanto é preciso de sabedoria para identificar quando termina um e quando começa outro.

Muitas vezes, determinadas situações passam a fazer parte do nosso dia a dia sem que a gente perceba. Nos habituamos a elas. Outras vezes as toleramos, porque ainda falta algo para que passemos a enxergá-las. Dentro desse pensamento, acredito que quem esteja ao nosso redor cumpra papel fundamental, ou para nos manter no mesmo estado de coisas, ou para nos dar o pontapé rumo à superação desse estado.

A chegada da primavera é simbólica e tem a ver com mudança, porque ela cobre com colorido o cinza deixado pelo inverno. Ela é a transição para o verão que daqui a pouco se anuncia. “Saudemos a primavera, dona da vida – e efêmera”, assim Cecília Meireles termina sua crônica. “Efêmera” é a palavra que peço a atenção de quem me lê, porque nada é para sempre, nem mesmo o vexame pelo qual passa o Brasil neste momento.

Assim como a primavera, é preciso saudar os pontos de partidas para as próximas estações da vida, levando sempre a expectativa, apesar dos percalços, de que o melhor ainda está por vir. Isso nos dá ânimo para seguir.

Seja bem-vinda, primavera!

Marcos Araújo

Marcos Araújo

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