Vinhos Doces da França – Saiba mais sobre eles!


Por Etiene Carvalho

14/12/2018 às 11h11- Atualizada 14/12/2018 às 11h40

Vou aproveitar que acabei de fazer o curso French Wine Scholar/Enocultura (qualificação avançada em vinhos da França) e vou dividir com vocês um pouco das informações que aprendi sobre os vinhos doces franceses. Algo que amei conhecer a fundo! Pena que aqui no Brasil esses vinhos não são muito baratos. De toda a forma, vale à pena o investimento porque são maravilhosos e, por serem docinhos, devem ser apreciados com parcimônia!

th
França Vitivinícola

Por exemplo, você sabia que a região do Roussillon, no Sul da França, é a responsável por produzir 80% de todos os “Vin Doux Naturels” (vinhos doces naturais) – franceses? E aqui vai uma explicação bem bacana: – “Vin Doux Naturels”, também conhecidos por VDNs, são na verdade resultado de um processo chamado mutage – que consiste na adição de água ardente vínica neutra ao mosto para interromper a fermentação, fazendo com que o vinho fique, normalmente, mais doce por conta da morte das leveduras e mais alcoólico por conta da adição da aguardente. Geralmente, os VDNs possuem cerca de 15% de álcool e de 5 a 10% de açúcar residual (açúcar não fermentado). Outro detalhe importante: é o mesmo método de elaboração do famoso Vinho do Porto. A diferença é que surgiu 400 anos antes dele e foi inventado em 1285 por um sujeito muito estudioso chamado Arnaud de Villeneuve, que era uma espécie de médico/alquimista. Alguns dizem que ele era espanhol e outros juram que se tratava de um legítimo francês.

IMG 20181209 WA0042
Maury – Vin Doux Naturel do Rousillon (Esse foi servido no FWS: delícia!!!!)

Então, voltando à região de Roussillon, ela conta com cinco denominações para os VDNs: Banyuls (tinto, rosé e branco), Banyuls Grand Cru (tinto), Maury (tinto e branco), Rivesaltes (tinto e branco) e Muscat de Rivesaltes (branco). O vinho leva o mesmo nome da respectiva origem. Ao norte de Roussilon, encontra-se o Languedoc, que também produz VDNs altamente reverenciados na França. São eles: Muscat de Frontignan, Muscat de Lunel, Muscat de Mireval e Muscat de Saint-Jean de Minervois. Todos esses vinhos do Roussilon são elaborados a partir da mesma variedade, a Muscat à Petit Grains Blanc, e todos são brancos. Vale ressaltar que esses VDNs produzidos com Muscat devem ser consumidos jovens para mostrarem toda sua fruta e aroma.

th 1
Muscat de Frontignan – Vin Doux Naturel do Languedoc: deve ser consumido jovem para ressaltar frutas e aromas

Há também em território francês dois VDNs muito interessantes produzidos no Sul do Rhône: o Muscat de Beaumes de Venise (branco) e o Rasteau, esse último é produzido com Grenache, pode ser tinto, branco ou rosé, e deve ser consumido em até oito anos após seu lançamento no mercado.

Na região do Jura, entre a Borgonha e a Suíça, há um VDN conhecido como MacVin – o Marc, a aguardente utilizada em sua produção, é obtida por destilação dos bagaços do vinho do Jura, inclusive dos Vin Jaune ou Vinho Amarelo (relembre aqui). Ele pode ser feito com as seguintes uvas: Chardonnay, Savagnin, Poulsard, Pinot Noir e Trousseau. É engarrafado com alcóol final de 16% a 20% e pode ser tinto ou branco.

t7
Macvin du Jura

Outro vinho doce bem interessante também é o “Vin de Paille” –  Suas uvas após serem colhidas são colocadas para desidratarem em caixas de plástico ou madeira por cerca de seis semanas. O objetivo é concentrar açúcares e componentes aromáticos. A palavra “paille”significa palha, e alguns produtores ainda secam os cachos de uva em um leito de palha como antigamente, algo que pode explicar a origem do nome.

th 2
Vin de Paille – Jura

Detalhe que a fermentação desse vinho é lenta e o mosto acaba não fermentando por completo. O “Vin de Paille”fica com cerca de 15% de álcool e é sempre vendido em garrafas de 375ml. No Jura, as uvas utilizadas para a produção desses vinhos são a Chardonnay, a Poulsard e/ou a Savagnin. O Rhône Norte, especificamente Hermitage, também produz Vin de Paille, só que à base das uvas brancas permitidas na região que, no caso, são a Marsanne e a Roussane. Os Vin de Paille costumam durar uma década mais ou menos.

HPIM5189
Vin de Paille Hermitage (Rhône Norte)

Já na Alsácia, ali bem pertinho da Alemanha, é comum encontrar vinhos doces feitos à base de Riesling, Gewurztraminer, Pinot Gris e/ou Muscat Blanc à Petit Grains. Esses vinhos são conhecidos como “Vendage Tardive”, que significa Colheita Tardia, ou “Selectión Grain Nobles” – que é literalmente Seleção de Grãos Nobres. A fermentação desses vinhos à base de uvas colhidas tardiamente termina naturalmente quando as leveduras morrem deixando no vinho o açúcar não fermentado. No caso, o “Selectión de Grain Nobles”, obrigatoriamente tem seus cachos colhidos à mão, baga por baga, através de múltiplas passagens pelo vinhedo. Além disso, é necessário que suas uvas sejam afetadas pela “podridão nobre”, ou seja, devem ter sido atacadas pelo fungo botrytis cinerea para consequentemente obterem características especiais de doçura e sabor, em especial de mel. Já os “Vendage Tardive” são feitos de  uvas de colheita tardia que podem ou não ter sido atacadas pela Botrytis.

domaine andre kientzler riesling geisberg selection des grains nobles alsace grand cru france 10650935

Ah! E já que falei dos “vinhos brotritizados” vou comentar sobre os deliciosos vinhos doces de Bordeaux feitos com Semillón, Sauvignon Blanc e/ou Muscadelle. Com a ajudinha dos rios Garonne e Ciron, é possível aparecer uma neblina matinal na região que produz os vinhos doces, algo perfeito para o desenvolvimento da Botrytis Cinerea. É de lá que vem os famosos e deliciosos Sauternes, e também os não muito famosos, porém saborosíssimos, Barsac e Céron. Todos esses vinhos são bastante longevos. Em safras excepcionais podem chegar até cem anos. Ainda em Bordeaux, podemos encontrar também outros grandes vinhos doces: Loupiac, Cadillac e Sainte-Croix-du-Mont, além dos Côtes de Bordeaux Saint-Macaire e Franc-Cotês de Bordeaux.

IMG 3632 612x1024
Chateau d´Yquém: exemplo de um ma-ra-vi-lho-so vinho doce produzido em Bordeaux, na região de Sauternes.

O Loire também contribui com excelentes vinhos doces à base de botrytis. Todos feitos com a uva Chenin Blanc. São eles: Coteaux du Layon, Chaume 1er Cru, Coteaux de l’Aubance, Quart de Chaume Grand Cru, Anjou Coteaux de La Loire, Bonnezeaux e Savanières, Mont-Louis-Sur-Loire, Vouvray e Coteaux de Saumur.

domaine les grandes vignes coteaux du layon selection de grains nobles loire france 10274961

Embora raro, no Rhône, também é possível encontrar um “vinho botritizado” feito exclusivamente a partir da Viognier. Ele é produzido em Condrieu, no Norte da Região. É conhecido como Condrieu doce.

th 6

Por último vou falar sobre os principais vinhos doces do Sudoeste da França, pouco conhecidos aqui no Brasil e que concorrem muito bem com os doces de Bordeaux.  São eles: Saussignac, Rossete, Monbazillac, Cotês de Montravel e Haut-Montravel. Todos elaborados com as mesmas uvas dos famosos Bordeaux doce, ou seja, Sauvignon, Sémillon e Muscadelle. Além desses, ainda existem dois outros vinhos brancos doces de colheita tardia muito especiais no Sudoeste da França: o Juraçon, com as uvas Gros Manseng e Petit Manseng e o Pacherenc-du-Vic-Bilh – elaborado também com Gros Manseng e Petit Manseng e com as pouco conhecidas Ruffiac e Petit Courbu – todas brancas.

 

Os comentários nas postagens e os conteúdos dos colunistas não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir comentários que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.