Ô, Ana Júlia
“Quem te vê passar assim” na Assembleia Legislativa, com essa carinha tão de adolescente, de fato, não sabe o que é sofrer. Desconhece a angústia que é pensar em um futuro em que as escolas públicas, hoje já tão sucateadas, tenham ainda menos investimentos. Um futuro em que é possível vislumbrar a educação em estado de morte cerebral, funcionando com a ajuda de aparelhos (estatais). Na vindoura internação em estado grave da educação pública brasileira, secundarista e superior, não se puxa o plugue de uma só vez, vive-se em um estado vegetativo chamado “Escola sem partido”.
“Nunca acreditei na ilusão”, como você, de que “sem partido” significasse apartidária. O direito ao conhecimento crítico e reflexivo só é convenientemente confundido com doutrinação em um país que vive a temer que as pessoas pensem, debatam, discutam, questionem. “Lei da Mordaça”, nunca um apelido ligou tão bem o nome à pessoa.
“Me atormenta a previsão do nosso destino” , Ana Júlia, como também aflige a você. “Eu passando o dia a esperar” que enfim se compreenda que 20 anos correspondem ao tempo de uma vida. Mais tempo que a sua própria, pouco mais do que a minha. Em 20 anos, toda uma geração sofrerá o impacto de um arrocho nos investimentos em educação e saúde. “Quando tudo tiver fim”, em 20 anos, ficaremos mais ignorantes e mais doentes. Em vinte anos. Muito tempo para viver sem perspectivas. Pouquíssimo tempo para causar danos irreversíveis.
“A quem a escola pertence?”, você questionou, ô Ana Júlia. A escola é de vocês, tem que ser de vocês, tem que falar para vocês. Como você, também tenho medo de que ela se torne um centro formador de reprodutores de conhecimentos vazios, desprovidos de interpretação, de humanidade, de empatia e de questionamento . “Será sempre um espinho dentro do meu coração”.
Mas quando palavras como as suas refletem uma juventude, por vezes tão desacreditada, em uma luta séria, justa e genuína por uma escola que seja capaz de formar cidadãos, e tomando a escola, lugar que, por direito, é seu… Ô, Ana Júlia, eu quase tenho coragem de sonhar. Ô, Ana Júlia!