Família tem cinco irmãos portadores da ELA


Por LILIANE TUROLLA

28/08/2014 às 06h00

José Orlando Pereira Dato, 52 anos, metalúrgico aposentado, apaixonado por esportes, casado, pai de três filhos. Aos 40 anos ele sentiu que algo estava errado com seu corpo. "As pernas não acompanhavam mais. No futebol, falavam que meu rendimento não era o mesmo, não conseguia fazer alguns movimentos na capoeira, estava sempre cansado. Diminuí o ritmo, achei que era a idade." Após 22 internações, dezenas de exames e consultas com oito especialistas, veio o diagnóstico: esclerose lateral amiotrófica, a ELA.

"Os médicos relutaram em diagnosticar, falta muito conhecimento sobre a doença. Minha mãe morreu muito nova com ELA. Foi um choque receber a notícia, eu sabia como é a evolução, que não tem cura. Mas encarei e estou superando as expectativas com 12 anos de parecer médico." José Orlando perdeu a maioria dos movimentos do corpo. A respiração é feita por um aparelho "inseparável", e a movimentação fica por conta dos familiares. Entre os nove irmãos Dato, cinco são portadores da ELA. Na família são 318 casos registrados.

A ELA ficou mais conhecida por causa do "desafio do balde de gelo", em que celebridades fizeram vídeos tomando banhos frios e falando sobre doações para instituições que estudam e tratam a doença. "Poderia ter sido feito de uma forma mais agradável aos olhos de quem necessita da campanha. Muitos levaram na brincadeira e não sabem a gravidade da doença, o que passamos. Mas, ainda assim, é importante, pois está chamando atenção para a nossa situação. Laboratórios podem se interessar em avançar com as pesquisas para a cura."

 

A doença

A esclerose lateral amiotrófica se caracteriza por paralisia progressiva da musculatura dos membros e de alguns órgãos. As funções vocais, respiratórias, deglutição e digestão também são comprometidas. As capacidades mentais e psíquicas permanecem, na maioria dos casos, inalteradas. A doença é desencadeada por um processo degenerativo no sistema nervoso e não tem cura.

Conforme a professora de fisiologia médica da Faculdade de Medicina da UFJF, Carla Malaguti, não se sabe a origem da doença. Existem casos isolados ou hereditários. A expectativa de vida varia entre cinco a oito anos, após os primeiros sintomas. No entanto, ela alerta que cada caso tem suas particularidades. "Em alguns pacientes, a evolução é muito rápida e mata em até um ano. Em outros, a expectativa é superada, tudo depende dos cuidados, do tipo e de como a doença é encarada", afirma a professora.

 

 

União e bom humor para encarar a doença

Ana Amélia Dato Teixeira, 54 anos, é a mais velha dos irmãos Dato. São nove anos de convivência com a ELA. "Eu achava que ia escapar porque já tinha passado da idade que o José Orlando apresentou os sintomas. Achei que a fadiga muscular e o cansaço eram por conta da musculação. Passou um tempo, e eu não conseguia mais subir as escadas de casa. Já fui ao médico sabendo o que me esperava."

Depois deles, vieram os diagnósticos da Maria Lúcia, 51 anos, há seis com ELA; do Paulo Roberto, 48 anos, doente há quatro; e da Mônica, 46 anos, o caso mais recente da família, dez meses. A preocupação deles é que na faixa etária que estão os outros quatro irmãos, ainda podem surgir mais casos entre eles, sem contar os filhos e netos que, segundo os médicos, têm 50% de probabilidade de manifestarem a doença.

"Nós aprendemos a lidar com a ELA, tivemos que desenvolver nossos recursos. É muito difícil, a gente sabe que está morrendo a cada dia, tenho três filhos e uma neta. O mais triste de tudo é saber que algum deles vai ter essa doença. Por eles, muito mais do que por mim, estou mergulhando nessa campanha para arrecadar fundos para as pesquisas. Temos sede para que a cura seja encontrada e que eles não passem por isso. Fazemos parte de todos os grupos de discussão na internet, inclusive da Argentina, de Portugal e da Espanha. Somamos forças para lutar", relata Ana Amélia emocionada.

"Temos que viver um dia de cada vez, com muito humor. Nossa família é muito alegre, e todos temos um amor enorme um pelo outro. Fazemos piada com a gente mesmo. Temos nossas limitações, mas não deixamos de fazer nada", relata José Orlando.

 

Doença rara e cara

Segundo Carla Malaguti, professora de fisiologia médica da Faculdade de Medicina da UFJF, uma a cada cem mil pessoas tem ELA. "No Brasil, são 15 mil portadores, poucos casos se comparados a outras doenças crônicas, por isso faltam investimentos em pesquisas."

O tratamento dos irmãos é custeado pelo plano de saúde, pelo SUS e com recursos particulares. "É uma doença cara. Tenho em casa duas camas hospitalares, tubos de oxigênio e o aparelho de ventilação mecânica. Meus irmãos tomam um medicamento para retardar os sintomas da doença, cada caixa custa R$1.800. Além disso, preciso de fonoaudióloga duas vezes por semana, se eu não fizer, a fala e a deglutição pioram, e de fisioterapia pelo menos três vezes na semana. O plano relutou muito em ceder isso, mas conseguimos este mês", conta José Orlando.

Apesar de todos os problemas e da consciência do que estar por vir, entre os Dato o bom humor e a esperança prevalecem. Não é um lar triste. Eles são uma família feliz.

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