Estamos a um mês do carnaval e os ânimos já se exaltam aqui e ali, no aquecer dos tamborins, graças à universal ansiedade que a tudo devora. O pintor já não consegue se ocupar de lixar a parede e o engenheiro não encontra foco para executar os cálculos. Jornalista só quer saber se vai estar na escala de plantão e até os padres têm dificuldade de organizar a agenda de celebrações da Quaresma.
Os anciãos buscam na internet, óculos na ponta do nariz, um refúgio para os dias de festa; no quarto ao lado, os adolescentes planejam a jornada para dentro do olho do furacão de confete e serpentina. Nada anda direito nesses dias que precedem a festa da “carnem levare”, como dizia o latim, a festa profana que anuncia a “retirada da carne”, o período de 40 dias de abstinência.
Sábado, domingo, segunda e terça que precedem a Quarta-Feira de Cinzas são os dias do desbunde. Do aguenta, fígado, que é leite. Quando os tímidos se assanham e as recatadas mostram o umbigo. É época de cometer todos os excessos, porque segundo a tradição cristã virão aí 40 dias de penitência na companhia de Jesus, de mochilão pelo deserto, resistindo às tentações do Capeta.
Mas até que cheguem os quatro dias de pé na jaca, existe o mês de janeiro. Um mês perdido em suspensão. De letargia geral. Janeiro não tem ano. É um vazio na folhinha. Um buraco negro entre o fim do ano e o carnaval, sugando a energia de tudo que lhe orbita. É o mês da espera pelo novo ano que, após o meio-dia da Quarta de Cinzas, sacudido o glitter das covinhas mais recônditas, enfim começará.
Carnaval, Ano Novo