José Luiz Ribeiro: Na redação, na sala de aula e nos palcos
“Como autor, sou jornalista. Na sala de aula, sou ator. E no palco, sou professor.” Há quem diga que quando José Luiz Ribeiro nasceu, em 1942, abriu os olhos e viu sua plateia: o médico e a enfermeira. Desde então, sua vida foi construída em atos, no qual foi o protagonista em diferentes papéis. Ora professor, ora jornalista, também pai e recentemente avô. Fato é que as luzes da ribalta sempre estiveram apontadas para o homem que vive e empresta seu corpo para arte, seja ela qual for.
Filho de pais portugueses, cresceu nos jardins do Museu Mariano Procópio, brincava de caubói imitando os mocinhos dos filmes de faroeste que assistia no cinema. A infância foi regada a imaginação e religiosidade, uma se misturando à outra. Foi na igreja que teve o primeiro contato com o teatro. “O teatro surgiu em minha vida pela via do terror”, conta. A primeira peça que assistiu foi “Branca de Neve e os sete anões”. Ficou apavorado com o caçador e os apelos da jovem moça por misericórdia.
Na adolescência se esbaldou de cultura, lia tudo o que aparecia em sua frente, de Shakespeare a clássicos da literatura nacional. Na música, ia da MPB para a ópera com o mesmo fascínio. O gosto pelas artes o influenciou a escolher a faculdade. Após passar um período no Exército, mais por influência da família, cujo sonho era que ele seguisse a carreira militar, ingressou no curso de jornalismo da Faculdade de Filosofia e Letras, a Fafile. “Quando eu olhei a grade, era a única faculdade que oferecia a disciplina de história da arte. Eu sempre gostei de escrever também. E claro, como geminiano, o signo da fofoca, sempre gostei de fazer circular notícias.”
Em meio ao estudo das pautas e diagramações, conheceu Maria Lúcia Campanha da Rocha, sua companheira de vida e de arte, a famosa Malu. É impossível conversar com José Luiz sem que seu nome seja carinhosamente mencionado. Malu já era formada em letras e agregou ao teatro a paixão pela palavra. Casados desde 1971, tiveram dois filhos, Tarsila e Frederico, e há pouco tempo se tornaram avós. “Minha netinha de 3 anos chegou no segundo tempo, quando já ia encerrando ela apareceu. E ela adora tudo o que eu gosto, gosta de música, gosta de dança, de teatro.”
Foi na época de faculdade que também nasceu o Grupo Divulgação. A história da trupe se mistura com a história de José Luiz, de Malu e de tantos outros atores que tiveram sua vida marcada pelo companheirismo surgido no teatro. Em 1966, estreava o espetáculo “Amor em verso e canção”, no palco da Escola de Laticínios Cândido Tostes. A turma do centro de estudos teatrais da Fafile reuniu poemas de Drummond, Cecília Meireles e Neruda, em um encontro que daria luz ao Divulgação: “divulgar autores, divulgar palavras, divulgar ideias”. Ativo até os dias de hoje, o grupo segue com peças em cartaz e atraindo artistas amadores de todo país. José Luiz conta orgulhoso de integrantes que escolheram Juiz de Fora como casa pensando no Divulgação. “Muitos estudantes da UFJF que vêm participar do grupo contam que escolheram a Universidade motivados pelo Grupo Divulgação. Às vezes vêm de longe só para participar com a gente.”
Desde a primeira vez em que pisou no palco, José Luiz nunca mais saiu. Ator multifacetado, atuou também como jornalista no “Jornal do Brasil”, na época, um dos maiores impressos do país. Fazia estágio na redação durante suas férias, escrevendo no caderno de cultura. “Estava tudo certo para eu ir para o Rio de Janeiro depois que me formasse. Mas em 1968 tive uma experiência de quase morte, uma úlcera perfurada. Nisso, eu tive a viagem da minha vida. Sabe aquele túnel de luz que eles mostram nos filmes? Foi como aquilo.” Depois disso, decidiu permanecer em Juiz de Fora. Alçou o nome da cidade para além do Atlântico e por todo Brasil. Foi convidado para dirigir espetáculos na Cidade do Porto, em Portugal, a correr o país como jurado em festivais, além de comandar, por um período, a escola do Palácio das Artes, em Belo Horizonte.
Participou, em 1970, da Barca da Cultura. “Foi uma experiência daquela que todo mundo saiu maluco.” Deixaram Pirapora, no Norte de Minas Gerais, e foram até Juazeiro, na Bahia. Apresentaram a peça “Cancioneiro de Lampião” em cima de caminhões e, quando tinha, nos teatros das cidades. “Ficamos 60 dias viajando pelo interior do país. A barca sempre chegava ao alvorecer, nós empunhando bandeiras, cantando, dançando. Foi muito rico, uma aula de geografia, de história, de arte.”
A vocação para formar, seja atores, plateias ou cidadãos, fez José Luiz se aproximar da vida acadêmica. Passou em um concurso para ser professor na Universidade Federal de Juiz de Fora, onde lecionou para os cursos de Comunicação Social, Artes e Serviço Social. “Quando completei 70 anos, me expulsaram do paraíso das aulas da graduação.” Hoje, aos 81, ainda à frente do Divulgação, vai completar 60 anos de teatro. “Depois desse tempo todo a gente acaba sendo o fio do cordão de pérolas. Muitas pérolas passam por aqui e você acaba sendo o fio que une todas elas. Esse ano estou completando 60 anos de teatro. Já avisei que até o fim do ano eu saio, quero ver se eles vão deixar”, afirma rindo. Mas não tem jeito, José Luiz vive o Divulgação da mesma forma que o grupo vive nele. A plateia que o saudou desde seu primeiro suspiro segue firme o acompanhado a cada passo, no espetáculo mais fascinante que já escreveu: sua vida.