A moçambicana Lúcia Tite usa a poesia para denunciar o racismo e a violência

Por Marisa Loures

Foto Lúcia Tite2
Campeã da edição especial do Slam Viral, Lúcia Tite participou do Arte e Cultura em Debate, evento organizado pelo poeta juiz-forano  Ícaro Renault com o objetivo de discutir temas, como a desvalorização da cultura – Foto Arquivo Pessoal

“Mas qual pai é esse/ Que me pega com a mesma pegada/ Que pegará os cabritos antes de esfolar/ Cedendo, e eu que acabei cedendo com medo de me matar./Mas me agarrou com aquele olhar de destruir/ que não dava para tentar fugir./ Para depois abrir-me o ziper/e enfiar-me a arma que usou para matar a virgindade da minha amada mãe.” É com os versos fortes de “A arma do violador” que a moçambicana Lúcia João Tite venceu, em 2018, o Mozslam, campeonato de poesia falada de seu país. Ao sagrar-se campeã, ela garantiu uma vaga na Copa do mundo de poesia falada, realizada em 2019, em Paris. Ainda passou pelo Brasil, onde representou Moçambique no Rio Poetry Slam. No último domingo, Lúcia estava entre os convidados do encerramento da primeira edição do Arte e Cultura em Debate, evento on-line organizado pelo poeta juiz-forano Ícaro Renault. O objetivo desse encontro virtual que reuniu vários artistas foi debater temas, como a arte nos tempos de pandemia e a desvalorização da cultura.

Aos 20 anos, Lúcia Tite é conhecida como a Poetisa Revoltada. Isso porque ela não consegue fechar os olhos a “todos os males”, como explica em entrevista a esta coluna. Ela ainda estava no Ensino Primário quando começou a escrever, e suas habilidades aumentaram no Ensino Secundário, auxiliada pelos professores de Língua Portuguesa. “A poesia representa uma parte de mim, e o slam trouxe outras visões e inspirações”, conta a jovem que, no mesmo ano em que levou a melhor no Mozslam, fisgou o primeiro lugar no Concurso de Declamação da Universidade Pedagógica, sediada em Maputo, capital de Moçambique, e no Concurso de Declamação em homenagem ao poeta e político moçambicano Marcelino dos Santos. Agora em agosto, Lúcia Tite também conquistou o título de campeã da edição especial do Slam Viral. Esse concurso on-line  levou ao público poesias de participantes de países de língua oficial portuguesa. Quem quiser acompanhar os passos dessa poetisa revoltada, seu instagram é luciatite19.

Marisa Loures – Além de um acontecimento poético, o Slam é um movimento de reivindicação. O que é que você reivindica com a sua poesia? O que mais tem causado revolta em você ultimamente?

Lúcia Tite – Nas minhas poesias, eu reivindico, denuncio violência física ou psicológica e o racismo. O que tem me deixado mais revoltada é o preconceito e o racismo.

– E aqui no Brasil o Slam está conquistando cada vez mais adeptos. Ele tem sido um forte aliado na popularização da poesia. Como é aí em Moçambique? Conte-nos como é o cenário da poesia falada no seu país.

Por acaso, aqui em Moçambique também está sendo bastante intenso. Temos alguns slams também. Aqui no meu país, tratam a poesia de uma forma bastante positiva. Nas escolas, sempre têm ocorrido competições de literatura. Os alunos vão participando e, de certa forma, vão aperfeiçoando.

– Escutei você declamar “A arma do violador”, poesia apresentada na grande final do Mozslam. É um texto muito forte. Nele você fala sobre abuso sexual e casamentos prematuros. Qual é a história que está por trás dessa poesia?

O texto a “Arma do violador” surge de uma revolta minha, porque, sempre que acompanho notícias, tenho visto meninas sofrendo abuso sexual pelos seus próprios parentes. Escrevi para mostrar a essas pessoas que praticam esses males para que parem.

– Você veio ao Brasil representar Moçambique e participa agora do “Arte e cultura em debate”, organizado pelo poeta juiz-forano Ícaro Renault. Como tem sido sua relação com os slammers brasileiros?

Tenho uma boa convivência com slammers brasileiros. Foi na França que recebi convite para ir para o Brasil. Eu me senti bastante honrada. Em textos de outros poetas, pude perceber outras histórias, e isso é muito bom, e, de certa forma, tive outras inspirações. E tive amigos também.

– Como você costuma criar seus textos?

Os meus textos nascem das coisas que vejo, vivo e sinto.

– Aonde você quer chegar com a sua poesia?

Com a minha poesia, eu quero chegar ao infinito.

Sala de Leitura – Toda sexta-feira, às 11h35, na Rádio CBN Juiz de Fora (FM 91,30)

                     

 

 

Marisa Loures

Marisa Loures

Marisa Loures é professora de Português e Literatura, jornalista e atriz. No entrelaço da sala de aula, da redação de jornal e do palco, descobriu o laço de conciliação entre suas carreiras: o amor pela palavra.

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