O ‘fenômeno Bolsonaro’
Mais um programa de debate passou, e a imagem de Jair Bolsonaro segue cada vez mais forte. O “Roda Viva” dessa segunda-feira (30) escancarou mais uma vez a maior deficiência de quem se opõe às palavras duras do candidato do PSL: o local dos ataques. Durante quase uma hora e meia, alguns dos mais brilhantes jornalistas do país puseram contra a parede o deputado, questionando-o sobre os pontos já batidos de sua candidatura. E, durante quase uma hora e meia, ele se esquivou brilhantemente.
Quando surgiram perguntas sobre as recorrentes declarações ofensivas aos Direitos Humanos, levou a conversa de volta para a corrupção e o aumento da violência no país. Ao ser lembrado do pouco resultado de sua atividade parlamentar, se disse responsável por evitar a aprovação de projetos nocivos à nação. Diante das denúncias que correm contra si e das acusações de subversão no período em que esteve na ativa e uso excessivo de verba pública, se disse vítima de fake news à Trump e calúnias que serão provadas nos tribunais.
Em resumo: Bolsonaro foi ao “Roda Viva” preparado para ser atacado e se deparou com uma chuva de bolas levantadas. Inteligentemente, atacou todas e marcou pontos com seu eleitorado. Para estes, disparou frases de efeito sobre nunca ter sido pego pelas investigações da operação Lava Jato e acusações contra a militância de esquerda e o trio PT-PSDB-MDB. Nessa noite, foi fácil ser Bolsonaro. Assim como tem sido há tempos, com os inacabáveis escândalos de corrupção e crimes hediondos noticiados quase diariamente.
É preciso entender que Bolsonaro pode estar há décadas no jogo político nacional, mas não representa, necessariamente, a velha política. Na verdade, o ex-paraquedista é um produto em constante evolução da política tradicional e suas consequências. O “fenômeno Bolsonaro” é o natural resultado do vácuo de legitimidade causado pela corrupção dos desgovernos petistas e tucanos e do parasitismo emedebista, expandido e que hoje atende pelo nome de “Centrão”, em forma de um grupo de legendas que nada significam além da busca por poder e dinheiro. Numa sociedade pobre, violentada nas ruas e roubada por quem deveria representá-la, nada mais genuíno que o crescimento de uma figura como o deputado.
Bolsonaro não é o tipo de candidato que se derruba mostrando a aberração que é, mas iluminando a face do que deixa de ser. O parlamentar é vazio, não tem propostas concretas nem conhecimento básico sobre a maioria das questões que precisam ser tratadas por um presidente e muito menos sobre o que é a democracia. Diante dessa fragilidade, como muleta, ataca de forma vaga o que incomoda a população: o desemprego, a corrupção e a violência.
Por incrível que pareça, para tirá-lo da sua zona de conforto, é preciso mirar fora do alvo. Atacar o pouco apreço pelos Direitos Humanos, sua negligência aos abusos da ditadura militar e a baixa produtividade de seus sete mandatos como deputado é muito fácil e pode até gerar curtidas para quem quer aparecer nas redes sociais, mas não é nada efetivo. Seu eleitorado, em busca de uma solução fácil para problemas complexos, está preparado para ir com seus defeitos até o fim.
Projetando-se o maior número de votos nulos e brancos da história, a eleição de 2018 será vencida por quem conseguir fisgar a imensa massa amorfa que ainda não se sente representada por ninguém. Por isso, quem quer ultrapassar Bolsonaro precisa atingir seu ponto fraco: o conteúdo que o falta em praticamente tudo. O desafio é grande e cresce ainda mais num país de acesso à informação tão limitado, com 13 milhões de desempregados e crescimento da pobreza extrema. De toda forma, há tempo, e a sorte ainda não foi lançada.