Dois suíços da poesia: Prisca Agustoni escreve sobre Fabio Pusterla
Tradutora da obra do suíço, seu conterrâneo, poeta e professora da UFJF fala de “Argéman”, que ajuda a trazer para o Brasil
“O poeta Fabio Pusterla, nascido em 1940 em Mendrisio, na Suíça italiana, convidado para a próxima edição da Flip, é considerado uma das vozes mais importantes da poesia contemporânea italiana. Sua produção poética, inaugurada em 1985 com a coletânea Concessione all’inverno e seguida de mais de trinta títulos (entre poesia, narrativa breve, edições especiais e de arte e traduções), tem alguns eixos temáticos principais que se agrupam ao redor da observação da natureza como movimento de escavação do olhar e do pensamento para uma maior compreensão da existência. Retomando a tradição do suíço Robert Walser (1878-1956) – cuja literatura e vida estão intrinsecamente marcadas pelo gesto de caminhar na natureza para, através dela, apreender as variantes invisíveis da alma humana -, Pusterla também se serve das palavras como lentes para construir uma obra literária que tem na representação da natureza um dos seus focos principais de investigação. Seu universo poético lança um olhar agudo e sensível sobre a paisagem humana, animal, vegetal e mineral que povoa seus versos, para deles extrair uma reflexão sobre os saltos nas “eras geológicas”, conforme cita um dos seus versos.
De fato, na poesia de Pusterla encontramos uma concepção do tempo que caminha na contramão da pressa e da sua leitura como algo a ser devorado – e que nos devora – ; ao contrário, diria que através da observação dos resíduos largados pela passagem do humano na terra (incluindo, nestes, as marcas simbólicas como o são as línguas que não deciframos), o poeta percebe os hiatos temporais (eras geológicas, longas temporalidades fundamentais para que exista uma geleira no topo da montanha, etc.) necessários para que sejamos o que somos, isto é, filhos de uma época (que é histórica, real) e de determinado “sentimento do mundo”. Um olhar que escava, pois, debaixo da neve dos Alpes assim como sob as águas do oceano para encontrar uma palavra que ainda pulse com vigor e se cubra de sentido, quiçá anterior à distopia à qual a experiência do contemporâneo, com suas incertezas, fragmentações e simultaneidades, parece condenar-nos.”
* Prisca Agustoni é poeta, tradutora e professora de literatura italiana na UFJF
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