Vozes silenciadas que ecoam


Por Leandro Barbosa

20/04/2017 às 07h00- Atualizada 16/08/2019 às 19h10

Em tempos de perseguição a direitos de minorias e a retrocessos sociais no Brasil, as expressões artísticas-culturais, em especial a música, têm ocupado a posição de contra-hegemonia do sistema. O conservadorismo latente, dentro e fora do país, ainda não conseguiu intimidar essa geração de artistas empoderados e inteirados da conjuntura sociopolítica atual. Como é boa a existência desses espaços de luta, resistência e militância!

A exemplo do samba, que surgiu nos morros e, aos poucos, ocupou o asfalto, em terras tupiniquins, as vanguardas musicais cumpriram e cumprem esse papel desde sempre. Na iminência de um regime ditatorial, do movimento estudantil e universitário, emergiram artistas combativos que se negaram a calar-se diante da força bruta. As vozes silenciadas dos guetos conquistaram e continuam conquistando lugares progressivos em nichos antes impenetráveis, propalando-se pela sociedade.

Hoje, a internet, como força balizadora dos movimentos sociais, faz com que cantores e cantoras produzam mais conteúdo. Cantam, compõem, escrevem, falam e falam de si! A militância através da arte já não é exclusividade das elites intelectuais. Hoje, temos menos a branca guerreira cantando sobre africanidades e mais a negra falando de negritudes. Não é mais só o poeta do político e do feminino da Lagoa Rodrigo de Freitas cantando, mas é a travesti periférica falando de femininos e repressão social. Os cantantes do início, sem dúvidas, foram e são importantes, inclusive referência para os atuais, mas estamos falando de lugar de fala.

O mundo digital também fez com que essa música alternativa tivesse sonoridades mais acústicas, temáticas profundamente politizadas e conteúdos audiovisuais extremamente plásticos. Os espaços nas rádios e na televisão, antes fechados para esse som, se veem obrigados a atentarem para essa movimentação no mercado fonográfico. E não é sobre o lixo comercial feito para vender durante o verão, é sobre a música que não é descartável no carnaval.

Não são os ruídos bélicos de um “paredão zangado” ou de um “bumbum granada”, mas são as vozes armadas que ecoarão por gerações em um país em que nada está tranquilo e, muito menos, favorável. Estes ecos estão e continuarão vindo dos guetos, campos, sertões, morros e das favelas. Há quem goste de música vazia feita para dançar, e não há problema nisso, mas existem canções com letras e melodias poderosas suficientes para fazerem cantar, dançar, refletir e se apaixonar.

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