Um homem PRETO livre!


Por Edvaldo Tomé Silva, advogado

19/06/2019 às 07h01

“Os democratas só estão em Washington, D.C., por causa do voto negro. […] Vocês os colocaram em primeiro lugar, e eles os colocaram por último, porque vocês são estúpidos. Politicamente estúpidos. Sempre que vocês jogam seu peso político por detrás de um partido que controla 2/3 do governo, e este partido não mantém as promessas que lhes fez durante a época de eleição, e vocês são idiotas o suficiente para continuarem a se identificar com esse partido, vocês não são apenas estúpidos, são traidores de sua raça” (Malcolm X, em 1964).

A citação acima é parte do discurso proferido pelo líder negro separatista Al Hajj Malik Al-Shabazz, mais conhecido como Malcolm X, durante o Movimento dos Direitos Civis dos anos 1960, nos Estados Unidos da América. Nessa ocasião, Malcolm X faz uma crítica severa aos negros que colocavam suas esperanças em partido político.

A insurgência de Hajj Malik é válida se compreendermos que a luta pelos direitos civis naquela ocasião estava além das questões ideológicas. Ele e o Rev. Martin Luther King não eram republicanos ou democratas, visto que a causa pela qual eles lutavam, ainda que discordantes em alguns pontos, não admitia partidarismo.

Já no Brasil atual, as coisas parecem ter saído do controle. A militância negra, ao submeter sua luta às causas político-partidárias, entregou-se à “escravidão ideológica”. O professor Paulo Cruz assim define o termo: “é a submissão intelectual e moral a pseudoconceitos e ativismos políticos considerados apodíticos e inquestionáveis – sobretudo em relação a problemas sociais complexos (como o racismo) -, mas explorados de forma que o problema em si mesmo nunca seja efetivamente contemplado, mas promova o benefício daqu eles que dele se apropriam. Essa submissão ideológica, sobretudo às teorias marxistas (por exemplo, conceitos como “opressor” e “oprimido”), gerou um processo de vitimização do negro, de supressão de sua liberdade de consciência, de alijamento de suas referências e, sobretudo, na criação de uma tensão social insolúvel, pois, uma vez que as categorias de raça e classe tornaram-se indissociáveis, cumprem seu papel dialético numa luta política que só interessa à esquerda – que usa os movimentos sociais como hospedeiros de suas ideologias -, mas não visam à resolução do problema.”

Exemplo clássico dessa escravidão ideológica foi o fato que gerou a matéria divulgada no último dia 12 de junho neste jornal, na qual um vereador de Juiz de Fora, em uma conversa com um cidadão, através de aplicativo de mensagem, diz enfaticamente que “pobre, preto e de periferia que apoia Bolsonaro e ataca Lula não merece respeito”.

Aqueles que possuem opinião política contrária ao que pensa o ilustre vereador, sobretudo o PRETO, não merece respeito, pois como pode um indivíduo PRETO e pobre ter capacidade de pensar por si só? Para o mandatário do povo, indivíduos como eu (PRETO), necessitam do amparo de partidos políticos, mais precisamente de suas ideologias, e pensar conforme os mesmos, criando, assim, a “senzala ideológica”. Tal pensamento é patético!

Não podemos aceitar que partidos políticos (sejam eles de esquerda ou de direita), dotados de suas ideologias, possam estabelecer aquilo que os NEGROS ou PRETOS (conforme classificação do IBGE) devem pensar, falar ou como agir.

A história do negro no Brasil não está condicionada a líderes de partidos políticos ou de ex-presidentes, e sim à sua própria causa, ou seja, a solução do problema do negro passa por uma mudança cultural, não por uma revolução política.

Sou PRETO, sr. vereador, de família humilde, porém um homem livre, de modo que eu posso pensar da maneira que eu quiser sem que, necessariamente, o senhor tenha que dizer como eu devo agir. Não. Não faço parte de nenhuma senzala ideológica.

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