A invisibilidade da pessoa (aluno) surdo


Por GABRIEL PIGOZZO E ANA PAULA XAVIER, MESTRANDOS EM DIVERSIDADE E INCLUSÃO

19/06/2016 às 07h00

Se pesquisarmos nos dicionários da língua portuguesa o conceito de invisível, encontraremos algo do tipo: “aquilo que não se vê; o que não se pode ser visto; que não se deixa ver”. E, em educação, o que podemos chamar de invisível? Ou melhor, na educação de/para/com/dos surdos, o que significa invisibilidade? Quem são invisíveis neste processo? Por que são? São por que não se deixam ver ou por que não os vemos? Se vemos, os enxergamos?

Há tempos, trilhamos este árduo e prazeroso caminho: a educação de/para/com/dos surdos. Algumas posturas, ou não posturas, vêm nos incomodando um pouco (ou melhor, muito). Percebemos que, durante o processo de escolarização básica, os alunos surdos não são vistos dentro do ambiente escolar. Aí, você, leitor, nos perguntará: como não são vistos, se na escola perto da minha casa tem um@ alun@ surd@? Percebeu? Perto da sua casa tem “um@”. Não muit@s. Sozinh@s. Isolad@s. Numa escola que não fala sua língua (Língua Brasileira de Sinais – Libras). Uma escola que foi toda pensada por ouvintes e para ouvintes. Onde os materiais são preparados por ouvintes e para ouvintes. Onde as aulas são ministradas para ouvintes e por ouvintes. Onde os métodos, as estratégias, os recursos são pensados para ouvintes e por ouvintes. Todos com foco na língua portuguesa. Língua essa majoritária em nosso país, constituindo, assim, um monolinguismo. Uma contradição, não acha? Um país de dimensões continentais, com uma população de mais de 200 milhões de pessoas, e apenas uma língua é privilegiada na escola. Pode?

Retornando à invisibilidade, é possível você entender, agora, o por quê de nossos alunos surdos serem invisíveis? Alunos frequentando ambientes cuja língua natural não tem status de língua, e sim de linguagem. Professores usando metodologias tradicionais, não se importando com o processo de aprendizagem “formal” destes alunos. Aluno surdo recebendo instrução numa língua que não é a dele. “Sendo” (com muitas aspas) alfabetizado numa segunda língua sem ter aprendido uma, a sua, a Libras. Alunos aprovados à revelia, enquanto outros se mantêm, durante longos períodos, num mesmo ano escolar. Docentes não preparados (em pleno século XXI e com diplomas) atuando junto a estes alunos.

Essa é uma realidade nacional. Nós que atuamos na educação de/para/com/dos surdos lutamos por uma educação de qualidade e uma qualidade na educação destes sujeitos. Qualidade esta adquirida quando oferecemos espaços onde as línguas envolvidas possuem o mesmo status quo, onde cada uma delas tem seus papéis definidos. Onde são respeitadas a subjetividade, a linguística, a identidade e a cultura deste alunado. Onde a língua de instrução seja a Libras e onde toda a estrutura seja pensada para eles e por nós (Surdos e ouvintes). Uma educação para tod@s. Uma educação que possa oferecer oportunidades, e não tirá-las.

No atual cenário da educação de/para/com/dos surdos, nos recordamos de uma frase proferida pelo sr. dr. Ladreit de Lacharrière, presidente do Comitê de Organização (Seção de Ouvintes) do Congresso Internacional para Estudos das Questões de Educação e de Assistência de Surdos-Mudos, que ocorreu em 1900, na cidade de Paris, na França: “Enquanto o ingresso na escola é um direito para o que escuta, é um favor para o surdo-mudo”. Perguntamos novamente para você, leitor: essa educação é um favor? Ou a escola deve, realmente, ser para TOD@S?

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