O aprender nosso de cada dia
Por muito tempo, os brasileiros hastearam de forma ostensiva a bandeira de viver em um país de jovens. Talvez essa seja uma das raízes fortes e profundas da desvalorização da experiência da população idosa no nosso país. Entretanto, observa-se um novo panorama, um Brasil que envelhece e que ocupará o sexto lugar quanto ao número de idosos, alcançando, em 2025, aproximadamente 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais de idade.
Em meio a esse cenário crescente da população idosa, muitos são ainda analfabetos ou semianalfabetos. São brasileiros e brasileiras acima de 60 anos que fazem parte de uma triste estatística, a do idoso analfabeto. A busca desse resgate social é de responsabilidade de todos nós, pois aprender a ler e escrever para uma pessoa idosa é mais do que proporcionar dignidade, é dar-lhe um sopro para uma nova vida, é descobrir um novo mundo e ter por esse mundo o sentimento de pertencimento. E é nesse sentimento que a pessoa idosa olha para a frente, descobre caminhadas novas, se autoenxerga, interfere e mais do que isso, compreende a importância da sua intervenção nos diversos contextos da vida.
Quando um aluno idoso entra numa sala de aula para aprender a ler e escrever, carrega o lápis, o caderno, a borracha com todo carinho e cuidado, como um troféu conquistado após muito esperar, e, mais ainda, ele traz na sua alma o sonho, a esperança, conforme enfatiza o grande educador Paulo Freire ao falar que o aluno traz a esperança de estar sempre pronto a começar de novo, a buscar o seu sonho, eticamente válido e politicamente necessário. Freire ressalta que a esperança implica compreender criticamente a realidade para transformá-la, e é ela a força que ajuda a semear a beleza ou a “boniteza”, como gostava de falar. Para ele, esperança não se confunde com ilusão dos sentidos, alienação, mas tem um elemento de sonho que motiva a caminhada humana.
Sendo assim, ler e escrever para a pessoa idosa passa a ser uma viagem ilimitada pelo mundo das letras, das descobertas, do conhecimento. Nessa embarcação encontram-se Marias, Efigênias, Waldete, Zezé, Odete, Percília, Teresinha e outros, que viajam no tempo certo, na certeza de que nunca é tarde para aprender como também de tornar-se protagonista e construir uma nova história.
Assim, enquanto professora de alunas viajantes, trazemos também a esperança, os sonhos e as viagens ilimitadas em nossa alma, de uma construção mútua de conhecimento e, num futuro não distante, hastearemos orgulhosamente a bandeira de viver num país, numa cidade para todas as idades.