Aos amigos, tudo; aos inimigos, a força da lei


Por BADY CURI NETO, EX-JUIZ DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MINAS GERAIS

06/11/2015 às 07h00- Atualizada 06/11/2015 às 09h28

Não se sabe ao certo a origem ou autoria do jargão popular: “aos amigos, tudo; aos inimigos, a força da lei”. A célebre frase parece estar imbuída na vida de alguns políticos e governantes, como se a lei pudesse ser aplicada somente para seus desafetos, e nunca para eles próprios. Por uma pequena digressão, lembramos alguns posicionamentos de políticos que demonstram a triste realidade que coaduna com o adágio citado.

A presidente disse em sua campanha para reeleição: “Nós podemos fazer o diabo na hora da eleição”. Ora, o processo eleitoral é a maior manifestação popular da democracia, em que se conhecem as propostas dos candidatos para que haja uma escolha consciente. O desrespeito às regras eleitorais contamina todo o processo democrático, em um verdadeiro crime lesa-pátria. Talvez em razão de ter feito o diabo para ganhar a eleição, o Tribunal Superior Eleitoral determinou o prosseguimento da ação de impugnação de mandado eletivo para investigar as contas de sua campanha eleitoral.

O ex-presidente Lula, um dos principais articuladores do impeachment de Fernando Collor de Mello, que conclamava a presença maciça da população nas ruas – os caras-pintadas -, agora diz que as manifestações públicas contra Dilma são elitistas e que o impeachment é um golpe da oposição. Não pode haver dois pesos e duas medidas. O processo do impeachment, desde que observados a legislação vigente e os princípios de direito que norteiam a matéria, é um instituto jurídico a que se sujeita qualquer governante. O discurso de que, “para eles”, é para o bem do Brasil e, “para nós”, é golpe é uma falácia.

O instituto da delação premiada tem sido alvo de ataques de vários políticos que têm seus nomes citados em alguma delação na operação “Lava jato”. O que chama a atenção são os argumentos utilizados para atacar o instituto como forma de desmoralizar o ordenamento jurídico. A presidente já manifestou que não respeita delator, e o seu antecessor textualmente disse, em recente discurso: “O cidadão é preso e esse cidadão tem a promessa de ser solto se ele delatar alguém. Aí, ele passa a delatar até a mãe, se for o caso, para poder sair da cadeia. O dado concreto é de que nós estamos vivendo quase um estado de exceção”.

Importa esclarecer que, para obter os benefícios da delação premiada, o réu ou o investigado tem que indicar outros elementos probatórios que comprovem seu depoimento. Lado outro, quando um delator cita opositores, como no caso do Eduardo Cunha, não há crítica, evidenciando a dicotomia de posicionamentos.

Outro exemplo de que se tem notícia pela imprensa é a insatisfação do ex-presidente com o ministro da Justiça, que não tem intercedido na Polícia Federal contra as investigações de pessoas aliadas ao seu Governo, culminando na busca e na apreensão na empresa de seu filho, que, em resposta, sem citar nomes, falou em recente entrevista: “não esperem de mim que eu diga ‘não investiguem A, B C ou D’; um ministro da Justiça não pode conduzir investigações, seja para punir amigos ou inimigos”.

Salvador Allende, socialista, disse: “Não basta que todos sejam iguais perante a lei. É preciso que a lei seja igual perante todos”.

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