Sempre inventamos uma boa justificativa

“Todavia essa capacidade de justificativa serve única e exclusivamente para permanecermos os mesmos. Dela não brota nada que direciona a uma nova tomada de postura. Justificamos tudo para não mudarmos nada”


Por Walber Gonçalves de Souza, professor e escritor

06/10/2019 às 07h00- Atualizada 07/10/2019 às 17h54

Para muitos pesquisadores, nós brasileiros somos merecedores de um profundo estudo. Decifrar a nossa personalidade coletiva é uma missão que beira o impossível, pois, além do famoso “jeitinho brasileiro” que nos é bem peculiar e conhecido por todos, acrescentaria uma outra característica que se enraíza cada vez mais na nossa sociedade, que é a nossa imensa capacidade de inventar sempre uma boa justificativa para tudo.

Todavia essa capacidade de justificativa serve única e exclusivamente para permanecermos os mesmos. Dela não brota nada que direciona a uma nova tomada de postura. Justificamos tudo para não mudarmos nada.

Sempre temos uma justificativa na ponta da língua que acompanha e explica a nossa inércia diante dos diversos aspectos da vida em sociedade. Somos geniais na arte de inventar justificativas e desculpas.

Só que essa “genialidade inventiva” nos cega, não permite que evoluamos nas questões sociais. Justificar por justificar cria uma sensação de que as coisas não precisam encontrar uma outra solução. E assim vamos nos atolando nos nossos velhos dilemas que se perpetuam na nossa sociedade.
Não estudamos e sempre colocamos a culpa no colega que não para de cutucar ou falar; não lemos e dizemos que o livro é caro; colocamos o lixo para coleta em qualquer horário, pois o vizinho assim o faz; não respeitamos a lei, pois ninguém respeita; quero ser sempre o primeiro, pois aprendi que o mundo é dos espertos; e assim, entre milhares de outros exemplos, vamos construindo nossa sociedade.

Por isso é tão comum usarmos os outros para escondermos nossos atos. Quem nunca disse ou ouviu aquela velha máxima: “Como todo mundo faz, eu também faço”?! E assim começamos a justificar nossos erros. E uma vez que você justifica algo, você pode fazer isso de novo e de novo. Torna-se mais fácil. O certo e o errado se confundem.

Claro que tudo é explicável, mas a questão não é essa, nossas justificativas não são usadas para corrigir ou mudar as coisas, muito pelo contrário, são usadas simplesmente para justificar o porquê de não fazermos as coisas, como se isso fosse o ideal. Com a justificativa, mantemos a convicção de que estamos certos, mesmo tendo plena consciência do contrário.

Portanto, se queremos eliminar, acabar com os nossos males sociais, devemos ter a coragem de parar de justificar nossos erros. Nossos defeitos precisam ser encarados e, dentro do possível, eliminados. E tudo é uma questão de hábito.

Enquanto a nossa mentalidade estiver focada na criação de justificativas, perderemos a oportunidade de corrigir nossos erros. Erros estes que nos mantêm na terrível e desumana realidade no qual se encontra o nosso país. Precisamos ter a coragem de combater o bom combate, aquele que se trava consigo mesmo.

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