Ações de Estado

As medidas envolvendo a mobilidade urbana devem ser aperfeiçoadas, mas não rejeitadas plenamente a cada mudança de gestão


Por Tribuna

28/10/2020 às 06h57

Encontrar fontes de financiamento para projetos de mobilidade urbana tem sido um dos nós na discussão de um tema desafiador para as várias instâncias de poder, pois não se esgota na questão técnica. Há um viés cultural que precisa ser inserido na pauta para mudança de atitude dos próprios usuários das vias urbanas. Quando as fontes de financiamento se tornaram mais flexíveis, com prazos que chegavam a oito anos, as ruas brasileiras foram inundadas por automóveis, refletindo um período virtuoso da economia.

O resultado é mostrado na rotina das cidades, especialmente nos horários de pico, sem que houvesse preparação para o incremento dessa demanda. O que era um retrato das metrópoles se espalhou para os demais municípios. O refluxo só ocorreu na pandemia, mas o novo normal já reflete os sinais anteriores, com crescimento das retenções.

Matéria recorrente nos debates envolvendo os candidatos e as candidatas ao comando das prefeituras, a mobilidade continua sendo um tema árido para alguns políticos que apontam soluções, nem sempre factíveis, e ainda incorrem no erro de não apontarem fontes de financiamento para seus projetos, mesmo sabendo que os recursos, tanto das administrações estaduais quanto de Brasília, são precários. Como foi mostrado no debate, ontem, na Rádio CBN Juiz de Fora, há financiamentos para a saúde, para a educação e até mesmo para a segurança pública, mas o transporte passa ao largo. No Congresso há projetos, como a criação de uma nova Cide, mas o tema não avançou.

Por conta disso, são criados vários gargalos, tendo o transporte público como o mais crítico, sobretudo quando a tarifa é a única fonte de financiamento do sistema, em contraste com as gratuidades que respondem por um expressivo volume. Fala-se muito nas permissões para idosos acima de 65 anos, mas vira e mexe são aprovados projetos ampliando as concessões sem que seja indicada a fonte pagadora para tais benesses. Quem paga é o próprio usuário. O pacote de R$ 4 bilhões em discussão em Brasília é apenas um paliativo, incapaz de resolver o problema.

Como apontaram os convidados do debate na Rádio CBN – Eduardo Facio, secretário de Transporte; Ricardo Daibert, especialista em mobilidade, e José Luiz Brito Bastos, também especialista e colaborador da Rádio CBN -, antes de projetos, é preciso saber que tipo de cidade a próxima gestão quer apresentar aos cidadãos, pois há muitos desejos embutidos no cenário coletivo. Feito isso, aí, sim, passa-se para a etapa seguinte, sobretudo quando o transporte, como bem enfatizou Facio, deveria ser uma ação de Estado, e não de governo.

Juiz de Fora é a prova material desse dilema quando se olha para trás: ações iniciadas por uma gestão, como o sistema troncalizado. Sem qualquer tentativa de aperfeiçoamento ou correção, foi simplesmente desmantelado. O preço está aí: o Centro da cidade sistematicamente congestionado por ônibus, comprometendo ainda mais a mobilidade.

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