DE GANDHI A NERO
Quando a Câmara dos Deputados, na votação do pedido de autorização para o impeachment da presidente Dilma Rousseff, produziu um espetáculo degradante, com deputados declarando voto para amigos, parentes, famílias e igrejas, o que se disse, na ocasião, era que no Senado seria diferente. A Casa, formada por personagens com mais vivência no trato político, pois a maioria já teve experiência em governos estaduais, iria levar a questão de forma dura, mas serena, sem o espetáculo do vizinho ao lado. Mas não foi isso que se viu nos últimos dias. Na quinta-feira, os senadores Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Lindbergh Farias (PT-RJ) protagonizaram cenas de puro circo, com troca de ofensas típicas de briga de rua, não condizentes com o cargo que ocupam. Ontem, ambos voltaram ao “ringue” com discursos semelhantes, exigindo intervenção do presidente da sessão, ministro Ricardo Lewandowski.
Diante do tumulto, o presidente do Senado, Renan Calheiros, desceu de sua cadeira, foi para o plenário e fez um discurso de conciliação, advertindo que o país e o mundo estavam olhando o que ora acontecia. Classificou os eventos típicos de hospício e encerrou a fala certo de que tudo seria diferente. Em menos de 30 segundos, porém, de Gandhi conciliador passou a Nero incendiário, quando bateu duro na senadora Gleisi Hoffmann, que, na véspera, afirmou que seus colegas não tinham moral para julgar a presidente Dilma. Renan lembrou-lhe a situação de quase indiciada pela Polícia Federal, num episódio em que seu marido, Paulo Bernardo, acabou preso, enfatizando que foi ele quem evitou tal situação. O clima piorou e a sessão, foi encerrada.
As próximas horas serão definidoras para o impasse, que se arrasta há pelo menos seis meses. O país tem uma presidente afastada e um vice que ainda não tem meios de tomar as providências necessárias, a despeito de alguns passos que tenha ensaiado nesse período. Michel Temer sabe que não dá para ficar jogando para a arquibancada a partir do fim do julgamento e, se for confirmado no cargo com a cassação do mandato da titular, terá que tomar providências duras, sobretudo na economia, a fim de acabar com o ciclo de incertezas que ainda pauta o mercado.