PROVAS E CONVICÇÕES
Quando disse que não tinha provas, mas convicção, o procurador Deltan Dallagnol minimizou os efeitos da denúncia contra o ex-presidente Lula, a quem acusou de chefiar uma quadrilha que assaltou os cofres públicos. Ontem, entremeando ironia e emoção – chegou a chorar em alguns momentos -, o ex-presidente usou todo o seu talento para desqualificar os argumentos do representante do Ministério Público, apresentando-se como vítima de um processo de desconstrução de sua biografia e de desmantelamento do Partido dos Trabalhadores, “como havia ocorrido com o partidão nos anos 1950”. Lula convocou a militância a retornar com o vermelho às ruas para indicar seu apreço pela legenda e avisou que a história não terminou.
É cedo para avaliar as consequências, mas está, de novo, se criando um clima maniqueísta do nós e eles que não beneficia em nada o país. Depois de tantas incertezas, paradoxalmente, não há certeza sobre o que virá pela frente diante desse novo enfrentamento. O ex-presidente, com todo o seu talento, não deixou o embate apenas com o Ministério Público e a Polícia Federal, imputou responsabilidades a todos os que atuaram no processo de cassação da ex-presidente Dilma, especialmente o Senado Federal, que, no seu entendimento, se apequenou. Sobrou até para o tucano Fernando Henrique Cardoso, que o antecedeu na Presidência, dizendo que este sempre o invejou, pois ele, Lula, foi convocado, nos oito anos de seu mandato, para participar do G8, grupo que reúne as maiores economias do planeta. “O sociólogo não conseguiu”, arrancando risos da plateia.
Ironias à parte, o que o presidente tem que fazer, agora, é discutir em profundidade o peso das acusações que contra ele pesam e reconhecer também os equívocos cometidos. Cabe, de fato, ao MP fazer as provas, o que, por enquanto, seriam, segundo Lula, apenas convicções, mas não foi uma denúncia meramente vazia, como se supõe ter acontecido. Há dados importantes nas investigações que precisam ser respondidos, pois só assim será possível estabelecer o lado que tem a verdade. As recentes operações da Polícia Federal e do Ministério Público não foram apenas pirotecnias, como dizem seus críticos, mas fundamentais para desmantelar esquemas de poder que utilizaram do dinheiro público para enriquecimento ilícito de atores públicos e privados, como ficou claro na Operação Lava Jato.