Partidos com dono

Fim das coligações servirá de teste para o próprio Congresso, a quem cabe legislar na busca do aperfeiçoamento da democracia


Por Tribuna

12/10/2019 às 06h44

Todos os partidos têm suas idiossincrasias. Quando a legenda tem dono, a discussão descamba para o lado pessoal, apartada do interesse coletivo. O resultado causa desgastes e, na maioria das vezes, dissidências, ora impedidas somente pela legislação eleitoral, que não permite transferências sem justa causa.

O impasse entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente do PSL, Luciano Bivar, é a face mais emblemática desse processo. O chefe do Governo discorda da metodologia da sigla que o abrigou, enquanto o dirigente partidário, sob pressão, anunciou punições para os parlamentares que discordam de seus métodos.

Ouvido pela Tribuna, o deputado Charlles Evangelista defendeu uma saída consensual. Ele admite que o partido foi importante para o presidente da República, mas lembra, por outro lado, o papel de Bolsonaro em carrear votos para a legenda. Da casa de um dígito, o PSL saltou para uma bancada de 53 deputados, atrás apenas do Partido dos Trabalhadores.

O caciquismo político é uma prática antiga, porém, quando ele se explicita em partidos sazonais, isto é, que só aparecem em períodos eleitorais, se torna um balcão de interesses. Não raro, líderes políticos controlam várias legendas para acolher candidatos de acordo com seus interesses. Antes da mudança da legislação, elas serviam para aumentar o tempo na propaganda política e para elaboração do coeficiente eleitoral. Com o fim das coligações proporcionais, o jogo mudou.

O eleitor não deve se surpreender com o êxodo de candidatos a vereador a partir da abertura da janela de transferência. Os políticos fazem contas e, sem as coligações, sabem que os nanicos terão sérias dificuldades para formar bancadas. Quem perde são os “donos”, que ficam desprovidos de um forte fator de barganha.

O excesso de legendas não contribui em nada para o processo político. Ao contrário, a pulverização cria um cenário de incerteza nos parlamentos, dando margem para articulações nem sempre republicanas. Como o país tem um presidencialismo de coalizão, que se estende para as instâncias estaduais e municipais, os Executivos são submetidos a todo tipo de pressão para levar suas demandas adiante.

O teste das urnas de outubro de 2020 servirá de referência para o próprio Congresso, que ainda deve uma reforma política consistente. Os últimos eventos tiveram forte viés eleitoral, mas deixaram espaço para alterações importantes para consolidação da democracia.

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