Cientistas políticos analisam configuração da nova Câmara de Juiz de Fora
Em quadro de quase 80% dos atuais vereadores reeleitos, falta de representatividade, relação com o Executivo e aumento de cadeiras geram discussões
A Câmara Municipal de Juiz de Fora passará de 19 para 23 vereadores a partir de 2025. Dos atuais, 79% se reelegeram. O percentual de mulheres, pessoas não-brancas e pessoas abaixo de 40 anos se manteve a mesma. Além disso, ainda não há pessoas com deficiência e a única não heterossexual assumida não foi reeleita. No aspecto partidário, as maiores bancadas são dos partidos que disputaram as eleições para a Prefeitura. Nesse cenário, Christiane Jalles de Paula e Diogo Tourino de Sousa, ambos doutores em Ciência Política e professores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), analisam a nova configuração do Legislativo municipal.
Aumento de vereadores deveria ser positivo
O aumento no número de cadeiras é previsto por lei, calculado com base no tamanho da população. O objetivo, em tese, seria aumentar a representatividade da cidade. Diogo esclarece que, embora algumas pessoas possam se assustar e pensar que a medida está gerando mais gastos, não é bem assim, pois pressupõe-se que, dependendo do aumento da população, é algo que se faz necessário para uma maior representatividade.
Enquanto ele destaca a importância de não confundir esse aspecto com críticas ao trabalho dos parlamentares, Christiane lembra de outra lei, aprovada em 2021, que ainda restringe essa pluralidade: “Essa legislação limitou o número de candidaturas que cada partido poderia lançar, e esta foi a primeira eleição em que isso aconteceu. Então, a tendência é que a taxa de renovação caia ainda mais no futuro, porque os partidos vão apostar naqueles candidatos que já mostram alguma viabilidade na competição”.
Legislativo distante da população
Ela explica que o principal aspecto reforçado pela literatura atualmente para a dificuldade das candidaturas de minorias é o financiamento. As que têm menos recursos já estariam em desvantagem competitiva desde o início, por serem menos visíveis e conhecidas pelo eleitorado. A professora destaca duas consequências disso: “A primeira é um Legislativo distante de como está distribuída a população da cidade. E a segunda é a invisibilidade das demandas dessas minorias, pela ausência de um representante que compartilha as mesmas experiências e que leve para dentro do Legislativo os problemas delas”.
Diogo ressalta que, pelo menos do ponto de vista da presença no poder Legislativo, o caso de Juiz de Fora não é uma excepcionalidade, embora seja, sim, um dado preocupante: “Se a gente olha a Câmara Federal, a gente vai ver que a maioria lá são homens brancos, profissionais liberais e empresários, sendo que isso não é a maioria da população brasileira”.
Por outro lado, em anos recentes, lembra o professor, “a gente tem iniciativas do ponto de vista legal, de cotas não só de preenchimento das chapas, mas também de distribuição de recurso que tem melhorado o cenário”. “Se a gente pegar as candidaturas que se registraram nesta eleição, o retrato socioeconômico está muito diverso comparado a duas, três eleições atrás, mas ainda está muito aquém dessas candidaturas conseguirem efetivo sucesso”.
Índice de reeleição também não é excepcional
Segundo Diogo, o baixo índice de renovação, curiosamente, é uma praxe nas eleições para os poderes Legislativos nacionalmente, seguindo uma média de, no máximo, um terço, em situações excepcionais.
“O comum é a recondução, e há vários fatores para isso. Talvez a existência de muitos candidatos, a pulverização de candidaturas. A presença no Legislativo, a atuação permite que a memória do eleitor inevitavelmente se lembre desses nomes que já estão. E também tem a possibilidade do uso do poder para chegar nas pessoas”, detalha.
Neste ponto também é feita a ressalva de que o dado não é patológico: “Muitas vezes a gente fala da renovação como se a ideia trouxesse, em si, algumas virtudes, e não é bem assim. Renovação pode ser ruim também”.
Relação da Câmara com o Executivo
O PT, da prefeita reeleita, terá quatro vereadores. Já o PL, do segundo colocado na disputa ao Executivo, terá três, assim como o PSB, do vice-prefeito eleito (com um deles já tendo declarado neutralidade). Essas serão as maiores bancadas da nova Câmara.
“Sobre a relação Executivo-Legislativo, eu acho que isso dependerá muito das coligações e dos acordos firmados pela nova composição da Casa Legislativa. Acho que a tendência é o Executivo municipal conseguir aprovar suas pautas, embora enfrente uma oposição talvez um pouco mais organizada e liderada pelo PL”, analisa Christiane.
“Existe um retrato que sai das urnas”, complementa Diogo, “mas isso não quer dizer que, do ponto de vista da construção do trabalho Legislativo e das composições, a partir de agora, esse retrato vai permanecer estanque. Ou seja, o Executivo municipal tem muita margem de manobra para começar a pensar na composição do governo e consequente governabilidade”.