Cientistas políticos analisam configuração da nova Câmara de Juiz de Fora

Em quadro de quase 80% dos atuais vereadores reeleitos, falta de representatividade, relação com o Executivo e aumento de cadeiras geram discussões


Por Hugo Netto

08/10/2024 às 16h16

eleicoes 2024A Câmara Municipal de Juiz de Fora passará de 19 para 23 vereadores a partir de 2025. Dos atuais, 79% se reelegeram. O percentual de mulheres, pessoas não-brancas e pessoas abaixo de 40 anos se manteve a mesma. Além disso, ainda não há pessoas com deficiência e a única não heterossexual assumida não foi reeleita. No aspecto partidário, as maiores bancadas são dos partidos que disputaram as eleições para a Prefeitura. Nesse cenário, Christiane Jalles de Paula e Diogo Tourino de Sousa, ambos doutores em Ciência Política e professores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), analisam a nova configuração do Legislativo municipal.

Christiane Jalles Arquivo pessoal
Christiane Jalles de Paula (Foto: Arquivo Pessoal)

Aumento de vereadores deveria ser positivo

O aumento no número de cadeiras é previsto por lei, calculado com base no tamanho da população. O objetivo, em tese, seria aumentar a representatividade da cidade. Diogo esclarece que, embora algumas pessoas possam se assustar e pensar que a medida está gerando mais gastos, não é bem assim, pois pressupõe-se que, dependendo do aumento da população, é algo que se faz necessário para uma maior representatividade.

Enquanto ele destaca a importância de não confundir esse aspecto com críticas ao trabalho dos parlamentares, Christiane lembra de outra lei, aprovada em 2021, que ainda restringe essa pluralidade: “Essa legislação limitou o número de candidaturas que cada partido poderia lançar, e esta foi a primeira eleição em que isso aconteceu. Então, a tendência é que a taxa de renovação caia ainda mais no futuro, porque os partidos vão apostar naqueles candidatos que já mostram alguma viabilidade na competição”. 

Diogo Tourino Arquivo Pedro
Diogo Tourino de Sousa (Foto: Arquivo Pessoal)

Legislativo distante da população

Ela explica que o principal aspecto reforçado pela literatura atualmente para a dificuldade das candidaturas de minorias é o financiamento. As que têm menos recursos já estariam em desvantagem competitiva desde o início, por serem menos visíveis e conhecidas pelo eleitorado. A professora destaca duas consequências disso: “A primeira é um Legislativo distante de como está distribuída a população da cidade. E a segunda é a invisibilidade das demandas dessas minorias, pela ausência de um representante que compartilha as mesmas experiências e que leve para dentro do Legislativo os problemas delas”.

Diogo ressalta que, pelo menos do ponto de vista da presença no poder Legislativo, o caso de Juiz de Fora não é uma excepcionalidade, embora seja, sim, um dado preocupante: “Se a gente olha a Câmara Federal, a gente vai ver que a maioria lá são homens brancos, profissionais liberais e empresários, sendo que isso não é a maioria da população brasileira”. 

Por outro lado, em anos recentes, lembra o professor, “a gente tem iniciativas do ponto de vista legal, de cotas não só de preenchimento das chapas, mas também de distribuição de recurso que tem melhorado o cenário”. “Se a gente pegar as candidaturas que se registraram nesta eleição, o retrato socioeconômico está muito diverso comparado a duas, três eleições atrás, mas ainda está muito aquém dessas candidaturas conseguirem efetivo sucesso”.

Índice de reeleição também não é excepcional

Segundo Diogo, o baixo índice de renovação, curiosamente, é uma praxe nas eleições para os poderes Legislativos nacionalmente, seguindo uma média de, no máximo, um terço, em situações excepcionais. 

“O comum é a recondução, e há vários fatores para isso. Talvez a existência de muitos candidatos, a pulverização de candidaturas. A presença no Legislativo, a atuação permite que a memória do eleitor inevitavelmente se lembre desses nomes que já estão. E também tem a possibilidade do uso do poder para chegar nas pessoas”, detalha. 

Neste ponto também é feita a ressalva de que o dado não é patológico: “Muitas vezes a gente fala da renovação como se a ideia trouxesse, em si, algumas virtudes, e não é bem assim. Renovação pode ser ruim também”.

Relação da Câmara com o Executivo

O PT, da prefeita reeleita, terá quatro vereadores. Já o PL, do segundo colocado na disputa ao Executivo, terá três, assim como o PSB, do vice-prefeito eleito (com um deles já tendo declarado neutralidade). Essas serão as maiores bancadas da nova Câmara.

“Sobre a relação Executivo-Legislativo, eu acho que isso dependerá muito das coligações e dos acordos firmados pela nova composição da Casa Legislativa. Acho que a tendência é o Executivo municipal conseguir aprovar suas pautas, embora enfrente uma oposição talvez um pouco mais organizada e liderada pelo PL”, analisa Christiane.

“Existe um retrato que sai das urnas”, complementa Diogo, “mas isso não quer dizer que, do ponto de vista da construção do trabalho Legislativo e das composições, a partir de agora, esse retrato vai permanecer estanque. Ou seja, o Executivo municipal tem muita margem de manobra para começar a pensar na composição do governo e consequente governabilidade”.

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