MPF ajuiza ação contra Duque por improbidade administrativa
Atualizada às 20h55
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra o ex-reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Henrique Duque por suspeitas de cometer atos de improbidade administrativa durante sua passagem pela Reitoria entre 2006 e 2014, período em que exerceu dois mandatos. A acusação que pesa contra Duque diz respeito à suposta transferência de recursos públicos da universidade para a Fundação de Apoio e Desenvolvimento ao Ensino, Pesquisa e Extensão (Fadepe). O entendimento do MPF é de que, apesar de ligada à UFJF, a entidade é privada, não estando, portanto, sujeita ao regime jurídico que rege a Administração Pública. Os atos ilegais consistiriam em pagamento ilícito de taxa de administração à Fadepe; recolhimento de preços públicos a contas bancárias da fundação; e transferência da gestão de espaço público à entidade.
Procurado pela Tribuna, o ex-reitor e sua defesa afirmaram que ainda não tinham sido notificados oficialmente sobre a ação e que só devem se manifestar detalhadamente sobre o caso após terem acesso ao processo. O advogado Lucas Sampaio, no entanto, declarou que os fatos alegados pelo MPF dizem respeito a atos que antecedem a gestão de Henrique Duque, tendo sido, segundo o advogado, aprovados pelo Conselho Superior. Lucas Sampaio ainda classificou como precipitada a posição do MPF por emitir “posição parcial” por meio de material direcionado à imprensa. No sistema do Tribunal Regional da 1ª Região, a primeira movimentação do processo é datada do dia 1º de junho. A ação corre na 2ª Vara Federal de Juiz de Fora e esta sob a responsabilidade da juíza Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho. Em caso de condenação, Henrique Duque estará sujeito a sanções como perda da função ou cargo público, pagamento de multa, suspensão dos direitos políticos, ressarcimento ao erário e proibição de contratar com o Poder Público e de receber incentivos fiscais ou creditícios de instituições públicas.
De acordo com nota publicada pelo MPF, as transferências tinham por objetivo obter excedente de recursos que, na prática, “funcionavam como uma espécie de ‘caixa dois’, de forma que pudessem ser geridos como bens privados, sem sujeição às normas que obrigam a Administração Pública, por exemplo, prévia realização de processos licitatórios formais.” A promotoria reforça que, embora amplamente disseminada entre as instituições superiores com relação às suas fundações, tal prática é totalmente ilegal. Para embasar o entendimento, a ação cita jurisprudência firmada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) que aponta que a finalidade das fundações de apoio – como a Fadepe – é estritamente a de “dar suporte a projetos de pesquisa, ensino e extensão e de desenvolvimento institucional, científico e tecnológico de interesse das instituições apoiadas e, primordialmente, ao desenvolvimento da inovação e da pesquisa científica e tecnológica”.
Condenação em 2015
Este não é o primeiro questionamento jurídico ao qual foi submetido o ex-reitor Henrique Duque por conta de sua atuação à frente da Reitoria da UFJF entre 2006 e 2014. Em dezembro de 2015, Duque foi condenado pela Justiça Federal a prisão por um período de dois anos e um mês. Como é inferior a quatro anos, a prática acabou convertida em prestação de serviços à comunidade e pagamento de prestação pecuniária correspondente a R$ 7 mil. O ex-reitor e sua defesa informaram à reportagem que recorreram da decisão.
Tal condenação em questão diz respeito a ação apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) que acusa Duque de não atender a requisições para esclarecimento de fatos investigados em inquéritos civis públicos instaurados pela Procuradoria da República em Juiz de Fora. Um dos inquéritos apura aparentes ilegalidades na transferência de recursos públicos da universidade para a Fadepe, mesma fundação que motivou novo questionamento judicial ao ex-reitor.
Fundações seriam utilizadas como ‘laranjas’
Ainda com base em acórdão do TCU, o MPF defende que as fundações de apoio universitário não podem ser utilizadas em atividades que envolvam atividades administrativas de rotina, como conservação, limpeza, secretariado e serviços administrativos. “Mas o que acabou ocorrendo ao longo dos anos foi o seu uso como ‘laranjas’, ou seja, como instituições interpostas em contratações para a prestação de serviços, obras ou fornecimento de bens às universidades e como intermediária na contratação de mão de obra”. Desta forma, a promotoria entende que “o desvio de recursos públicos pela UFJF, em proveito da Fadepe, seguido do seu emprego na aquisição de bens e serviços como se privados fossem, resultou em burla ao dever de licitar, ausência de transparência na contratação de fornecedores para a Administração Pública e omissão da exigência de prova de qualificação indispensável à garantia do cumprimento das obrigações”.
O MPF ainda aponta que pagamentos a título de taxa de administração foram feitos pela Reitoria da UFJF, em percentual elevado e linear, no âmbito de convênios nos quais seria cabível o ressarcimento de despesas administrativas suportadas pela Fadepe, desde que efetivamente demonstradas. Para a promotoria, tal pagamento é proibido, “porque convênios e contratos de repasse não se destinam a proporcionar enriquecimento à entidade convenente, mas tão somente a fornecer os meios necessários à execução de programas, projetos e atividades de interesse recíproco. O único pagamento possível diz respeito ao ressarcimento de despesas administrativas expressamente autorizadas e demonstradas, e, assim mesmo, até o máximo de 15% do valor pactuado.” Ainda segundo o Ministério Público, apesar da vedação e de advertências feitas pelo (TCU), Duque, durante toda a sua gestão, “obstinadamente seguiu celebrando convênios com a Fadepe, de forma a estipular o pagamento a essa entidade do percentual linear de 15% dos valores pactuados”.
Desrespeito a princípio de caixa único
O MPF considera de maior gravidade o fato de, durante a gestão de Henrique Duque, ocorrer a incidência de transferência ou depósito de preços públicos nas contas bancárias da Fadepe, mesmo quando a fundação não tinha qualquer participação na prestação dos serviços que resultavam na cobrança das tarifas. “Ao assumir a reitoria, em 2007, Henrique Duque Filho foi pessoal e diretamente cientificado de acórdão do TCU que advertia sobre a necessidade de observância do princípio da unidade de caixa. Em 2009, o tribunal novamente intimou o ex-reitor”, afirma o Ministério Publico Federal. “Além de ignorar as determinações do TCU quanto à observância do princípio da unidade de caixa, (Duque) acabou incorrendo em uma prática ainda mais grave, que foi o recolhimento de preços públicos nas contas bancárias da Fadepe, consistente, por exemplo, na transferência ou depósito para essas contas do numerário obtido por meio da cobrança de taxas para o registro de diplomas expedidos por outras instituições de Ensino Superior”, acrescenta a promotoria.
“A especial gravidade de tal expediente estava em que a destinação de tais recursos à fundação de apoio jamais se baseou em convênio que previsse, ainda que de forma espúria, o envolvimento da Fadepe naquela atividade de rotina administrativa da UFJF e a sua remuneração pelos serviços que acaso prestasse”, afirma o MPF. Para o órgão, não cabia à Fadepe a execução de qualquer serviço relacionado ao registro de diplomas, atividade inteiramente executada pela própria autarquia. “Tratava-se, pura e simplesmente, portanto, de desvio de recursos públicos em proveito daquela fundação, mediante a ‘fragmentação para criação de caixas especiais'”, acrescenta a ação. O MPF ainda aponta que a gestão de Henrique Duque teria cedido à Fadepe a gestão de determinados espaços públicos pertencentes à UFJF. Tal outorga teria ocorrido de forma indevida com objetivo de proporcionar superavit à fundação por meio da cessão da exploração do bem a terceiros.