ENTREVISTA/Fab Melo, jogador da NBA
Dizem que o Brasil é o país do futebol. De fato, na maioria dos casos, o primeiro presente de qualquer garoto é uma bola, assim como a primeira reação é chutar o brinquedo de lado. Vai ser jogador de futebol, é o discurso recorrente dos pais mais babões. O sonho entra em parafuso quando o moleque dá aquela espichada e passa dos dois metros já na adolescência. Esse menino tem que jogar basquete, dizem os mais espirituosos. Tal alegoria fictícia inspirada na realidade bem poderia ser a história que Fab Melo contaria lá do alto de seu 2,13m. Juiz-forano e torcedor do Flamengo, o pivô de 22 anos já considerou os questionamentos da banda Skank e sonhou em ser um jogador de futebol. Mas acabou trocando os pés pelas mãos e, desde o ano passado, é jogador do Boston Celtics, franquia com mais títulos na história da liga norte-americana de basquete, com 17 conquistas da NBA.
De volta ao Celtics após passagem pelo Maine Red Claws, que disputa a D-League, Melo conversou com a Tribuna em sua última passagem por Juiz de Fora. À época, visitou velhos amigos do projeto Basquetebol do Futuro (PBF/Olímpico) e bateu bola com a garotada das equipes sub-17 do PBF e do América de Três Rios. De bandeja, desfilou simpatia e humildade e enterrou qualquer possibilidade de estrelismo. Pelo brilho nos olhos dos aspirantes a atletas presentes no local, não é errado parafrasear a música famosa e perguntar: quem não sonhou em ser um jogador de ‘basquetebol’?
Tribuna – Após uma ascensão que pode ser considerada meteórica, quais são seus objetivos para as próximas temporadas?
Fab Melo – Meu próximo objetivo é conseguir me estabelecer no time. Ganhar meu espaço e começar a jogar mais. Eu sabia que ia atuar muito pouco na última temporada. Meus técnicos também já sabiam. Eles me escolheram como projeto para o futuro. Como o Boston está ficando uma equipe envelhecida, mais veterana, vou brigar para conseguir cavar meu espaço nos próximos anos. Meu sonho é ficar e fazer meu nome no clube.
– No final do ano passado, jogando pelo Maine, você conseguiu a incrível marca de 14 tocos em uma única partida, contra o Erie Bayhawks. Qual foi a repercussão dessa partida nos Estado Unidos?
– O toco é uma característica pessoal. Bati o recorde da minha universidade há dois anos, com dez tocos (atuou pela Universidade de Syracuse, antes de ser escolhido pelo Boston no draft, no ano passado). Depois, veio o recorde da D-League. Foram 14 tocos. Na verdade, fiz um triple-double, com 14 tocos, 15 pontos e 16 rebotes. Foi uma repercussão grande. Esses números não são todos que conseguem alcançar. Foi muito legal.
– E como foi a experiência no Maine?
– No nosso time (Celtics), havia muitos jogadores experientes na minha posição. Nosso técnico sabia que eu não teria oportunidade de evoluir e de jogar. Por isso, me liberaram para o time do Maine, da D-league. Só de ter mais essa oportunidade foi muito importante para minha carreira.
– Para os brasileiros que ainda não o conhecem, como você definiria suas características de jogo?
– A minha característica é a defesa. Por isso fui draftado. No basquete universitário, ganhei como defensor do ano na minha conferência. Dou toco. Pego rebote. A defesa é minha característica.
– Você disse que não é bom de bola, mas dá para enganar lá nos Estados Unidos? Qual sua relação com o futebol?
– Sou flamenguista roxo. No meu time tem o Kevin Garnett, que gosta muito de futebol, gosta do Chelsea. Tem o Leandrinho também, que é corintiano. Então, sempre tem essa brincadeira. Como os americanos não são muito acostumados a jogar, eles acham que eu sou bom de bola. Deixa eles acreditarem.
– Tirando o futebol, sente falta de mais alguma coisa no Brasil?
– Da família, é claro. Mas, no geral, já estou acostumado com a cultura americana e com o frio. Mas o que sempre sinto muita falta é da comida. A comida americana tem um tempero diferente. No começo era difícil. Não tem o mesmo sabor que estamos acostumados no Brasil. Senti muita falta da comida da mamãe.
Sabatinado pela molecada
Apesar de figurar entre os maiores nomes do basquete mundial, o jogador da NBA tem a fala mansa no trato com a imprensa. Tímido na frente de câmeras, gravadores e microfones, só ficou à vontade quando as entrevistas cessaram. Fez pose para fotos. Várias enterradas. Encerrado o protocolo, sentou-se em roda com os jovens atletas do PBF/Olímpico e do América de Três Rios. E quando as perguntas diretas dos repórteres saíram de cena, surgiram as respostas mais espontâneas. Bem-humorado, o pivô respondeu às perguntas da garotada e arrancou risos com algumas pérolas.
Questionado se já tinha domínio da língua inglesa quando partiu de mala, cuia e bola de basquete para os Estados Unidos, desdenhou. Que nada! Só falava ‘yes’ e ‘no’. Perguntavam o meu nome, respondia ‘yes’. Minha idade? ‘No’. Vivi na base do ‘sim’ e ‘não’ por muito tempo, disparou aos risos. Porém, o momento em que as gargalhadas se tornaram mais efusivas foi quando foi perguntado se já havia encontrado o maior ídolo do basquete mundial, Michael Jordan. Conheci. Na hora fiquei com uma cara de bobo, igual você olhando para mim. Mas ele era o Jordan, pô. Eu sou só o Fabrício, que jogou no PBF. Precisa disso não, brincou, quebrando qualquer possibilidade de distanciamento.