Comércio tem vendas aquecidas às vésperas de retorno para onda vermelha

Expectativa de setor é que vendas para Natal sejam as melhores de 2020; o otimismo, entretanto, não se aplica ao comparar com mesmo período do ano passado, devido aos efeitos da pandemia da Covid-19


Por Leticya Bernadete

24/12/2020 às 10h27

As vendas para o Natal devem ser as melhores de 2020, acompanhando o movimento histórico da data, entretanto, a expectativa do comércio local é baixa quando a comparação é com os anos anteriores. A pandemia da Covid-19 trouxe mudanças no comportamento dos consumidores, em que grande parte ainda evita ir às compras em lojas físicas ou opta por adquirir produtos de maneira on-line. As incertezas quanto ao funcionamento dos estabelecimentos também acabaram afetando a avaliação dos próprios empresários. A partir desta sexta (25), Juiz de Fora irá retornar à onda vermelha, classe mais restritiva do programa Minas Consciente de combate à pandemia. Representantes locais dos setores econômicos temem por outras consequências, não apenas financeiras, mas relacionadas ao comportamento da população com as festas de final de ano, que podem agravar ainda mais a situação da pandemia na cidade.

De acordo com o presidente do Sindicato do Comércio de Juiz de Fora (Sindicomércio-JF), Emerson Beloti, o Natal é a data mais importante para o comércio e, neste ano, devido à pandemia, o setor vem tomando precauções para melhor atender os clientes e trazer mais seguranças contra a Covid-19, impondo regras que vão desde a obrigatoriedade do uso de máscara ao limite de pessoas no interior dos estabelecimentos. “Vai ser melhor que o ano passado? Dificilmente. Mas vai ser melhor que o mês passado”, exemplifica. “A data é muito importante para alguns segmentos, como eletroeletrônicos, eletrodomésticos, vestuários, brinquedos e casas de chocolate, mas todo o comércio precisa do Natal.”

Um ponto que deve impactar as vendas em 2020 é a ausência de confraternizações entre amigos e colegas de empresa, que costumam contar com a tradição do ‘amigo oculto’, diminuindo, assim, a busca por presentes, de acordo com o presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL/JF), Marcos Casarin. “As pessoas estão se resguardando e é necessário que façam isso. A nossa esperança é que [as vendas] se mantenham, pelo menos, e que não caiam”, aponta.

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Ruas do Centro estavam cheias nesta quarta-feira, dois dias antes de a cidade retornar à onda vermelha, a mais restritiva do programa estadual (Foto: Fernando Priamo)

Segmento preocupa-se com regressão

Após decisão tomada em reunião emergencial do Comitê Municipal de Enfrentamento e Prevenção à Covid-19 nesta terça-feira (22), Juiz de Fora retorna à onda vermelha do Minas Consciente. A medida foi adotada por conta do grave cenário epidemiológico enfrentado pela cidade. De acordo com o programa estadual, os municípios classificados na onda vermelha têm as maiores restrições, sendo permitido apenas o funcionamento de serviços essenciais como supermercados, padarias, farmácias e bancos. Nesta faixa, bares e restaurantes poderão atuar apenas nos modelos de delivery e retirada. Os detalhes com as regras locais deverão ser divulgados nesta quinta-feira (24) pela PJF, através de decreto em Atos do Governo.

O presidente do Sindicomércio-JF, Emerson Beloti, lamentou a decisão, que deve impactar o segmento na cidade. Na sua opinião, para além do funcionamento dos estabelecimentos comerciais, há fatores que agravam mais significativamente o cenário epidemiológico. “Ônibus lotados, aglomerações em alguns lugares, confraternização, festas”, exemplifica. “O assunto é sério, e a situação está difícil. Os hospitais já estão saturados, e nós entendemos tudo isso. Mas não basta só o comércio fazer a parte dele.”

De acordo com Emerson, o segmento já vem tomando medidas para maior segurança, além de trabalhar em campanhas de conscientização, que seria o ponto a ser desenvolvido neste momento. “O problema é muito mais de conscientização do que de fechamento. No nosso entender, se não houver conscientização, pode fechar tudo, mas não adianta. A sociedade tem que ficar atenta e se conscientizar de que é uma doença seríssima”, afirma. “Ficamos muito temerosos porque muitas empresas fecharam durante esse ano. E ficar 14 dias fechados novamente, para uma empresa, não é fácil. Principalmente porque tem empresas que estão tentando pagar seus compromissos.”

‘Feriadão’

Como destacado pelo representante do Sindicomércio-JF e também pelo presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL/JF), Marcos Casarin, o fechamento do comércio a partir do dia 25 pode trazer duas consequências: mais pessoas nas ruas na véspera do retorno à onda vermelha, por conta de uma corrida antes da interrupção do funcionamento dos estabelecimentos; e maior número de pessoas viajando para as festas do final de ano, por conta do período maior em que não irão trabalhar. Nesta quarta-feira (23), já foi possível observar grande movimento nas ruas centrais de Juiz de Fora.

“Teremos festas em casa, reuniões em casa, churrascos em casa. Quem vai fiscalizar isso? Será que as pessoas vão entender o momento que estamos vivendo?”, questiona Casarin. “Está contribuindo para que as pessoas viagem também. Podem interpretar como um grande ‘feriadão’, e o retorno será muito mais preocupante.”

De acordo com o representante da CDL, a reta final do ano costuma levar a um movimento maior no comércio. O horário estendido pode dar outras possibilidades para os consumidores que trabalham durante o dia, bem como contribuir para evitar aglomerações, de acordo com a categoria. Nesta quarta (24), os estabelecimentos podem funcionar até às 18h. Entretanto, o retorno à onda vermelha iria na contramão desta proposta. “As pessoas que poderiam fazer suas compras com mais calma terão que apressar tudo, porque depois ficará fechado. Isso pode trazer uma aglomeração muito maior. Estamos na hora de estender, não diminuir o tempo. É mais fácil uma conscientização do que propriamente a restrição”, reforça.

Empresários estão mais pessimistas este ano

Na avaliação do economista chefe da Federação do Comércio de Minas Gerais (Fecomércio-MG), Guilherme Almeida, é possível trazer perspectivas sobre as vendas comerciais neste final do ano. “Em relação ao ano passado, esperamos uma queda justamente por conta da pandemia: do isolamento social, da conjuntura adversa, do desemprego alto. Agora se compararmos com o período da pandemia, de março até novembro, esperamos um aumento por conta da sazonalidade que a data já exerce. É uma data muito importante para o calendário varejista”, explica.

Segundo levantamento da Fecomércio-MG, o Natal impacta positivamente 78,8% das empresas do comércio varejista em Minas Gerais. Entretanto, em 2020, a expectativa dos lojistas varia. De acordo com a pesquisa, 35,2% dos empresários acreditam que as vendas serão piores que no ano passado. Já os otimistas são apenas 29,5%, 24 pontos percentuais a menos do que havia sido observado em 2019, quando 53,7% acreditavam que iriam vender mais no período do Natal.

Pelo lado pessimista, os próprios efeitos da pandemia justificam a percepção dos empresários, de acordo com Almeida. Um exemplo é o fim do pagamento do auxílio emergencial pelo Governo federal. “O auxílio emergencial vem garantindo uma recuperação mais forte do varejo. Com o fim desse auxílio, existe a incerteza da continuidade dessa recuperação”, explica.

Já para os otimistas, há um aumento na confiança dos empresários. Outra pesquisa da Fecomércio mostrou que, no início de dezembro, o Índice de Confiança do Empresário do Comércio (Icec) atingiu 102 pontos, sendo o maior registrado no segundo semestre deste ano. “Nós tivemos o início de um processo de flexibilização das atividades econômicas. Quando falamos em confiança do empresário, isso acaba levando a essa perspectiva mais positiva”, explica o economista chefe.

Incertezas afetam contratação temporária

Até alguns meses atrás, a expectativa do Sindicomércio era de que o setor comercial abrisse 700 vagas temporárias para as vendas de final de ano. Entretanto, esse número não deve ter sido atingido, não apenas pela crise agravada pela pandemia, mas pela incerteza dos empresários quanto ao funcionamento dos estabelecimentos. “As empresas estão receosas porque quem define se o comércio abre ou fecha é o Poder Público, com seu comitê de saúde. Então o empresário fica temeroso porque se ele contrata e fecha a loja, vai ter uma despesa a mais e com loja fechada”, explica o presidente do Sindicomércio-JF, Belotti.

Já a CDL ressalta que, durante este ano, o comércio em Juiz de Fora demitiu mais de quatro mil funcionários por conta do fechamento de lojas, o que demonstra um movimento contrário ao que costuma ser esperado pelo setor, segundo Casarin. “Emprego temporário sempre é em torno de mil e 1.200 vagas. Esse ano, não teve nenhuma, lamentavelmente.”

Outros fatores que podem ter impactado na contratação temporária são as medidas de segurança para conter a pandemia da Covid-19, como evitar aglomerações nos estabelecimentos comerciais. Foi o que ocorreu com a empresária Silvana Souza, proprietária de quatro lojas de roupas em Juiz de Fora: Drop’s, Outlet Dps, Drop’s Spazio e Moda Express. “Nessa época, nós sempre contratamos gente extra. Esse ano, não contratamos porque já sabíamos que não iria precisar, porque não poderia criar aglomeração dentro das lojas”, conta.

Consumidores receosos

Ao passo que as oscilações sobre o funcionamento ou não do comércio afetaram as ações dos empresários, os consumidores também têm se mostrado mais receosos quanto às compras, como foi observado por Silvana. Em 3 de dezembro, o Comitê Municipal de Enfrentamento e Prevenção à Covid-19 havia deliberado pela regressão de Juiz de Fora à onda vermelha do programa Minas Consciente. Um dia depois, o colegiado voltou atrás em sua decisão e optou pela manutenção da onda amarela do regramento. Novamente, nesta semana, ficou decidido que a cidade irá regredir à onda vermelha. “As vendas estão bem atípicas. Em novembro, as vendas começaram a aquecer, mas aí vieram com a notícia do fechamento do comércio, dos hospitais estarem lotados. Acho que isso assustou o consumidor porque foi um marco. Foi nessa confusão que as vendas deram uma despencada”, exemplifica.

Como a expectativa é que as pessoas passem as festas de finais de ano apenas com os familiares mais próximos, Silvana sentiu uma queda significativa na procura por presentes. “Nós vendíamos muitos presentes, principalmente nas lojas que eu tenho preço melhor, mas senti essa queda”, diz. “O percentual deve ser de uns 20% do que eu vendi no ano passado. As pessoas estão comprando, mas com medo, acho que estão mais comedidas”.

O comportamento diferenciado dos clientes também foi observado pela empresária Marci Gotelip Silveira, proprietária da loja de moda íntima Cores & Tendências, localizada na Rua São Mateus. “Acho que essa incerteza de fechar ou não fechar prejudica muito, enquanto as pessoas não estiverem seguras para sair às ruas e poder gastar o seu dinheiro do jeito que realmente querem”, diz. “Eu digo por mim: eu deixei de comprar várias coisas para evitar de ir aos lugares. O que eu pude esperar, eu esperei, e acredito que as pessoas também têm esse mesmo pensamento.”

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Em suas lojas, Silvana Souza (à direita) redobrou os cuidados necessários em época de pandemia e incentiva clientes a usarem os canais digitais (Foto: Fernando Priamo)

Lojas adotam novas formas de venda

De acordo com Marci, o movimento nas ruas está baixo, mas, em contrapartida, há uma grande busca por meios alternativos de compras. No caso da Cores & Tendências, a proprietária está trabalhando em um catálogo virtual para atender esta demanda. “Em relação aos outros anos, as vendas estão um pouco aquém”, diz. “As pessoas estão procurando outros meios de compra.”

Na avaliação da empresária, o ideal é que os clientes busquem as lojas de seus bairros, inclusive no caso das compras on-line. “Mesmo para compras virtuais, a entrega tem que ser feita, então quanto menos se deslocar para essa entrega, melhor para todo mundo. É importante que as pessoas procurem as lojas perto de onde moram”. Apesar do baixo movimento, o estabelecimento tomou medidas para a segurança das clientes, como instalar uma barreira na porta para evitar que muitas pessoas entrem ao mesmo tempo, causando aglomerações. “Alguns atendimentos são feitos até ali mesmo, sem a pessoa entrar na loja. Em outros casos, para não aglomerar, nós pedimos que entre uma de cada vez”, conta Marci.

Em suas lojas, a empresária Silvana Souza também tem apostado nos meios on-line, estimulando os clientes a utilizarem os canais virtuais por meio de promoções, como frete grátis. “Temos incentivado muito esse tipo de consumo nas nossas redes sociais e, ao mesmo tempo, preparando toda a nossa equipe e a loja para receber o consumidor com a maior segurança, fazendo toda a higienização. Temos tomado essas medidas para fazer a nossa parte também de não propagar mais a contaminação.”

Acordo pode evitar novas demissões

Desde o dia 8 de dezembro, bares e restaurantes estão proibidos de vender bebidas alcoólicas para consumo interno, mesmo com o funcionamento dos espaços, até então, liberados. A categoria tem realizado manifestações para reverter a situação, que estaria afetando o atendimento. Com a regressão à onda vermelha, a expectativa é que esses estabelecimentos passem a atuar apenas nos modelos de delivery e retirada no balcão.

Integrante do Comitê Municipal de Enfrentamento à Covid-19 e coordenador-executivo do Sindicato de Hotéis, Restaurantes e Bares de Juiz de Fora, Rogério Barros explica que a categoria não contesta a decisão de regressão à onda vermelha, tendo em vista a situação preocupante da pandemia na cidade. Entretanto, o setor deve sofrer novas consequências. “Existe uma previsão de que muitos bares e restaurantes talvez fechem no início do ano porque não vão conseguir se manter “, afirma. “Estamos mostrando a realidade do setor e a repercussão que vai acontecer em razão disso. Essa situação (epidemiológica) ocorreu por vários fatores: eleição, transporte público, aglomeração de filas nos bancos. Infelizmente, vai ser a ‘pá de cal’ no setor de bares e restaurantes.”

Conforme Rogério, o sindicato patronal está buscando formas para lidar com o período da onda vermelha, como negociações entre a representação dos trabalhadores. “Estamos tentando ver se conseguimos, junto ao sindicato dos empregados, fazer um acordo coletivo pedindo suspensão do contrato por 15 dias, uma antecipação de férias, porque a categoria está descapitalizada e vai ficar 15 dias praticamente parada”, informa. “O serviço de delivery chega, no máximo, 20% do faturamento da empresa. Isso não paga nada, não consegue pagar aluguel, não consegue pagar folha de pagamento”, diz.

Como destacado pelo secretário-geral do Sindicato dos Empregados no Comércio Hoteleiro e Similares, Turismo e Lavanderias de Juiz de Fora e Região (Sindecohtul), Márcio Tavares, desde o início da pandemia, a categoria tem dialogado com a representação patronal para evitar maiores consequências para a classe. Assim, o mesmo deve ocorrer com a regressão para a onda vermelha. “A nossa preocupação é que as pessoas não percam o emprego em uma época como essa. Tudo aquilo que for possível fazer dentro do que a lei permite, com certeza o sindicato vai estar à disposição das empresas e do sindicato patronal, para pensarmos e conversarmos sobre a melhor forma de mantermos os postos de trabalho”, diz Tavares.

Ainda de acordo com o representante do sindicato dos trabalhadores, a categoria entende que os bares e restaurantes têm sido afetados significativamente com as medidas tomadas na cidade. “As empresas ficam prejudicadas com o faturamento, consequentemente, a primeira decisão que a empresa toma é diminuir o número de trabalhadores. Houve um crescimento de demissões e com a parada novamente temos essa preocupação de agir para não haver novas demissões.”

Margarida assumirá cargo com cidade na Onda Vermelha

Inicialmente, de acordo com a decisão tomada pelo Comitê Municipal de Enfrentamento e Prevenção à Covid-19, o regresso à onda vermelha vai valer, inicialmente, para o período compreendido entre 25 de dezembro e 7 de janeiro. Na ocasião, a prefeita eleita Margarida Salomão já estará na administração de Juiz de Fora.

Por meio de sua assessoria, Margarida informou, em nota, que a decisão de mudança de onda foi tomada pela Administração do atual prefeito Antônio Almas (PSDB), baseado nos dados atuais da pandemia na cidade, bem como na capacidade de atendimento do sistema de saúde. “A equipe de transição está trabalhando na atualização de todos os dados e, quando assumirmos o Governo, vamos reavaliar as decisões priorizando a segurança sanitária e buscando alternativas para minimizar os impactos econômicos e sociais”, diz no texto.

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