Cerveja especial abre caminho para turismo
Implantação de projetos como agenda de eventos, rota turística em fábricas e criação de um museu da cerveja são desejos do setor; parceria do Poder Público é fundamental para concretização
A vocação cervejeira de Juiz de Fora pode impulsionar o turismo. O crescimento e o fortalecimento do setor de cerveja especial, o primeiro a constituir um Arranjo Produtivo Local (APL), abrem espaço para atrair o público de fora para conhecer a história da bebida na cidade, a gastronomia da rede de bares e restaurantes e fazer negócios. A implantação de uma agenda de eventos regular é apontada como a primeira demanda para alavancar este potencial. Outras ideias mais arrojadas, como a criação de uma rota turística e um museu da cerveja, também são possibilidades. Neste processo, a contribuição do Poder Público é essencial, conforme a avaliação de empresários do setor.
A tradição juiz-forana na produção da bebida é um dos atrativos para o turismo histórico. O município sediou a primeira cervejaria mineira, criada em 1861 pelo alemão Sebastian Kunz, onde hoje é o Bairro São Pedro. “Nós estamos vivendo o resgate dessa história, a partir de um novo movimento de fortalecimento da produção. É importante a cidade acreditar e investir neste potencial”, avalia o tataraneto de Sebastian, Pedro Peters, que decidiu retomar as raízes da família e criar, no mesmo local, a Cervejaria Barbante. Ele conta que há planos para a criação de uma rota turística. “Fui procurado para integrar este projeto, que permitiria as pessoas visitarem as fábricas e os pontos de venda para conhecerem a história da cerveja na nossa cidade. É uma ideia muito boa, que deve ser formatada em conjunto entre o setor e a Prefeitura para poder acontecer.”
Outro fato histórico curioso sobre a produção local é que o convento construído pela Congregação Redentorista no fim do século 19, na Igreja da Glória, abriga um espaço para a fabricação da cerveja artesanal Hofbauer. O nome da marca é uma homenagem a São Maria Hofbauer, santo austríaco da congregação. Naquela época, a bebida era feita para o consumo dos padres e da comunidade. Atualmente, o padre Flávio Campos resgatou essas origens. De acordo com a assessoria da Igreja da Glória, ele reside em Belo Horizonte e vem à cidade algumas vezes por mês, mantendo a pequena produção, que é realizada de forma rústica e artesanal.
De acordo com o vice-presidente da União Cervejeira da Zona da Mata (UniCerva ZM) e proprietário das marcas Profana e Rota 040, Cristiam Nazareno Rocha, a relevância dos fatos históricos dão ao município a capacidade de criar um museu da cerveja. “Nós sabemos que existe um grande acervo com os imigrantes alemães que podem contribuir com esta ideia. É preciso todos abracem esta vocação para sermos reconhecidos lá fora.” Segundo ele, com a implantação do APL, a UniCerva ZM tem mapeado as demandas do setor para dialogar com o Poder Público o que pode ser feito para concretizá-las. “A questão tributária e os nichos que enxergamos dentro turismo estão incluídos na lista.”
Para Cristiam, o turismo histórico é apenas uma das possibilidades abertas pelo setor cervejeiro. “A cerveja pode se tornar muito mais protagonista do que é hoje. Ela pode ser a identidade local, aquele produto que o turista leva como lembrança.” Ele destaca que a bebida está entre as mais consumidas no mundo e pode incrementar até mesmo o turismo de negócios.”Nós já temos esta vocação, que tem como perfil de turista a pessoa que trabalha o dia todo e tem o tempo livre à noite, o horário para tomar uma cervejinha.” A cidade também tem criado uma cadeia produtiva em torno da cerveja especial capaz de atrair empresários.
Agenda de eventos é ponto de partida
A criação de eventos regulares que entrem para o calendário municipal é apontada como o primeiro passo para alavancar o turismo. “Temos exemplos de cidades como Petrópolis, Nova Lima, que sediam eventos mensais de cerveja especial. Juiz de Fora é um polo cervejeiro que, além de ter as fábricas que produzem a própria marca, abrem espaço para as cervejas ciganas. Temos condições de criar um agenda para o setor”, avalia o turismólogo e proprietário da marca Arthorius, Arthur Fernandes Gouvea.
Para ele, é preciso vontade política para colocar os planos em prática. “Ainda há muita dificuldade para a liberação dos espaços públicos. Não é preciso patrocínio, apenas apoio neste sentido”, opina. “Em tempos de crise econômica, os eventos podem ser uma alternativa de geração de emprego e renda. Uma agenda consistente é capaz de movimentar toda a cadeia produtiva.”
Proprietário da pizzaria Mr. Tugas, que produz a cerveja especial de mesmo nome, Hugo Siqueira concorda. “A realização de eventos regulares permite que o turista se organize para visitar a cidade. Nós temos bons exemplos no país, como é o caso de Blumenau, com o Oktoberfest, que atrai gente do mundo inteiro.” Para ele, as atrações turísticas garantem a oportunidade de ampliar os negócios. “O turista deixa dinheiro na cidade. Isto é um ganho para toda a economia.”
O secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo (Sedetur), João de Matos, garante que a Prefeitura está disposta a apoiar as iniciativas. “Incentivamos que o setor se fortaleça para que possa caminhar sozinho, independente do Poder Público, que está sempre sujeito às mudanças políticas. A criação da UniCerva ZM é um marco importante, foi por meio dela que os cervejeiros se organizaram e tiveram o reconhecimento do Arranjo Produtivo Local (APL). ”
O diretor comercial da Antuérpia, Saulo Oliveira, destaca as vantagens da APL. “Quem sai ganhando, principalmente, é o setor de serviços, como hotéis, bares, restaurantes e eventos. Essa área é a que tem maior possibilidade de ganho. É claro que até a parte da indústria é beneficiada com o homebrew, que é o cervejeiro caseiro, mas acho que tem oportunidade para todos os setores. Mas o terciário é, sem dúvida, o setor que mais tem a ganhar na cidade.”
Caminhada reúne cerveja e história
A primeira iniciativa envolvendo o setor cervejeiro e do turismo em Juiz de Fora será realizada em setembro. A Caminhada Cervejaria Escola Mirante pretende reunir um grupo de cem pessoas para conhecer pontos históricos do trajeto da Estrada de Salvaterra. Durante um percurso de cinco quilômetros, os participantes serão acompanhados por profissionais de educação física e história para realizarem a atividade e conhecer os pontos históricos principais do trajeto.
“Nós partiremos da Cervejaria, na BR-040, em direção à Estrada de Salvaterra. Passaremos pela Queijaria Santa Maria, o vagão de trem que abrigou uma escola para os filhos dos colonos das fazendas da região, e o Hotel Fazenda Salvaterra que, nos anos 30 e 40, foi ponto de encontro da sociedade juiz-forana”, conta o coordenado do evento Flávio Bitarelli. Durante a caminhada serão criados pontos para a degustação de cerveja.
Segundo Flávio, a ideia do evento surgiu em conversa com um dos sócios da Cervejaria Escola Mirante, Giancarlo Vitale. “Eu estava olhando para aquela vista maravilhosa do mirante quando comentei com o ele que poderíamos fazer um evento aproveitando aquela paisagem. A minha infância foi na Estrada de Salvaterra, então, conheço bem a história, mas sei que muitos desconhecem. Acredito que é importante fazer este resgate, trazer à tona esta memória.” As inscrições para a caminhada acontecem até o dia 30 de agosto. As informações estão descrita na página do Facebook da Cervejaria Escola Mirante.