Zona da Mata sente impactos econômicos após chuvas
Perdas financeiras atingem comércio, indústria e propriedades rurais; Situação desencadeia aumento de até 40% nos preços para o consumidor.
As cidades da Zona da Mata sentem os impactos econômicos das fortes chuvas que castigaram o Estado de Minas Gerais nos últimos dias. As más condições das estradas têm prejudicado o recebimento de insumos e o escoamento da produção das propriedades rurais, que enfrentam, ainda, perdas nas plantações por conta do grande volume de águas. A redução da oferta já desencadeou alta de preços de até 40% nos hortifrútis. Outro impacto dos temporais ocorreu na indústria, pois entre as localidades mais atingidas estão municípios que integram o polo moveleiro de Ubá. Já no comércio, há quem decidiu fechar as portas temporariamente, por motivos como falta de demanda ou invasão das águas. O prejuízo financeiro de ambos os setores ainda não foi contabilizado, mas as entidades representativas confirmam a gravidade da situação e se mobilizam para ajudar na recuperação dos locais afetados.
Na madrugada de quarta-feira (29), uma cratera se abriu no km 21 da rodovia MG-133, entre Coronel Pacheco e Tabuleiro, após o asfalto ceder por conta das chuvas. A situação provocou um grave acidente em que uma mulher de 37 anos morreu e outras seis pessoas ficaram feridas. Desde então, o trecho está interditado. Desta forma, os moradores das cidades pertencentes às microrregiões de Ubá, Viçosa e Ponte Nova, que precisam se deslocar até Juiz de Fora, devem seguir pela MG-353, no percurso por Piraúba, passando por Guarani, Rio Novo e Goianá até Coronel Pacheco, onde retomam o trajeto normal.
Sem previsão de quando o trecho da MG-133 será recuperado e com o agravante de outras áreas também terem sido atingidas pelas chuvas, as propriedades rurais da Zona da Mata tiveram impactos na produção. “A Zona Rural de Juiz de Fora está com dificuldade para o escoamento dos produtos e o recebimento de insumos”, informou o presidente do Sindicato Rural, Domingos Frederico Netto. Segundo ele, parte dos produtos consumidos pelos juiz-foranos vem de cidades da região que foram atingidas pelas chuvas.
“Importamos 75% das verduras que consumimos de municípios de Minas Gerais e Rio de Janeiro. Da nossa região ainda adquirimos legumes e frutas. Se estas dificuldades permanecerem por mais tempo, a tendência é de que os preços aumentem mais.”
Na Zona Rural de Guarani, a maior preocupação é com a produção leiteira, estimada em 70 mil litros por dia. A cidade, que decretou estado de emergência, teve várias estradas vicinais destruídas pelas enchentes, o que tem prejudicado o escoamento da produção. “Estamos tentando minimizar os impactos trabalhando para desobstruir estas vias o mais rápido possível, pois o leite é perecível. A produção chega a R$ 100 mil por dia, e esta perda prejudica muito os nossos produtores”, afirmou o prefeito Paulo Neves (PV).
Preços
Neste mês, alguns produtos já tiveram alta de até 40% na Central de Abastecimento de Minas Gerais (Ceasa), como é o caso do tomate. “Algumas produções sofrem muito com o período chuvoso, como as verduras de folha e hortaliças fruto, como abobrinha, beringela, pepino e o próprio tomate, que são mais sensíveis ao tempo. Este ano estamos enfrentando um janeiro atípico, com um volume muito grande de chuvas”, explicou o coordenador de informações de mercado da Ceasa, Ricardo Fernandes Martins.
Ele destaca, ainda, os impactos das chuvas no transporte, o que também reflete no aumento de custos. “A situação está complicadíssima. As más condições das estradas dificultam fazer a colheita e levar os produtos até o mercado. Esperamos que o tempo melhore para que a situação seja regularizada.” Segundo Ricardo, além do tomate, tiveram alta de preços o chuchu (20%), a couve-flor (23%) e a beringela (15%). A comparação de preços foi feita entre os períodos de 16 a 19 de janeiro e 23 a 26 do mesmo mês e refere-se ao comportamento destes alimentos no estado.
Os efeitos já são percebidos pelos juiz-foranos. Dono de uma loja de hortifrutigranjeiros no Mercado Municipal, Carlyle Francisco Lopes Barros tem a rotina de adquirir produtos na unidade local da Ceasa. “Hoje, para você comprar, tem que chegar mais cedo e pagar mais caro”, relata. “As cidades que mais produzem mercadoria para Juiz de Fora são Barbacena, Tocantins e Piau. Depois da cratera (na MG-133), os caminhões têm que andar muitos quilômetros a mais, o que também influencia no preço do produto.”
Os reflexos chegam ao bolso do consumidor. Produtos como tomate, abobrinha, chuchu e jiló estão até 40% mais caros. “O consumidor que levava dois quilos de tomate, agora leva um”, relata Carlyle. “A gente tenta contornar a alta de preços equilibrando os valores de outros produtos e negociando com os produtores.”
Comércio busca alternativas para conter prejuízo
O comércio localizado à margem da rodovia MG-133 está entre os que mais sofreu perdas decorrentes das chuvas. Com a abertura da cratera no km 21 da rodovia e a interdição do trecho, o movimento de consumidores tem sido praticamente nulo nesta área. Os comerciantes têm adotado medidas para minimizar os prejuízos, mas além da preocupação com a situação econômica há a insegurança sobre as condições da rodovia.
A comunidade do local diz que outros trechos da MG-133 representam riscos à população. Buracos e alagamentos seriam muito comuns, pela falta manutenção. Há insegurança com relação à ponte no km 8, entre Rio Pomba e Tabuleiro, pois ela já teria cedido anteriormente e há rumores de que isso pode se repetir.
O proprietário da lanchonete Cantinho da Roça, Carlos Augusto Vidal Costa, optou por fechar o estabelecimento temporariamente. No local, trabalham 22 pessoas.
“O prejuízo financeiro é complicado, pois eu estou investindo no espaço, fazendo obras de ampliação. Tenho que pagar meus funcionários, que também dependem da renda para sustentar as famílias. Mas até que uma solução seja tomada com relação à estrada, temos que priorizar nossa segurança.”
Na loja de conveniência A Barraca, a solução encontrada pelo sócio administrador, Carlos Eduardo Rodrigues Moreira, foi conceder férias para metade da equipe. O estabelecimento possui dez funcionários, mas agora atua com apenas cinco. “A maior parte da nossa clientela vem de Ubá, então nosso movimento está quase zerado.”
Segundo ele, o mês de janeiro costuma ser muito bom para os negócios. “É o período de retorno de férias, temos muitas pessoas passando pela rodovia para irem à Ubá e Juiz de Fora, que são dois grandes polos atrativos da região. Mas, infelizmente, este ano está sendo diferente. Espero que tudo se resolva o mais rápido possível, pois não é só o comércio que está sofrendo os impactos. Os moradores que realizam tratamento de saúde em Juiz de Fora estão sofrendo com o aumento do tempo de viagem.”
Acesso alternativo
A expectativa da população é que a construção de um acesso alternativo, por meio de uma propriedade particular localizada nesta área, seja autorizada pelo Departamento de Edificações e Estradas de Rodagens de Minas Gerais (DER-MG). A Tribuna entrou em contato com a assessoria do órgão, que informou apenas que “já sinalizou o trecho e a opção de rota para o deslocamento entre Ubá e Juiz de Fora é seguir pela MG-285, até Piraúba e depois pela MG-353, até Coronel Pacheco. O departamento está estudando a melhor solução para recuperar o local.” Não foi dada previsão de quando a rodovia será recuperada e nem a confirmação sobre a construção do acesso alternativo. A assessoria também não concedeu informações sobre os trabalhos de manutenção da estrada e as condições de conservação da ponte localizada próxima a Rio Pomba.
No estado
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de Minas Gerais (Fecomércio-MG) ainda não contabilizou as perdas do setor em função das chuvas. Mas sabendo da gravidade da situação, a entidade enviou uma solicitação ao Governo do Estado, na última terça-feira (28), pedindo a suspensão do recolhimento dos tributos estaduais devidos pelos contribuintes situados nos municípios atingidos pelos temporais. “Milhares de estabelecimentos comerciais tiveram prejuízos e alguns foram obrigados a fechar as portas”, justificou a assessoria. “A Fecomércio também requer tratamento tributário diferenciado, mais benéfico e simplificado para casos mais graves. Entre tais situações, cita os empresários do comércio das cidades em estado de emergência ou calamidade pública, cujos estoques ou mercadorias tenham perecido nas enchentes.”
Polo Moveleiro registra perdas
Dentre as cidades da Zona da Mata afetadas pelas chuvas, muitas integram o polo moveleiro da região, como é o caso de Ubá, Guidoval, São Geraldo, Tocantins e Visconde do Rio Branco. De acordo com informações do Sindicato da Indústria do Mobiliário de Ubá (Intersind), pequenas empresas destas localidades perderam tudo em decorrência das enchentes.
“Nós ainda não fizemos o levantamento do prejuízo econômico, mas sabemos que existe e, para alguns empresários, foi muito grande. Neste primeiro momento, estamos focados em ajudar para que as cidades enfrentem estas dificuldades. Estamos realizando uma campanha solidária para arrecadar alimentos, roupas, móveis e vendo outras possibilidades de contribuir para a população em geral”, afirmou o presidente do Intersind, Áureo Barbosa. O polo moveleiro é considerado o maior de Minas Gerais e um dos principais do Brasil. Reúne cerca de 300 empresas de móveis, que somam em torno de 13 mil empregos diretos.
O presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, informou que foi criada uma rede solidária entre os sindicatos do setor para ajudar as cidades mineiras atingidas pelas chuvas.
“Como parte integrante da sociedade, as empresas se uniram aos cidadãos e ao Poder Público no apoio às pessoas que sofrem com desmoronamentos, deslizamentos e enchentes.”
A iniciativa inclui a oferta de bens produzidos pelo setor que podem auxiliar na recuperação das localidades, como máquinas, equipamentos, conjuntos de equipamentos de proteção individual (EPI) e insumos de primeira necessidade.
Outros impactos
Para além dos impactos diretos na economia mineira, as fortes chuvas afetaram também o trânsito, a saúde e a rotina de moradores da região da Zona da Mata que precisam se deslocar diariamente entre as cidades. Conforme mostrado pela Tribuna de Minas, em reportagem publicada na sexta-feira (31), as cidades que integram a rota alternativa utilizada após a abertura da cratera no km 21 da MG-133 – que vai de Piraúba, passando por Guarani, Rio Novo e Goianá, até Coronel Pacheco – sentem os efeitos do aumento de fluxo de veículos e temem as consequências diante da fragilidade das vias utilizadas, muitas vezes ruas pequenas, que comportam pouco movimento.
Com a mudança no trajeto, a viagem para os moradores das cidades pertencentes às microrregiões de Ubá, Viçosa e Ponte Nova, que trabalham ou realizam tratamentos de saúde em Juiz de Fora, ficou mais longa e cara. Em alguns trechos do percurso, o engarrafamento nos horários de pico tem chegado a três quilômetros. A situação tende a piorar com o retorno às aulas a partir da próxima segunda-feira (3). Por isso, a expectativa dos municípios também é que o DER-MG autorize a construção do acesso alternativo na MG-133, que, a princípio, atenderia apenas carros, mas ajudaria a desafogar o trânsito.