Novo filme de Marcos Pimentel, ‘O silêncio das ostras’ estreia em Juiz de Fora
Filme que aborda a mineração em Minas Gerais tem sessão especial nesta quinta-feira (31), no Shopping Jardim Norte

Em Minas Gerais, onde a mineração molda paisagens e histórias há séculos, um grupo de cineastas volta suas câmeras para um enredo marcado por perdas humanas e destruição ambiental. “O silêncio das ostras”, primeiro longa-metragem de ficção do diretor juiz-forano Marcos Pimentel, estreia nesta quinta-feira (31) no Cinemais do Shopping Jardim Norte, às 19h, em sessão especial com a presença do diretor.
A obra acompanha a trajetória de Kailane, caçula de cinco irmãos, que nasce em uma vila operária e cresce vendo a paisagem e os vínculos familiares desaparecerem ao longo do tempo. Ambientada a partir da década de 1980, a história é contada pelo olhar da menina, inquieta diante das mudanças impostas pela atividade mineradora.
Na trama, a ausência se torna parte da rotina de Kailane. O tempo para ela passa em um ritmo diferente do exigido pela produtividade. Curiosa e sensível, encontra na natureza e nos pequenos detalhes um refúgio para a solidão e para o cenário transformado pela mineração.
O longa utiliza imagens reais das tragédias de Mariana (2015) e Brumadinho (2019), reforçando o tom realista de uma narrativa ficcional. O filme foi destaque na 26ª edição do Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro e marca a transição de Pimentel, documentarista premiado, para a ficção.
Da ideia ao filme: dez anos de percurso
Pimentel explica que a ideia inicial era um documentário, mas, após resistências, optou pela ficção. O projeto levou dez anos para chegar às telas. Segundo ele, a vivência próxima das comunidades mineradoras em Minas Gerais fortaleceu a narrativa.
“Trabalho com cinema há 25 anos e esse é meu primeiro longa de ficção. O filme tem os pés fincados na realidade. As histórias vieram das vilas que conheci ligadas à mineração. Com as tragédias de Mariana e Brumadinho, incorporei novos elementos e filmei parte do enredo na rota da lama, de Mariana até o Espírito Santo. Essa vivência trouxe força e verdade para a história”, afirma.
O diretor relembra os rompimentos. Em 5 de novembro de 2015, a barragem de Fundão, em Mariana, liberou cerca de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos, matando 19 pessoas e devastando comunidades e o Rio Doce. Em 25 de janeiro de 2019, às 12h28, o rompimento da Barragem I, da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, deixou 272 mortos e liberou 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos. As imagens das duas tragédias se tornaram parte da narrativa do filme.

A atriz Bárbara Collen, que interpreta Kailane na juventude, relembra a experiência de filmar nesses espaços. “Ir a campo, ouvir as histórias das pessoas, mudou tudo para mim. Até então, conhecia esses desastres apenas pela mídia. Quando se está ali, a dimensão da violência fica clara. Em uma cena, a carga emocional foi tão intensa que precisei parar e chorar antes de conseguir gravar”, relembra,
As exibições em cidades impactadas foram marcantes para o diretor. “Apresentamos o filme em Ouro Preto e em outras localidades. O público se reconhece na história. É muito forte ouvir essas pessoas dizerem que o filme traduz um pouco do que elas viveram”, diz Pimentel.
Exibição em Juiz de Fora
Com 13 prêmios e participação em festivais nacionais e internacionais, incluindo a Suíça, “O silêncio das ostras” agora chega a Juiz de Fora. Para Collen, exibir em Minas tem um significado especial: “Minas é marcada pela mineração. Esse trabalho é para os mineiros. Levar essa história para o interior é gratificante enquanto artista”.
Pimentel reforça o vínculo com a cidade: “Sempre faço questão de lançar meus trabalhos em Juiz de Fora. Foi aqui que aprendi a me conectar com o mundo. Nenhuma exibição é tão significativa quanto essa”.
Ele também destaca o crescimento do cinema local: “Há um movimento consistente no cinema mineiro. Juiz de Fora está percebendo o potencial do audiovisual como setor cultural e econômico”.
Estreia em meio a novas tensões
A estreia ocorre em um momento delicado. Na terça-feira (29), famílias da comunidade de Quéias, em Brumadinho, começaram a ser retiradas após a Agência Nacional de Mineração elevar para nível 2 a situação da barragem B1-A. A agência aponta instabilidade, mas não risco iminente de rompimento.
Pimentel avalia que o filme dialoga com o momento atual. “Precisamos repensar a forma como exploramos os recursos naturais. A mineração é apenas um exemplo. O filme fala disso a partir de uma história humana”.
*Estagiária sob supervisão da editora Gracielle Nocelli