Outras ideias com Nayara Souza Neves

Do vinho passa para o vermelho e, então, para um rosa choque que, já no fim, transforma-se em rosa bebê. Os cabelos de Nayara Souza Neves, hoje ostentando uma variação de vermelho, já foram amarelos, louros, castanhos, pretos, azuis, brancos e também não foram nada. Já foram todos raspados. E são conforme o gosto da dona. “Dependendo de onde vou, uso perucas. Tenho perucas lisas, cacheadas, longas, curtas, de várias cores. Uso maravilhosa”, ri a cabeleireira de 26 anos, que na pele também carrega outras amostras de sua originalidade. Aos 18, fez as primeiras estrelas, bem acima do olho esquerdo. Hoje são mais de dez, dentre elas, os rostos de Friedrich Nietzsche e Marilyn Monroe no braço direito. “Sou muito apaixonada por filosofia e pela Marilyn, que batiza meu salão. Sou muito fã dela como pessoa, atriz e personagem”, conta Nayara, também uma personagem de si mesma.
“Gosto de desafio, da dificuldade. As pessoas falavam que eu não arrumaria emprego se tatuasse meu rosto. Isso me motivava a tatuar. Hoje gero emprego. Gosto de provocar, de mostrar que não me enquadro num estereótipo. Quando comecei a perceber como as tatuagens mudam as relações interpessoais, me interessei ainda mais por elas. A gente se expressa pela roupa, pela pele, pelo cabelo. Em cada fase da minha vida, tenho um estilo”, defende. “A tendência do ser humano é se personalizar cada vez mais. As pessoas querem ter uma assinatura. E o cabelo colorido proporciona isso. Colorimetria é uma arte”, completa a especialista, que já pintou um único cabelo usando 12 diferentes cores. Desenvolta, a simpática mulher que pinta de oito a dez cabelos por dia, alguns simultaneamente, é toda cor. Dos tons berrantes aos mais sóbrios. “Embora eu tenha essa personalidade extravagante, sou muito tímida.”
Tons pastéis
Aos 15 anos, Nayara começou a trabalhar como auxiliar no salão de cabeleireiros de uma amiga da mãe, Leidimar. A menina nascida no Bairro São Judas Tadeu e crescida no Bairro Industrial, ambos na Zona Norte, tinha dom. E uma sobrenatural força de vontade. Trabalhava o dia inteiro e ainda arrumava energia para encarar a faculdade de comunicação social. Já no fim da graduação, saiu do salão e foi empregar-se como vendedora numa loja de suplementos alimentares. Naquele tempo, havia se encantado com o fisiculturismo, chegando, até, a participar de dois campeonatos. O salão, contudo, não a abandonou.
“Na loja, várias clientes me procuravam para eu fazer o cabelo delas. Decidi alugar a sobreloja do meu patrão. Coloquei uma cadeira, um espelho que era uma porta de guarda-roupa, um lavatório e alguns produtos. Trabalhava das 9h às 19h vendendo suplementos e, depois, até 2h da manhã fazendo cabelo”, recorda-se ela, que, para equipar o minúsculo espaço, usou da mesma sinceridade que conquista dia a dia milhares de internautas. “Chegava para os representantes e falava: não tenho crédito, não tenho dinheiro, não tenho nome, nem nada. Mas preciso e pago conforme for trabalhando.” Deu certo. “Meu sonho era fazer o mestrado e, como não passei com bolsa, abandonei a monografia e escolhi investir no salão. Não tinha a pretensão de ser jornalista, queria ser professora”, conta a empresária, que, da sobreloja, mudou-se para uma loja na Galeria Epaminondas Braga e desde janeiro está numa sala do Edifício Rossi, na Avenida Rio Branco.
Com uma equipe de quatro cabeleireiros, uma designer de sobrancelhas e uma designer de unhas, Nayara, que também emprega a mãe, uma ex-vendedora, deu nova cor à própria trajetória. “Venho de uma base muito humilde, já passei muito aperto na vida. E isso sempre foi um problema como empreendedora. Tudo o que invisto, faço com medo. Desde pequena sou ensinada que não vou conseguir, é o que tem para mim. Mas é preciso ir contra isso para conquistar as coisas”, emociona-se a filha do pedreiro Jorge Luiz e irmã de três garotos.
Arco-íris
Aos 26 anos, Nayara conhece agendas cheias para um ofício forjado no autodidatismo, em poucos, mas precisos cursos, e nas muitas batidas de cabeça. “Há dez anos, não havia tanta tecnologia em cosméticos como temos hoje. Sempre acompanhei os lançamentos e testava no meu cabelo. Já raspei várias vezes a cabeça por conta dos experimentos”, ri a empresária que segue os passos de sucesso da cabeleireira Zica, proprietária da marca Beleza Natural.
“Esse ano minha agenda encerrou em julho. Agora, no dia 21 de novembro, vou fazer um coquetel para abrir a agenda do ano que vem. O salão fica cheio. Tenho cliente que vem de Boston, da Argentina, de São Paulo. Por isso, espero abrir em janeiro o salão do Rio de Janeiro, em Copacabana, para que fique mais fácil para quem vem de fora”, pontua ela, que passa a semana na casa da mãe e os finais de semana com o namorado, na capital fluminense. Ainda que a rotina, das 9h às 24h, resulte em algum cansaço, Nayara mantém o tom de diversão no espaço todo rodeado por fotos de Marilyn Monroe.
“Num lugar onde você passa tanto tempo, tem que ter descontração”, diz a dona de muitos “lives” em seu canal no Facebook, quando confirma o ânimo. Questionada sobre os sonhos, Nayara diz querer “formar uma rede de cabeleireiros que vendam a experiência e não apenas o cabelo”. Olha para os lados, ao fim da frase, como a dizer das muitas realizações ora impensáveis. “Estou me acostumando com a ideia de que o céu é o limite.”