Val Kilmer tem vida, carreira e dramas retratados em documentário
Longe das telas devido a um câncer na garganta, ator disponibilizou centenas de horas de gravações caseiras para “Val”
Val Kilmer nunca chegou a fazer parte do primeiro time dos astros de Hollywood, por mais que fosse apaixonado pelo ofício da atuação, ficasse conhecido pelo perfeccionismo e sempre tenha demonstrado desejo de trabalhar com os melhores diretores. Com exceção ao seu Jim Morrison de “The Doors” e sua única vez com o uniforme de Batman, o ator sempre pareceu ser o coadjuvante de luxo de filmes estrelados por Tom Cruise, Robert de Niro e Al Pacino – até mesmo em “Batman eternamente”, em que era o protagonista, foi eclipsado por Jim Carrey e Tommy Lee Jones.
Depois de enfrentar o declínio na carreira, o ator – que completa 62 anos em dezembro – passou a enfrentar há alguns anos o maior drama de sua vida: um câncer na garganta, descoberto em 2016, que até foi curado rapidamente, mas com um preço: devido à radioterapia, quimioterapia e uma traqueostomia, Val Kilmer teve sua voz destroçada, uma das piores coisas que poderiam acontecer a um artista. E é a essa nova realidade que o público tem acesso em “Val”, documentário que chegou ao Prime Video no início de agosto depois de estrear no mês anterior no Festival de Cannes.
A produção dirigida pelos estreantes Leo Scott e Ting Poo poderia ter escolhido o caminho fácil de mostrar Val Kilmer como a artista injustiçado e que foi esquecido após a doença que quase o matou, ou adotar a versão chapa-branca de mostrar os grandes triunfos do artista. Felizmente, a dupla conta com o apoio do próprio ator para recordar, de forma não-linear, tanto sua carreira quanto a vida pessoal.
Ficamos sabendo, por exemplo, que ele vem de uma família rica que permitia a ele e a seu irmão, Wesley, a gravarem filmes caseiros, seus primeiros passos como ator; o drama da separação dos pais e a morte de Wesley, aos 15 anos, afogado em uma piscina após um ataque epilético. Seus primeiros passos no teatro, quando teve de ceder o protagonismo para Sean Penn e Kevin Bacon, no primeiro de muitos projetos em que ele era o segundo ou terceiro nome na lista de protagonistas.
Abalado, mas não derrotado
O documentário também abre espaço para os altos e baixos e polêmicas de sua carreira no cinema. Se “Top Secret” abriu portas em Hollywood que permitiram a ele, anos depois, ser o protagonista em “The Doors”, também vemos os testes fracassados para “Os bons companheiros” e “Nascido para matar”, o sonho e decepção com “Batman eternamente” e o caos de “A ilha do Dr. Moreau”. Neste ponto, o filme tem como trunfo as centenas de horas de gravações amadoras feitas por Val Kilmer, que mostram os bastidores de filmes como “Top Gun” e também do convívio familiar.
Se essas histórias e filmagens ajudam a contextualizar o passado, os momentos mais emocionantes e chocantes estão no passado recente, em que nos encontramos com um Val Kilmer quase irreconhecível devido ao tratamento e cirurgias depois de descobrir o câncer, com uma voz ininteligível e o buraco na garganta que o obriga a escolher entre respirar, comer e falar, como ele mesmo diz em determinado momento. Por essa razão, toda a locução é feita por seu filho mais novo, Jack, que passa a ser a “voz” do pai quando o documentário precisa se aprofundar em suas reflexões e memórias.
Há momentos no longa em que vemos o quanto a doença é capaz de abalar o ator tanto física quanto psicologicamente, como nas passagens em que ele participa de uma Comic-Con ou de uma exibição pública de “Tombstone”. Porém, a imagem de Val Kilmer é de uma pessoa que tenta, a todo custo, levar a vida da melhor forma possível a partir das sequelas deixadas pelo câncer. É um homem que está próximo dos filhos, é atencioso com os fãs, reconhece que sua carreira, agora, faz parte do passado, mas valoriza as boas lembranças. E que mantém o bom humor, faz suas pinturas, incentiva outros artistas e, por fim, tornou-se protagonista da história que realmente importa, que é a de sua própria vida.