Conselho leva denĂșncias de pacientes sobre abuso de mĂ©dico a corregedoria
SindicĂąncia tramitarĂĄ sob sigilo e poderĂĄ evoluir para processo Ă©tico profissional contra ex-vereador JosĂ© TarcĂsio Furtado
O delegado do Conselho Regional de Medicina (CRM) de Juiz de Fora e Zona da Mata, JosĂ© Nalon, informou que vai encaminhar ainda nesta terça-feira (31) um ofĂcio Ă corregedoria da entidade, em Belo Horizonte, com as denĂșncias divulgadas na imprensa sobre os supostos abusos sexuais de pacientes praticados pelo mĂ©dico e ex-vereador JosĂ© TarcĂsio Furtado, 78. Os casos começaram a vir a pĂșblico em 2012, e pelo menos trĂȘs ocorrĂȘncias foram registradas apenas este ano, umas delas no Ășltimo fim de semana. As vĂtimas relatam terem sido apalpadas por baixo da blusa, inclusive nos seios, durante consultas de clĂnica geral no Hospital SĂŁo Vicente de Paulo, no Centro.
“Ă um fato pĂșblico, de conhecimento da comunidade, e hoje mesmo despacho para a Corregedoria do CRM tomar as providĂȘncias. O corregedor, naturalmente, vai instaurar uma sindicĂąncia, dando ao denunciado o direito de defesa e do contraditĂłrio. Havendo indĂcios de infração ao CĂłdigo de Ătica MĂ©dica, evolui para processo Ă©tico profissional”, explica JosĂ© Nalon. Segundo ele, a sindicĂąncia Ă© uma fase preliminar, quando sĂŁo recolhidas informaçÔes acerca dos fatos, e tramita sob sigilo. As vĂtimas tambĂ©m podem requerer a apuração. “A pessoa que se considerar injuriada ou abusada tem o direito de fazer a representação junto ao conselho de imediato. Mas como o fato Ă© pĂșblico, fazemos o encaminhamento”, reforça o delegado do CRM.
No caso de ser aberto um processo Ă©tico profissional, o resultado serĂĄ a absolvição ou a condenação, mas as partes ainda poderĂŁo recorrer ao Conselho Federal de Medicina (CFM). Conforme JosĂ© Nalon, as sançÔes vĂŁo desde advertĂȘncia e censura confidencial ou pĂșblica atĂ© a suspensĂŁo do exercĂcio profissional por 30 dias ou a perda definitiva do registro e do direito de exercer a medicina. “Quando o caso Ă© extremamente grave, como a prĂĄtica de aborto, ou hĂĄ reincidĂȘncia de fato considerado relevante, essa possibilidade existe”, afirma o delegado do conselho. “Toda cassação Ă© sujeita a homologação do Conselho Federal de Medicina. Seria um recurso compulsĂłrio”, acrescenta.
Segundo JosĂ© Nalon, hĂĄ cerca de quatro anos JosĂ© TarcĂsio jĂĄ foi penalizado com censura pĂșblica em jornal de grande circulação na cidade, para “dar conhecimento Ă sociedade de que o mĂ©dico nĂŁo teve comportamento compatĂvel com as normas”. Apesar de o delegado do CRM nĂŁo saber informar se na Ă©poca se tratava de denĂșncias semelhantes, a Tribuna mostrou em reportagem na segunda-feira (30) que os registros de pacientes junto Ă PolĂcia Militar, relatando abusos sexuais em consultas com o mĂ©dico, foram recorrentes.
No Ășltimo sĂĄbado (28), o ex-parlamentar chegou a ser detido pela PM apĂłs uma jovem, 23, denunciar que ele teria tocado seus seios de “maneira maliciosa, ao lhe escutar com o estetoscĂłpio”, pela segunda vez em trĂȘs dias, durante consultas no Hospital SĂŁo Vicente de Paulo. Ela relatou, ainda, que o mĂ©dico teria chegado muito prĂłximo, “dando a entender que poderia estar tentando lhe encoxar”. A ocorrĂȘncia foi registrada como importunação ofensiva ao pudor. A PM lavrou um termo circunstanciado de ocorrĂȘncia (TCO), no qual o ex-vereador se comprometeu a comparecer em audiĂȘncia no Juizado Especial Criminal no prĂłximo dia 22, sendo liberado em seguida.
Médico nega acusaçÔes e alega constrangimento
Procurado novamente pela Tribuna nesta terça-feira (31), JosĂ© TarcĂsio comentou a Ășltima denĂșncia e afirmou ter atendido a jovem “de forma normal”. “NĂŁo houve excesso, atendi como atendo a qualquer outro paciente. Acho que houve mĂĄ interpretação. NĂŁo coloquei a mĂŁo no seio, mas tenho que colocar o estetoscĂłpio por baixo da mama. Se tivesse ocorrido excesso, ela podia ter alarmado, porque o hospital estava cheio de gente. Mas saiu normalmente.”
Sobre as outras duas ocorrĂȘncias registradas este ano, o mĂ©dico afirmou desconhecĂȘ-las. Em maio, uma mulher, 25, relatou ter ido ao Hospital SĂŁo Vicente de Paulo no dia 19 com dores na cabeça. Durante a consulta, o mĂ©dico pediu para a paciente se levantar e, segundo a denĂșncia, teria se aproximado dela por trĂĄs, encostando seu corpo, inclusive as partes Ăntimas. Em seguida, teria levantado a blusa dela e a virado de frente, tocando seu seio com o estetoscĂłpio e passando a mĂŁo em sua barriga.
JĂĄ em janeiro, uma jovem, 19, procurou a PM e relatou ter ido atĂ© o mesmo hospital no dia 25 com sintomas de sinusite. O denunciado tambĂ©m teria encostado seu corpo contra as costas dela, acariciado seus seios e apertado sua cintura enquanto realizava exames com o estetoscĂłpio, segundo a denĂșncia. A vĂtima acrescentou que o idoso fez vĂĄrias perguntas pessoais, como onde ela residia e qual meio de transporte utilizava para ir Ă faculdade, incluindo os horĂĄrios. A assessoria da PolĂcia Civil informou que o mĂ©dico jĂĄ foi intimado a comparecer Ă Delegacia Especializada de Atendimento Ă Mulher para prestar declaraçÔes sobre esses dois casos, investigados pela delegada Ăngela Fellet.
JĂĄ em relação a 2012, quando foi alvo de dois boletins de ocorrĂȘncia por abuso sexual registrados por duas pacientes, de 18 e 19 anos, JosĂ© TarcĂsio disse ter sido “julgado e absolvido”. Na Ă©poca, ele era vereador de Juiz de Fora e tambĂ©m negou Ă Tribuna ter praticado qualquer ato. “O que eu lamento Ă© acontecer uma coisa dessa, na minha idade, com quase 80 anos e 50 de formado”, desabafa o ex-vereador, detalhando ter realizado em sua carreira como obstetra e clĂnico geral quase cem mil atendimentos, 40 mil partos e mais de 20 mil cirurgias. Ele garante estar pronto para se defender junto Ă Corregedoria. “Nada disso vai me afetar. Me constrange, mas tenho certeza que tudo serĂĄ resolvido.” A reportagem foi orientada pelo Hospital SĂŁo Vicente de Paulo a procurar a assessoria, mas nĂŁo conseguiu contato.
TĂłpicos: abuso sexual