Em 20 anos do Disque 180, JF registra salto nas denúncias de violência contra mulher

De acordo com o painel de dados do Ministério das Mulheres, a cidade registrou número quatro vezes maior de denúncias de 2024 para 2025


Por Nayara Zanetti

30/11/2025 às 06h00

O Disque 180, principal canal nacional de enfrentamento à violência contra a mulher, completou 20 anos na última terça-feira (25). Criado para oferecer atendimento rápido e acessível, o serviço se tornou uma das mais importantes portas de entrada para acolhimento, orientação e denúncias no Brasil. De acordo com o painel de dados do Ministério das Mulheres, somente em 2025 – de janeiro a novembro – Juiz de Fora contabilizou 1.434 registros de violências e 342 denúncias por meio do Disque 180. Os dados apontam um salto na busca pelo serviço no município em relação ao ano anterior, quando os números eram: 426 violências e 85 denúncias. 

Ao longo dessas duas décadas, o 180 evoluiu de um canal emergencial para uma estrutura integrada a diferentes órgãos da rede de proteção. Para a professora e pesquisadora da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Raphaela David, o serviço amadureceu com equipes mais preparadas, articulação ampliada e maior alcance de informações, permitindo encaminhamentos mais efetivos e produção de dados fundamentais para políticas públicas. 

A especialista reforça a importância do canal em um país em que grande parte das mulheres teme procurar diretamente a polícia ou não sabe onde buscar ajuda. “O 180 funciona como um canal acessível e confiável, e é muitas vezes o primeiro passo para romper ciclos de violência.” Raphaela também destaca o papel significativo do serviço na criação de políticas públicas por meio da produção de dados sobre violência de gênero. 

A professora diz que os números revelam um cenário complexo e mostram que Juiz de Fora acompanha a tendência nacional: o salto reflete tanto o agravamento da violência de gênero quanto a ampliação do acesso aos canais de denúncia e a maior confiança das mulheres na rede de proteção. 

”É importante observar que a violência não “cresce” apenas, ela aparece mais quando os mecanismos de denúncia se fortalecem e quando campanhas de conscientização alcançam a população. Portanto, o salto numérico mostra tanto a persistência estrutural da violência quanto o papel ativo das mulheres e da rede de proteção em romper o silêncio”, avalia. 

Violência psicológica é a mais frequente 

Os dados do Ministério das Mulheres indicam que a violência psicológica é hoje a forma mais frequentemente relatada ao Disque 180, seguida pela violência física e pela violência moral. A especialista aponta que crescem também as denúncias de violência patrimonial e digital, como controle de redes sociais, espionagem de celulares e exposição não consentida de intimidade. “Ou seja, os dados reforçam que a violência contra a mulher é multidimensional e que, muitas vezes, o ciclo começa com violência psicológica e só depois evolui para agressões físicas.” 

Para ela, mapear essas tendências permite intervenções mais precoces e uma melhor estruturação das políticas de Estado para enfrentamento dessas violências, assim como para o acolhimento adequado dessas mulheres. 

Desafios persistem  

Apesar dos avanços, os obstáculos para denunciar ainda são inúmeros, como comenta Raphaela. Mulheres periféricas, com menor escolaridade ou que vivem em áreas rurais têm menos acesso à informação e aos serviços da rede. Muitas vítimas também possuem medo de revitimização ou desconfiança nas instituições, que ainda sofrem com sobrecarga e falta de integração. O estigma social, a dependência financeira e emocional e a normalização de comportamentos abusivos também são colocados pela professora como algumas das barreiras à busca por ajuda.

“O enfrentamento à violência de gênero não pode ser reduzido ao Disque 180, porque a violência é estrutural, nasce de um sistema que hierarquiza corpos, sexualidades, trabalhos e vidas. Portanto, a resposta não pode ser apenas penal ou episódica. Precisamos de políticas públicas permanentes, de investimento massivo na rede de proteção, de autonomia econômica para as mulheres e de instituições que não reproduzam o machismo que deveriam combater”, afirma a especialista. 

A advogada aponta que o avanço das denúncias também expõe um país que ainda naturaliza práticas violentas e oferece respostas desiguais às mulheres. A conclusão, para ela, é que enfrentar a violência de gênero é uma escolha política para transformar estruturas e não apenas administrar emergências. 

Sobre o Disque 180 

A Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 é um serviço de utilidade pública para o enfrentamento à violência contra as mulheres. A ligação é gratuita, e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana. Conforme o Ministério das Mulheres, o Ligue 180 presta os seguintes atendimentos: 

  • orientação sobre leis, direitos das mulheres e serviços da rede de atendimento (Casa da Mulher Brasileira, Centros de Referências, Delegacias de Atendimento à Mulher (Deam), Defensorias Públicas, Núcleos Integrados de Atendimento às Mulheres, entre outros.;
  • informações sobre a localidade dos serviços especializados da rede de atendimento;
  • registro e encaminhamento de denúncias aos órgãos competentes;
  • registro de reclamações e elogios sobre os atendimentos prestados pelos serviços da rede de atendimento. 

É possível fazer a ligação de qualquer lugar do Brasil ou acionar o canal via chat no Whatsapp (61) 9610-0180. Em casos de emergência, deve ser acionada a Polícia Militar, por meio do 190. 

Locais de atendimento em Juiz de Fora 

Como consta no site do Ministério das Mulheres, as vítimas de violência contra mulher podem recorrer aos seguintes serviços: 

  • Casa da Mulher: Av. Garibalde Campinhos, 169 – Vitorino Braga. Telefone: (32) 3690-7292 / (32) 3690-5559 
  • Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam): R. Jarbas de Lery Santos, 1655 – Centro. Telefone: (32) 3229-5822
  • HPS Dr. Mozart Geraldo Teixeira: Av. Barão do Rio Branco, 3408 – Bom Pastor. Telefone: (32) 3690-8358 / (32) 3690-8100

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