Cerveja especial é a nova aposta de JF
Juiz de Fora teve a vocação como produtora de cervejas especiais reconhecida. O setor cervejeiro é o primeiro a constituir um Arranjo Produtivo Local (APL) na cidade, e o primeiro do segmento em Minas Gerais. Na sexta-feira (26), representantes do Governo estadual, da Prefeitura e empresários se reuniram em solenidade para a criação do APL, que atesta a importância da atividade econômica e abre espaço para incentivos do poder público ao fortalecimento da cadeia produtiva. O caminho até este reconhecimento mostra a maturação de um setor que começou como hobby de apreciadores da bebida, se profissionalizou ao longo dos anos e vem ganhando cada vez mais mercado. Os números comprovam: a produção local é de 350 mil litros por mês, a mesma quantidade que foi feita ao longo de todo o ano de 2013, quando a cidade já almejava ser um polo cervejeiro. Em comparação com o ano passado, quando foram produzidos, em média, 140 mil litros por mês, a fabricação mais do que dobrou.

é de 350 mil litros por mês (Foto: Fernando Priamo)
Os dados se referem à produção de 11 cervejarias, responsáveis por 14 marcas locais registradas pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). O trabalho de cervejeiros caseiros não entra na conta. Até por isso, o setor tem adotado a diferenciação entre as nomenclaturas “cerveja especial” e “cerveja artesanal”, sendo o primeiro termo usado para se referir aos produtos que são comercializados no mercado. Os tipos da bebida são difíceis de serem contabilizados. Só no Bar São Bartolomeu são feitas 28 cervejas especiais diferentes. “Sabemos que o cliente quer inovação e está aberto a experimentar. Então, a cada dois meses, lançamos, pelo menos, duas cervejas novas”, explica o sócio gestor do bar e presidente da União Cervejeira da Zona da Mata (UniCerva ZM), Alexandre Vicente Vaz.
Segundo ele, a própria criação da UniCerva ZM, no ano passado, surgiu da necessidade de organização do setor. “Hoje temos uma cadeia produtiva, que gera emprego e renda. Além das cervejarias, temos fábrica de equipamentos e outras empresas que trabalham indiretamente”, diz. “Para a constituição do APL, foi feito um estudo técnico pelo Governo do estado, que mostrou que o setor cervejeiro é uma atividade econômica forte em Juiz de Fora.” Para Alexandre, as expectativas, a partir de agora, são “as melhores possíveis” e incluem a possibilidade de impulsionar o turismo gastronômico. “Queremos transformar a cerveja especial numa identidade para a cidade, resgatando as nossas raízes históricas, já que fomos pioneiros na fabricação.”
Pioneirismo alemão no séc. XIX
A primeira cervejaria mineira foi criada em 1861 pelo alemão Sebastian Kunz, onde hoje é o Bairro São Pedro em Juiz de Fora. “Naquela época, a cervejaria era o ponto de encontro dos imigrantes alemães”, conta o tataraneto de Sebastian, Pedro Peters, que decidiu resgatar as raízes da família e criar, no mesmo local, a Cervejaria Barbante. “Comecei a produzir em 2007, de forma artesanal e descompromissada, para o consumo entre amigos. Em seguida, abri o restaurante, consegui o registro no Ministério, e a produção aumentou.”
A cervejaria fabrica dois mil litros por mês, sendo que 70% é vendido no estabelecimento e 30% em outros bares juiz-foranos. “Nesses anos, vi a evolução do mercado, a aceitação do produto pelo consumidor e a consolidação do setor. É muito satisfatório ver Juiz de Fora retomar este posto de polo cervejeiro que ela teve no passado. Para mim, mais do que um negócio, a cerveja especial é um projeto pessoal.”
Pedro Peters posa com orgulho em frente ao antigo maquinário utilizado por seu tataravô, na primeira cervejaria mineira, em 1861; abaixo, uma amostra da sua produção atual
Consumo cresce 10% ao mês

Um dos maiores desafios dos cervejeiros foi conquistar o consumidor. “Convencer o mercado que tínhamos um produto de qualidade não foi fácil, mas desde que o mercado se abriu, ele está em ascensão”, relata o diretor-comercial da Antuérpia, Saulo Oliveira. A taxa de crescimento do consumo da marca é de 10% ao mês. Para atender a demanda, a cervejaria produz cem mil litros por mês, que são distribuídos para o mercado local, outras cidades mineiras e dos estados do Espírito Santo, Rio de Janeiro, Goiás e Distrito Federal. Para 2018, está previsto um projeto de expansão. “Queremos dobrar o tamanho da fábrica, passar de 800 para 1.600 m², e contratar mais pessoas. Temos 60 funcionários.”
Foi também pela demanda crescente que o cervejeiro Cristiam Nazareno Rocha ampliou a produção da marca Profana e expandiu os negócios com a criação da marca Rota 040. Até 2016, ele trabalhava no modelo de cervejaria cigana, em que o produtor aluga espaço em uma fábrica para a produção da sua marca. “Em fevereiro deste ano, a nossa fábrica começou a operar.” A produção é de dez mil litros por mês. “Queremos aumentar essa capacidade em dez vezes. Estamos enxergando o mercado e criando uma estrutura para atendê-lo.”
Neste sentido, os cervejeiros acreditam que quanto maior a oferta, melhor. “Sair da produção caseira para ganhar o mercado exige muito estudo e técnica. O fortalecimento do setor aconteceu à medida em que os produtores se profissionalizaram”, avalia o fundador da Timboo, Mário Ângelo. Ele defende que o registro de novas marcas é positivo. “Não falamos em concorrência, pois o consumidor busca inovação. Não existe uma fidelidade a um tipo ou uma marca, por isso, o aumento da oferta só contribui para o setor.” Segundo ele, os bares e restaurantes procuram oferecer variedade. “Fundamentei meu trabalho na cerveja especial. No meu bar, não vendo apenas a minha marca, e muitos outros estabelecimentos também trabalham assim.”
Novos nichos
Outros nichos de mercado também passaram a ser explorados pelo setor. “A aceitação do juiz-forano tem sido grande. O consumidor entende que é uma bebida diferenciada e tem levado este conceito para as festas particulares”, conta o sócio-proprietário da Arthoris, Arthur Fernandes Gouvea. Para este ano, ele tem agendado o atendimento de quatro casamentos. “Nós estávamos acostumados a ver os cantinhos de comida, agora as festas trazem, também, o da cerveja especial.”
Setor traz novos rumos para o Turismo
A vocação cervejeira de Juiz de Fora pode trazer novos rumos para o turismo. Para os produtores, a criação dessa identidade fortalece o mercado interno e contribui para atrair novos consumidores. “A cerveja especial pode impulsionar o turismo gastronômico. Podemos criar um calendário de eventos para atrair o público de fora”, avalia o sócio-proprietário da Arthoris, Arthur Fernandes Gouvea, que também é turismólogo.
A expectativa é que o APL possa favorecer este movimento. “Existe uma nova consciência se formando entre os cervejeiros, que estão mais preparados para a produzir; o consumidor, que está mais aberto à experimentar; e o poder público, que reconheceu o nosso trabalho”, analisa o sócio proprietário das marcas Profana e Rota 040, Cristiam Nazareno Rocha.
A presidente da Abrasel Zona da Mata, Carla Pires, concorda. “Podem surgir oportunidades de negócio, parcerias e eventos.” A entidade é uma das organizadoras do evento “Um Brinde a Juiz de Fora”, feira cervejeira que reúne os rótulos locais desde sexta-feira (26), no Morro do Imperador. “O evento já entrou no calendário da cidade e com o fortalecimento das cervejarias, aliado à tradição histórica alemã, pode-se alavancar a festa a algo extremamente turístico, como ocorre em cidades como Blumenau (que tem a Oktoberfest)”, destacou o secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo (Sedetur), João de Matos.
A cerveja especial pode impulsionar o turismo gastronômico. Podemos criar um calendário
de eventos para atrair o público de fora
Arthur Gouveia, cervejeiro e turismólogo
Para o assessor da Sedetur, Marcos Henrique Miranda, o impacto positivo no turismo é um caminho natural que foi trilhado pela evolução do setor cervejeiro. “O APL é um reflexo do amadurecimento dos cervejeiros, que se qualificaram e fortaleceram a cadeia produtiva. Nosso desejo é ter uma agenda organizada de eventos para que a cidade continue neste caminho, garantindo os desdobramentos positivos dessa evolução, inclusive para o turismo.”
Festa cervejeira começa ao meio-dia
Neste domingo (28), a festa cervejeira continua no Morro do Imperador. No último dia do evento “Um Brinde a Juiz de Fora”, que integra o Corredor Cultural da Funalfa, estão agendados shows e a feira, com as marcas de cervejas especiais Antuérpia, Arcana, Arthorius, Barbante, Brauhaus, Grizas, Leopoldina (RS), Mr. Tugas, Profana, Rota 040 e São Bartolomeu. A programação cultural começa ao meio-dia, com o Coletivo Essence. Às 18h, tem samba e MPB com Thiago Miranda.
A cervejaria São Bartolomeu e a Grizas disponibilizam transfer gratuito saindo da Estrada Engenheiro Gentil Forn 1.690, São Pedro, a partir do horário de início do evento, e retornando ao mesmo ponto. A estrada de acesso ao Morro do Imperador no sentido Centro estará interditada para estacionamento a partir do meio-dia. O ônibus que faz a linha também terá o ponto de embarque do transfer como final. Segundo a Settra, agentes de trânsito estarão no local para orientar a população.