Especialistas de JF comentam proibição de 1.200 novos produtos de cabelo e barba pela Anvisa
Dentre os cosméticos estão marcas usadas em salões de beleza e outras que fazem parte da linha chamada ‘não profissional’
Nas prateleiras, uma variedade de produtos de cabelo que vão desde pomadas, ceras, gel, spray e cremes para cabelos e barba. Elas prometem um resultado que garante fixação para penteados, modelagem de cachos, durabilidade de tranças, alisamento, efeito escurecedor, alta definição e aparência de molhado. Para quem prefere um toque mais seco, algumas chegam também a oferecer a aparência mate. Contudo, é preciso ficar atento, já que algumas marcas dos produtos citados acima integram a lista da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que cancela imediatamente sua comercialização.
Foi em dezembro que surgiram as mais recentes medidas responsáveis por tirar uma série de produtos do mercado. A primeira decisão foi o cancelamento de registro de 500 produtos para alisar ou ondular cabelos. E, mais adiante, no dia 28 do mesmo mês, 1.266 pomadas para fixar ou modelar cabelos também se tornaram imediatamente proibidas. Nesse último caso, o cancelamento foi fruto de uma ação contínua da agência, não relacionada com episódios de reações adversas, mas resultado das novas regras para pomadas editadas em setembro.
Na época, a ementa divulgada pela Anvisa exigia requisitos técnicos para rotulagem e embalagem, que dispunham da definição, classificação e parâmetros para controle microbiológico. Isso ocorreu no mesmo mês em que uma série de produtos de cabelo foram cancelados. Já em novembro, o montante de pomadas proibidas continuou em crescimento e chegou à marca de 1.741.
Fiscalização em relaxamentos
Na prática, as mudanças nessas resoluções impactam diretamente toda uma cadeia de pessoas, como a cabeleireira Luciana Miranda, 39 anos, que há dez anos atende em um salão localizado no Jóquei III, Zona Norte de Juiz de Fora. As moradoras do bairro são as pessoas a quem ela dedica todo o seu trabalho como especialista em cabelos crespos e cacheados.
“Eu viajava sempre para outras cidades para buscar técnica e produto sobre os quais tivesse segurança e tranquilidade na aplicação”, explica, ao passo que compartilha o sentimento de apreensão com a lista divulgada pela Anvisa – que adverte diversos tipos de cremes relaxantes. Isto porque Luciana descobriu que um dos produtos que ela usava estava sendo citado.
“Senti preocupação, pois há mais de cinco anos trabalho com a mesma empresa e com a química. Todos os meus reconhecimentos profissionais foram através do trabalho feito com essa química”, explica a cabeleireira. Segundo ela, os dois carros-chefes do estabelecimento são os alisamentos e aberturas de cachos – ambos os procedimentos usam o creme relaxante. Diante disso, ela procurou a empresa The Class, responsável pela fabricação dos produtos de relaxamento que ela utiliza nas clientes.
Em uma nota da instituição aos clientes da marca, a empresa se diz surpresa com a proibição da sua loção ativadora e creme relaxante. “Gostaríamos de assegurar a você que a The Class está tomando todas as medidas necessárias para reverter essa situação. Imediatamente após o cancelamento, que já entramos com recursos junto à Anvisa”, diz o comunicado.
O recurso faz referência a uma possível falta de notificação da Anvisa sobre os produtos registrados em 2019. Cátia Lins, diretora da empresa, informou que não recebeu um alerta sobre o problema na rotulagem até ver o nome da empresa na lista da Agência. A empresa afirma que, em 2022, entrou com um processo de novo registro e novas testagens, em conformidade com a resolução de 2020. “Dessa forma os próximos lotes fabricados por nossa empresa já seguirão com os novos números de processo, garantindo a continuidade do fornecimento dos nossos produtos”.
A The Class afirmou, em seguida, que a formulação e o teor do produto continuariam os mesmos, uma vez que o problema seria apenas em uma palavra do rótulo.
Coexistência
A execução dos novos parâmetros da Resolução de Diretoria Colegiada permite que sejam comercializados os produtos feitos até dia 20 de dezembro de 2023, em um movimento de coexistência entre os produtos fabricados antes do cancelamento do registro e os novos. A empresa, de antemão, havia preparado o estoque para o mês de janeiro e pausado as atividades de produção exatamente na mesma data. Com isso, Cátia acredita que o produto não vai sair do mercado, uma vez que os novos rótulos já estão sendo produzidos e estarão sendo comercializados a partir de fevereiro.
Casos de reações adversas acendem sinal de alerta
Camila Alves, 24 anos, tem cabelos castanhos escuros que, em várias pequenas “molinhas”, recaem sobre o ombro. Mas, em outros momentos, seu cabelo toma forma de trança pelas mãos de sua trancista. Ela questiona a indústria de cosméticos e uma possível falta de investimento em pesquisa em produtos para determinado segmento. “Eu acabo levando para o contexto racial. Parece que, para nós, não há muito interesse em pesquisar se são bons ou não. Na minha cabeça, isso tem muito a ver com quem consome determinado produto.”
A recorrência de casos de reações adversas é outro fator que pode ser somado a esse cenário, uma vez que os motivos do cancelamento das pomadas sem enxágue foram vinculados também a tais episódios. A Anvisa atribuiu a proibição de alguns desses produtos a fatores como formulações que possuem 20% ou mais de álcoois etoxilados, o uso do termo “pomada” no nome ou rotulagem, forma física declarada “pomada” ou terem tido pelo menos um produto sob sua titularidade temporalmente associado a evento adverso grave notificado à Anvisa.
Irritação ocular
Em fevereiro de 2023, uma mulher procurou a urgência e emergência em oftalmologia da Agência de Cooperação Intermunicipal em Saúde Pé da Serra (Acispes), em Juiz de Fora. Ela se queixava de dor e vista embaçada, fruto de uma reação alérgica à pomada usada enquanto fazia trança. Um mês antes, a Anvisa já havia proibido determinadas pomadas para tranças.
A trancista Eskarlate Rodrigues, 30 anos, acrescenta outras causas aos efeitos negativos de algumas pomadas. Na sua concepção a forma como um profissional informa seu cliente, o modo como a lavagem é realizada e a qualidade do produto interferem diretamente na segurança do cliente. “Eu, particularmente, uso a pomada. Ela me ajuda muito na finalização e já faz algum tempo que eu tenho o costume de utilizar o mesmo produto. Graças a Deus, nunca tive problema.”
Uma alternativa procurada por ela é sempre procurar o selo de certificação da Anvisa, o que traz seguridade para Eskarlate e é um conselho repassado Às clientes. “Às vezes, elas chegam ao salão com uma pomada que eu não uso ou não conheço. Então eu as oriento a usar uma de qualidade que tenha no salão”, ela esclarece. A informação sobre o melhor produto não é a única forma usada por ela para orientar as clientes. Eskarlate também instrui sobre o processo de lavagem dos cabelos.
“O ideal é nunca lavar com a cabeça para baixo, uma vez que o recomendado é manusear o cabelo fazendo com que o resíduo de produto do couro cabeludo vá para as pontas”, ela esclarece. Ademais, a cabeça também deve estar inclinada para cima, a fim de evitar o contato com os olhos, desencadeando alguma reação alérgica. “Shampoo, condicionador, máscara, são produtos que não podem ter contato com os olhos porque podem causar irritação e não é diferente com a pomada. É preciso usar conforme informado no rótulo da embalagem”, conclui a trancista.
Cuidados com a barba
Não são somente produtos para cabelos que apareceram na lista de cancelamento da Anvisa. As pomadas para barba, de algumas marcas, também foram mencionadas. Sobre isso, a barbeira Letícia Dias, 25 anos, explica que o produto é usado, principalmente, em bigodes mais desenhados, mas, ainda assim, outros métodos seriam mais recomendados.
“O ideal é fazer a higiene com xampu para limpar o pelo e a pele, sem agredir ou ressecar. Em seguida, usar o ‘balm’ para hidratar, proteger do calor e modelar”, explica. Já nos casos em que a procura é por uma modelagem mais firme, a estratégia é procurar produtos com base saudável e facilmente removíveis com água, bem como livres de petrolatos – compostos à base de petróleo.
“Para barbas maiores, também é importante usar um óleo para barba, para conseguir levar a hidratação até a ponta desse fio. Mas, ao fazer a higiene adequada e privilegiando produtos de formulação mais natural, não há perigo algum”, afirma Letícia, com base também nas certificações da Anvisa.