Vagas para idosos são ocupadas irregularmente na área central
Só no primeiro semestre deste ano, 375 autuações foram feitas nos pontos exclusivos para pessoas acima de 60 anos

Mais de dez mil idosos de Juiz de Fora têm credencial que autoriza o estacionamento de seus veículos nas 122 vagas reservadas para eles nas áreas de estacionamento rotativo. Muitos, porém, reclamam de dificuldades para ocupar estes locais, muitas vezes tomados indevidamente. Uma prova do desrespeito são as 375 autuações de automóveis sem credencial feitas pela Settra somente entre janeiro e junho deste ano nestas vagas. Mas o problema vai além. Há casos em que veículos com credenciais ocupam o rotativo por longos períodos do dia e até por vários dias consecutivos quando a credencial permite como tempo máximo 180 minutos. A Tribuna recebeu denúncias e acompanhou a ocupação das vagas na parte baixa da Rua Batista de Oliveira, no Centro, durante mais de duas semanas seguidas. No local, das sete vagas reservadas para pessoas acima de 60 anos, o jornal encontrou até três ocupadas por veículos com credenciais, mas que permaneciam horas além do prazo e com placas de “vende-se” nos capôs.
De acordo com Carlos Roberto Gomes, de 64 anos, o problema tem sido constante na região central, onde ele encontra dificuldades para fazer uso dessas vagas. “Naquela região da Getúlio Vargas com a Batista tem muitas vagas de idosos, mas quase todas preenchidas com vendedores de carros, inclusive com a credencial. Eles ficam ali o dia todo, parece que não tem uma fiscalização em cima disso.” Para o aposentado, a situação se agravou com a gratuidade do setor rotativo para idosos. Desde abril deste ano, o município conta com a Lei nº 13.685, que concede isenção de pagamento na Área Azul para idosos credenciados. Para isso, é necessário deixar no painel do carro o cartão fornecido pela Settra, que garante acesso às vagas reservadas às pessoas acima de 60 anos. O que deveria ser algo positivo e um benefício para esta faixa etária está sendo instrumento de abuso dos que não respeitam o sistema de rodízio de estacionamento.
Monitoramento
A Tribuna acompanhou a dinâmica na Rua Batista de Oliveira, setor 35 da Área Azul entre os dias 30 de julho e 17 de agosto. Nas observações iniciais, em 30 e 31 de julho, a reportagem notou dois veículos à venda na via, ambos com credencial, parados nas mesmas vagas, nos dois dias. Em 9 de agosto, foi feito um monitoramento entre 9h e 11h, nos quais os mesmos veículos da semana anterior permaneciam estacionados durante todo o tempo. No dia 13 de agosto, a reportagem voltou ao local, e nada havia mudado.
Um dos carros estacionados entre as ruas São Sebastião e Floriano Peixoto aparentava abandono, mesmo com indicação de estar à venda, além de ter permanecido na mesma vaga durante todos os dias de checagem. O outro chegou a trocar de vaga, mas sempre na mesma região, próxima à esquina com a Avenida Getúlio Vargas, e nas reservadas para idosos. Na última terça-feira (14), a equipe da Tribuna passou pela via em três horários diferentes: 13h, 15h e 19h. Durante o período, além dos outros dois veículos que já haviam sido flagrados, um terceiro estava estacionado em vaga exclusiva para idosos, também com credencial e com cartaz de “vende-se”. Na quarta-feira (15), a reportagem passou pelo local às 9h30, 13h30 e 16h30. Dois automóveis com indicação de venda permaneceram estacionados nas vagas durante todo o intervalo, enquanto o terceiro deixou o local entre 13h30 e 16h30. Nesta sexta-feira (17), o jornal esteve novamente na via e ainda encontrou um carro sendo vendido em área destinada aos idosos. (Confira na galeria)

Segundo informações da assessoria de imprensa da Estapar, empresa responsável pelo gerenciamento da Área Azul, o monitoramento das vagas é realizado por agentes de controle e por veículos equipados com câmeras, que fazem a leitura das placas dos automóveis. “Ao fim do período de gratuidade concedido ao idoso, que são de três horas, no máximo, o usuário tem de retirar o veículo da vaga. Se o veículo permanecer no local após o limite máximo permitido na vaga, conforme regulamentação do local-área, os dados são enviados para central de monitoramento da Settra.” Ainda de acordo com a empresa, “a Estapar não é responsável pela aplicação das multas tampouco tem o poder de verificar se a credencial é de fato do condutor do veículo.” Já a Settra informou que esse tipo de fiscalização faz parte da rotina da pasta. Só na Batista, neste ano, já foram 522 autuações por estacionamento irregular de uma maneira geral, envolvendo áreas não só de vagas para idosos, como para pessoas com deficiência e carga e descarga, por exemplo.
Abuso nas vagas para idosos e deficientes
Além das 375 autuações de veículos sem credencial estacionados em vagas de idosos, outras 400 multas de estacionamento em vagas para pessoa com deficiência também foram aplicadas pela Settra no primeiro semestre deste ano. As 775 autuações representam, em média, mais de quatro abusos flagrados por dia nas vagas reservadas. Os valores ainda apontam cem ocorrências a mais que em 2017, quando foram registradas 675 notificações nos seis meses iniciais. Desses números, 220 representam irregularidades observadas em vagas destinadas a deficientes e 455, a idosos.
De acordo com o artigo 181 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), estacionar irregularmente o veículo em vagas reservadas para pessoas com deficiência ou idosos constitui infração gravíssima, sujeita a multa de R$ 293,47 e sete pontos na carteira de habilitação. Em casos de flagrantes desta e outras infrações de trânsito, é possível acionar a equipe de agentes de fiscalização pelo telefone 3690-7400.
‘Educação para cidadania’

O uso impróprio de vagas reservadas às pessoas idosas pode ser visto como uma questão da acessibilidade e convívio urbano, de acordo com o gerontólogo José Anísio Pitico da Silva. “Usar indevidamente o direito de outra pessoa é um aspecto de educação para cidadania que falta em todos nós, de modo geral. Em relação às pessoas idosas, por conta da invisibilidade social desse segmento que cresce cada vez mais, o respeito devido e necessário a essa faixa está muito ausente nas nossas relações sociais.”
Para Pitico, é necessário um trabalho maior de conscientização no trânsito. “Aquele que ainda não é idoso precisa respeitar devidamente o benefício destinado à pessoa idosa, bem como às pessoas com deficiência. Não posso generalizar, mas são comportamentos que, às vezes, presenciamos ou acompanhamos na leitura da sociedade, pessoas que querem se beneficiar desrespeitando direito dos outros. É preciso ter essa conscientização.”
Gratuidade no estacionamento
Segundo a vereadora Ana Rossignoli (MDB), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Idosos da Câmara Municipal, muitas reclamações sobre desrespeito às vagas reservadas chegam ao Legislativo, inclusive em relação ao uso por vendedores de veículos na Rua Batista de Oliveira. “O importante é continuar fiscalizando e conscientizando que a pessoa idosa tem esse direito que deve ser respeitado.” As reuniões da Comissão serviram como principal base para criação da Lei nº 13.685, que prevê a gratuidade de estacionamento na Área Azul para idosos. “É importante estarmos sempre em contato com a população e ver a necessidade do dia a dia. Essa ideia surgiu nesses encontros, e a Câmara viu a possibilidade de o projeto se tornar realidade”, explica o vereador André Mariano (PSC), autor do projeto de lei.
Credencial
Para adquirir a credencial que dá direito ao uso das vagas reservadas, a pessoa acima de 60 anos deve apresentar cópia da carteira de identidade e comprovante de residência do município de Juiz de Fora, na Settra (Rua Maria Perpétua 72, 5º andar – Bairro Ladeira), de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 14h às 18h. Não há cobrança de taxa para o serviço, válido na data de aniversário do beneficiário, devendo ser renovado todo ano.