Juiz de Fora completa mais um ano sem implementaĆ§Ć£o de novas ciclovias
Com inĆcio de obras estimadas para o final do ano passado, ciclovia Ć s margens da Avenida Brasil ainda nĆ£o saiu do papel
Faz 17 anos desde que a Ćŗnica ciclovia de Juiz de Fora, com cerca de 2,2 quilĆ“metros de extensĆ£o, foi inaugurada no anel viĆ”rio do campus da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), no ano de 2006. Desde entĆ£o, a criaĆ§Ć£o de corredores de trĆ¢nsito exclusivamente dedicados aos ciclistas juiz-foranos em outras partes da cidade ainda nĆ£o saiu do papel. Mesmo com propostas e projetos criados em diversas gestƵes do Executivo municipal, as ciclovias de Juiz de Fora esbarram em entraves.
O Ćŗltimo anĆŗncio relacionado ao tema aconteceu no inĆcio de marƧo de 2022. Na Ć©poca, a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) divulgou a intenĆ§Ć£o de iniciar, atĆ© o final daquele mesmo ano, as obras relacionadas Ć implementaĆ§Ć£o de uma ciclovia Ć s margens da Avenida Brasil e em quase toda a extensĆ£o do Rio Paraibuna, comeƧando pelo Bairro Ponte Preta, na Zona Norte, atĆ© chegar ao Bairro Vila Ideal, na regiĆ£o central da cidade. Entretanto, o projeto tĆ©cnico, que foi finalizado em 2020 por meio de uma parceria da Prefeitura com a MRS, continua engavetado por falta de recursos necessĆ”rios para sua execuĆ§Ć£o.
A informaĆ§Ć£o Ć© da prĆ³pria PJF, conforme nota enviada Ć Tribuna. Apesar da falta de recursos, de acordo com a Secretaria de Planejamento do TerritĆ³rio e ParticipaĆ§Ć£o Popular (Seppop), um grupo de trabalho (GT) formado por diversas secretarias municipais continua realizando estudos para a implantaĆ§Ć£o de novas ciclovias na cidade. “AlĆ©m disso, em paralelo, estamos em processo de captaĆ§Ć£o de recursos para viabilizaĆ§Ć£o das obras”, afirmou a pasta.
Em entrevista Ć Tribuna em marƧo do ano passado, o SecretĆ”rio da Seppop, Martvs das Chagas, apontou que, inicialmente, as obras seriam realizadas entre os bairros Santa Terezinha, na Zona Nordeste, e PoƧo Rico, na Zona Sudeste. Ele tambĆ©m ressaltou que, na Ć©poca, a PJF ainda estava em busca de empresas interessadas em contribuir financeiramente para que a obra em questĆ£o fosse viabilizada.
‘Fluidez e inclusĆ£o’
Com mais de 30 anos de experiĆŖncia nos pedais, a cicloativista e presidente da AssociaĆ§Ć£o Juiz-forana de Ciclismo (AJFCiclismo), Giovanna Rezende, avalia a implantaĆ§Ć£o de uma ciclovia Ć s margens do Rio Paraibuna poderia proporcionar fluidez e inclusĆ£o para a populaĆ§Ć£o. “A ciclovia serĆ” de extrema importĆ¢ncia para o municĆpio, devido ao seu posicionamento estratĆ©gico. Ela tambĆ©m serĆ” democrĆ”tica, pois existem muitas pessoas que trabalham na regiĆ£o central e que precisam se deslocar em grandes distĆ¢ncias diariamente. Isso nĆ£o contempla somente aqueles que praticam o ciclismo como atividade fĆsica ou de lazer”, afirma.
Mesmo que atualmente as calƧadas da Avenida Brasil jĆ” estejam pavimentadas, possibilitando o trĆ”fego de bicicletas no local, a soluĆ§Ć£o, paliativa, Ć© vista como uma “via multi uso extremamente precĆ”ria”, na visĆ£o de Giovanna. “NĆ³s entendemos que, na atual situaĆ§Ć£o da via, hĆ” um enorme prejuĆzo na fluidez do trĆ¢nsito, alĆ©m da inseguranƧa para os transeuntes que utilizam o mesmo trajeto compartilhado com as bicicletas. O termo ciclovia refere-se Ć estrutura construĆda exclusivamente para o trĆ¢nsito de bicicletas, segregada das vias que transitam automĆ³veis, com a restriĆ§Ć£o atĆ© mesmo de uso pelos caminhantes. Ć o que o Manual de SinalizaĆ§Ć£o ViĆ”ria do Conselho Nacional de TrĆ¢nsito acertadamente define, instrui e regulamenta assim. Por ser um espaƧo atraente para caminhantes, um projeto bem elaborado de ciclovia sempre prevĆŖ tambĆ©m espaƧo dedicado para prĆ”tica de corrida e caminhada segregado da ciclovia e, obviamente, das vias em que trafegam automĆ³veis”, avaliou a cicloativista.
Lei sobre ciclovias nĆ£o regulamentada e abandono de ciclorrotas
Em contraponto Ć perspectiva apresentada pela PJF da falta de verbas para a execuĆ§Ć£o de novas ciclovias no municĆpio, a Lei 12.726/2012, que dispƵe sobre a implantaĆ§Ć£o do Plano Diretor CicloviĆ”rio Integrado de Juiz de Fora, determina que ao menos 20% do montante financeiro arrecadado com multas de trĆ¢nsito na cidade devem ser aplicados na construĆ§Ć£o de ciclovias e na elaboraĆ§Ć£o de programas educativos para a promoĆ§Ć£o do ciclismo. Entretanto, passados mais de dez anos desde a aprovaĆ§Ć£o do dispositivo legal pela CĆ¢mara Municipal de Juiz de Fora, a mesma nĆ£o foi regulamentada, de acordo com o Executivo municipal.
Enquanto isso, as ciclorrotas, Ćŗnica medida efetiva implantada pela AdministraĆ§Ć£o municipal nos Ćŗltimos anos para incentivar a locomoĆ§Ć£o por meio da bicicleta nos corredores de trĆ¢nsito na cidade, estĆ£o abandonadas. De acordo com o Conselho Nacional de TrĆ¢nsito (Contran), uma ciclorrota Ć© definida por “via sinalizada que compƵe o sistema ciclĆ”vel da cidade, (…) de forma a indicar o compartilhamento do espaƧo viĆ”rio entre veĆculos motorizados e bicicletas, melhorando as condiƧƵes de seguranƧa na circulaĆ§Ć£o”. Entretanto, as referidas sinalizaƧƵes, implantadas em 2016 em diversas vias de Juiz de Fora, nĆ£o tĆŖm passado por manutenĆ§Ć£o, segundo os ciclistas.
Na visĆ£o do diretor social da UniĆ£o Ciclistas de Juiz de Fora e RegiĆ£o (Unicicli), Wilhans Moraes, a atual situaĆ§Ć£o da mobilidade urbana do municĆpio configura um retrocesso em relaĆ§Ć£o Ć s conquistas garantidas pelos ativistas anos atrĆ”s, com a implantaĆ§Ć£o das ciclorrotas. “NĆ³s sentimos que Juiz de Fora estĆ” retrocedendo nesse sentido, mesmo com tudo que jĆ” conquistamos desde entĆ£o. Mais recentemente, a Prefeitura argumentou para as principais associaƧƵes de ciclistas da cidade que uma nova resoluĆ§Ć£o do Contran impediria que as ciclorrotas jĆ” existentes continuassem em atividade. Sendo assim, o que nĆ³s vemos hoje Ć© um abandono dessas estruturas, tendo em vista que muitas pinturas no chĆ£o, que indicam a presenƧa da ciclorrota aos trafegantes, jĆ” sumiram ou estĆ£o desaparecendo aos poucos. Eles nĆ£o fazem mais a manutenĆ§Ć£o dessas sinalizaƧƵes horizontais se justificando justamente nessa leitura equivocada das normas do Contran”, afirma Moraes.
Para Giovanna Rezente, cicloativista e presidente da AJFCiclismo, a situaĆ§Ć£o tambĆ©m Ć© considerada inadequada e atĆpica. “Entendemos que a desativaĆ§Ć£o da rede cicloviĆ”ria de Juiz de Fora Ć© uma desobediĆŖncia Ć prĆ³pria lei, tendo em vista que a cidade possui um plano de mobilidade. Por mais defasado que ele esteja, sua validade legal vai atĆ© 2024. Ou seja, se a PJF desativa ciclorrotas que estĆ£o vigentes no plano de mobilidade do municĆpio, Ć© um movimento ilegal”. A Tribuna questionou ao Executivo municipal sobre a questĆ£o da manutenĆ§Ć£o das ciclorrotas que existem no municĆpio, assim como se as mesmas continuam oficialmente ativas, mas nĆ£o recebeu retorno atĆ© o fechamento desta ediĆ§Ć£o.
AlĆ©m disso, a questĆ£o da nĆ£o regulamentaĆ§Ć£o da lei e a falta de manutenĆ§Ć£o de vias em que seria possĆvel trafegar de forma segura com bicicletas destacam a importĆ¢ncia da criaĆ§Ć£o de novos instrumentos efetivos para garantir a seguranƧa dos ciclistas da cidade. “Com a pandemia, o nĆŗmero de ciclistas que trabalham com entregas de aplicativo aumentou exponencialmente. Hoje, em busca de seguranƧa, eles trafegam na contramĆ£o, para serem vistos, alĆ©m de usarem as faixas exclusivas dos Ć“nibus, na ilusĆ£o de que eles estariam segregados dos carros. Na verdade, o risco de acidentes aumenta muito quando eles trafegam desta maneira. A falta de estruturas dedicadas aos ciclistas expƵe, cada vez mais, a necessidade da implementaĆ§Ć£o de estruturas dedicadas ao transporte por meio da bicicleta”, alega.