Jovens do Centro Socioeducativo podem ser liberados por falta de comida


Por Daniela Arbex

12/09/2016 às 20h02- Atualizada 13/09/2016 às 12h09

Atualizada às 21h23

Juíza revelou que a despensa da instituição está completamente vazia e com suprimentos insuficientes para manter as refeições (foto: Divulgação)
Juíza revelou que a despensa da instituição está completamente vazia e com suprimentos insuficientes para manter as refeições (foto: Divulgação)

A juíza da Infância e Juventude, Maria Cecília Gollner Stephan, ameaçou o Estado de Minas Gerais e prometeu mandar para casa os 75 adolescentes internados no Centro Socioeducativo Santa Lúcia se a Secretaria de Estado de Defesa Social não regularizar até às 6h desta terça-feira (13) o pagamento de fornecedora de alimentação para a unidade de privação de liberdade. Nesta segunda, a magistrada revelou que a despensa da instituição está completamente vazia e com suprimentos insuficientes para manter as refeições desta terça-feira. A juíza informou, ainda, que o problema de alimentação no Santa Lúcia se arrasta desde março, quando completou três meses de atraso no pagamento do fornecedor, e que a diretora da unidade chegou a comprar comida para um fim de semana com o próprio cartão de crédito.

WhatsApp Image 2016 09 12 at 20.09.26“Paciência tem limite. Isso não pode acontecer”, desabafou a magistrada que já assinou a saída dos 75 adolescentes, sendo 39 de Juiz de Fora e 36 da região. De acordo com a decisão, os adolescentes cumprirão medida socioeducativa domiciliar, que prevê a impossibilidade de se “ausentar da residência”, o que só deverá ocorrer em caso de doença e na companhia do responsável (ver documento). O Estatuto da Criança e do Adolescente não prevê essa medida. Segundo Maria Cecília, a decisão de colocar adolescentes acautelados em casa teria amparo legal na Lei de Execução de Medidas Socioeducativas, de 20 de janeiro de 2012.

Segundo a juíza, a APL Comércio e Serviço, uma empresa do Mato Grosso do Sul, é a responsável por fornecer cinco refeições diárias para os jovens, mas enviou ontem ofício para a Justiça informando que não tem como manter o pagamento dos funcionários e nem como pagar o vale transporte para a equipe que prepara as refeições no Santa Lúcia, em Juiz de Fora. A direção da unidade chegou a arcar com a despesa do vale-transporte dos cozinheiros da empresa em algumas ocasiões.

“Em julho, eu já fiz constar que iria colocar todos os meninos na rua se não tomassem uma providência. Aí regularizaram um pouquinho. Eles mandam alimentação para dois, três dias, mas, se não ficar em cima, eles não mandam. Eu avisei a Subsecretaria de Atendimento das Medidas Socioeducativas (Suase) que colocaria os meninos em medida socioeducativa domiciliar desde julho se não fosse restabelecido isso. Quando foi hoje, às 15h39, a empresa avisou a diretora do Santa Lúcia que devido ao não recebimento das notas fiscais desde junho não tem como pagar vale-transporte e salário dos funcionários, correndo o risco de os mesmos não comparecerem à unidade de trabalho”, explicou a juíza que mostrou fotos do estoque zerado da unidade, com pouquíssima quantidade de gêneros alimentícios. “Se até às 6h a alimentação não estiver estabelecida, todos os 75 adolescentes serão entregues às suas famílias em medida socioeducativa domiciliar, porque é um absurdo o Estado ficar enrolando desde março. Eu não tenho outro jeito. Isso será feito até o Estado restabelecer a alimentação. Restabelecendo, nós buscamos os nossos meninos. A gente não brinca, dá oportunidade, o que é possível aceitar a gente aceita, mas chega num ponto que não tem mais condição. Eu avisei a eles. Não tem comida? Todos serão entregues aos familiares”, anunciou a magistrada que não descarta fechar o Santa Lúcia caso o problema persista.

Os problemas no Centro Socioeducativo não são recentes. A unidade é palco de violência e casos de evasão há vários anos. Em abril de 2016, um adolescente de 14 anos foi assassinado dentro do alojamento onde era mantido com outros dois jovens. E em menos de um ano, conforme reportagem recente da Tribuna, 12 fugas ocorreram na unidade, que tem problemas com falta de pessoal.

A fuga mais recente aconteceu no último dia 9, quando um jovem de 17 anos evadiu após derrubar o porteiro. A unidade também já registrou um episódio de suicídio.
No ano passado, toda a diretoria foi destituída pela juíza da Infância e Juventude, Maria Cecília Gollner Stephan, em função de omissão e de condutas violadoras, como a negligência com a saúde dos adolescentes e o impedimento de os jovens frequentarem a escola.

As irregularidades incluíam, ainda, superlotação, denúncias de tortura contra jovens acautelados e falta de infraestrutura para o atendimento dessa população. Na ocasião, pelo menos 20 rapazes dormiam em colchonetes no chão, metade deles na enfermaria transformada em dormitório improvisado. Três diretores foram afastados e novos servidores nomeados pela juíza na tentativa de reverter o quadro.

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