Bota-foras ilegais se espalham pela cidade
Desde o início deste mês, Juiz de Fora está sem um local de despejo de resíduos da construção civil. O único bota-fora autorizado, que funcionava na Cidade do Sol, Zona Norte, foi fechado e, agora, resta aos caçambeiros despejarem o entulho no Aterro Sanitário de Dias Tavares. O proprietário do terreno, que é alugado pela Prefeitura, Daniel Bellini, disse que notificou todos os caçambeiros no último dia 31 sobre a decisão de fechamento e informou que só permitirá novos depósitos após o Município apresentar o licenciamento ambiental. O secretário de Meio Ambiente de Juiz de Fora, Luis Claudio Santos Pinto, considerou “arbitrária e ilegal a atitude do locatário”, tendo em vista que o Executivo possui contrato de aluguel firmado até 2017 e que não havia nenhuma irregularidade. Ele informou, ainda, que o bota-fora será interditado pela Prefeitura ainda nesta semana e que as atividades no local serão encerradas.
E um problema leva ao outro. Sem ter onde realizar o descarte dos restos de construção civil, os proprietários de caçambas se dizem acuados: ou suspendem a prestação de serviços às construtoras, ameaçando o setor, ou realizam despejos em locais irregulares, contribuindo para a proliferação dos bota-foras ilegais por toda a cidade. Para evitar as notificações, alguns empresários estão alugando terrenos para guardar os recipientes cheios ou transformando algumas regiões em verdadeiros cemitérios de caçambas. Entre os bairros Mariano Procópio e São Dimas, somente na manhã de ontem, a Tribuna flagrou pelo menos umas 20 caçambas abandonadas nas vias, como Professor Godinho e Avenida Brasil.
Pela legislação do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) desde 2002, o município já deveria ter encontrado um local definitivo para receber os entulhos da construção, entretanto, há doze anos a cidade convive com locais paliativos. O Plano Municipal de Gerenciamento de Resíduos Sólidos da Construção Civil, que promete dar um fim à novela, ainda não saiu do papel e a perspectiva é que seja, de fato, concluído no fim do ano que vem.
Desde 2012, o terreno na Cidade do Sol foi alugado pelo Município e apresentado como alternativa de descarte dos resíduos sólidos até 2015. Mas com depósitos diários de cerca de 200 caçambas, no início deste ano, o local já chegava ao esgotamento. Ontem a Tribuna voltou ao bota-fora e encontrou a cava que deveria ser preenchida com entulhos visivelmente bem acima do que era previsto. Em meados do ano, o descarte começou a ser realizado em nova área – de cerca de cem mil metros – dentro do terreno da Cidade do Sol.
Situação considerada preocupante
Sem acesso ao aterro na Cidade do Sol e sem outra área autorizada para descarte viável, caçambeiros protestam. A Associação dos Transportadores de Resíduos da Construção Civil (Astrecc) informou que a situação afeta até mesmo a construção civil já que não estão conseguindo atender a demanda. Outra situação é denunciada pela própria associação: os descartes irregulares estão transformando a cidade em um enorme bota-fora. Na Zona Norte e em bairros da Cidade Alta, é fácil encontrar áreas de despejos clandestinos.
“Não temos como trabalhar, e o prejuízo é enorme. Atendo várias empresas e faço de 14 a 20 viagens por dia e, agora, não estamos podendo assumir compromisso.E a população também não entende que não temos caçamba disponível. O problema é que quem trabalha seriamente está com todas as caçambas cheias, e outras empresas estão jogando os entulhos em locais inapropriados, e ficam com caçambas livres”, denunciou uma empresária.
Quem passa pelos bairros Mariano Procópio até o Cerâmica consegue visualizar vários recipientes transbordando entulhos de obras, abandonados. Só na Avenida Brasil, no trecho entre o futuro shopping Jardim Norte e o Viaduto Ramirez Gonzalez, são cerca de 15 recipientes. Outras são vistas nas vias adjacentes.
Um outro empresário, 63, alugou um terreno na Rua Professor Godinho, no Mariano Procópio, para deixar as caçambas. “Vou pagar R$1.500 de aluguel até uma definição da Prefeitura e enquanto isso não posso trabalhar. Não tenho mais caçamba vazia. Pagamos a Prefeitura mais de R$ 2 mil por mês, arcamos com a cotização do aluguel do terreno e não temos o bota-fora.”
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Juiz de Fora, Leomar Delgado, disse estar preocupado com a situação pois, mesmo com o preço especial oferecido pelo aterro, o valor das caçambas acaba ficando muito elevado. “Estamos aguardando uma solução, mas as obras não ficarão paralisadas. Pode ser que as construtoras comecem a acumular entulho, mas estamos trabalhando para reduzir esses resíduos.”
Denúncias
O secretário de Atividades Urbanas, Sérgio Rocha, disse que mobilizou todo o departamento de fiscalização no sentido de coibir o descarte irregular desde o dia em que foram informados do fechamento. “Imaginamos que a prática fosse aumentar e, por isso, montamos uma estrutura de plantão para fiscalizar, articulando com a Guarda Municipal e a PM. Alguns autos de infração já foram lavrados, principalmente na Cidade do Sol, Caeté, Remonta e Ponte Preta. Mas contamos com apoio da população para denúncias.”
Necessidade de recuperar terreno degradado
No dia 27 de outubro, houve uma reunião entre a Procuradoria de Meio Ambiente, integrantes da Prefeitura e o locador da área da Cidade do Sol. Segundo o proprietário da área, Daniel Bellini, na ocasião, ele foi informado da condição ambiental. “A Prefeitura não providenciou as licenças ambientais para adentrar na segunda área. Até então, eu não tinha tido acesso a pasta dos licenciamentos, e os promotores me informaram que, para a área antiga, onde existe a pedreira, o Município apresentou apenas a licença de operação corretiva, que já estava vencida e era insuficiente. E, para a nova área, possuem só permissão para intervenção em Área de Preservação Permanente (APP), que é só o primeiro passo para o licenciamento de fato. Então, os promotores me advertiram verbalmente. Se eu compactuar, estarei também cometendo crime ambiental. Por isso contratei uma assessoria jurídica”, explicou Bellini.
O secretário de Meio Ambiente, Luis Claudio Santos Pinto, explicou ter procurado o Ministério Público para realizar um termo de ajustamento de conduta (TAC). O objetivo era obter a licença de operação corretiva, um dos processos para a regularização ambiental e que permite a recuperação da área degradada. “O Ministério Público entendeu que esse termo deveria ser assinado entre as secretarias de Meio Ambiente e a de Obras, e é o que faríamos. Inclusive, havia interesse do locador em assumir a gestão do aterro. Ao contrário do que foi falado, estamos cumprindo o contrato e estava tudo em tramitação até a ruptura do locador. Processo ambiental não se faz da noite para o dia, tem que haver recuperação da área degradada, e tínhamos contrato firmado com ele até 2017. As licenças estão sendo providenciadas”, garante Luis Claudio.
A Promotoria de Meio Ambiente informou que não foi apresentado laudo técnico aprovando o bota-fora da maneira em que estava e, por isso, não foi possível oferecer aval ao processo. Foi concedido prazo de 30 dias para que a Prefeitura informasse que providências seriam tomadas e outro de 60 para apresentação de cronograma para efetiva implementação do Plano Municipal de Gestão dos Resíduos da Construção Civil. O Ministério Público entendeu que faltava documentação comprobatória, ou seja, ainda são insuficientes os laudos sobre os danos ambientais.
Intervenção da PM
Na terça-feira, funcionários da Secretaria de Meio Ambiente estiveram no local, acompanhados da PM, para tentar restabelecer o uso do bota-fora. Contudo, foram impedidos pelo locador. “Vale lembrar que o resíduo da construção é de responsabilidade do gerador, ou seja, as construtoras. A Prefeitura atuava para evitar bota-foras irregulares. Temos o aterro de Dias Tavares e conseguimos um preço melhor de imediato”, diz o secretário. Contudo, os caçambeiros alegam que a distância e os valores cobrados são inviáveis.