Álvaro Borges: cozinhando, tocando, construindo

Conheça o produtor e instrumentista que mistura gêneros musicais, vivências e instrumentos em seu trabalho

Por Elisabetta Mazocoli, sob supervisão do editor Marcos Araújo

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Álvaro diz que “sempre quis ser músico, sempre fui músico”, mesmo antes de saber o que precisava fazer para se tornar um (Foto: Matheus Pereira/ Divulgação)

Álvaro é um produtor e instrumentista que veio de Belém para Juiz de Fora há cerca de oito anos. Antes disso, morava em Montes Claros, no norte de Minas Gerais, depois foi para Governador Valadares – e a família é toda de Vitória da Conquista e de Salvador. Sabe tocar ao menos sete instrumentos diferentes (violão, guitarra, bateria, percussão, cavaquinho, banjo, baixo e ainda um pouco de teclado e piano), estuda música todos os dias, conversa com quem for sobre o gênero musical que quiser e que aprendeu nesse caminho todo. Ele pode ser visto toda terça-feira no Ruela, com o grupo de samba JJ, ou nas noites de samba do Zezinho. Geralmente está quieto, reveza entre beber cerveja e tocar, e fica focado no que tem que fazer. Absorve todo o entorno com sede.

Desde criança, vive com a música cotidianamente, uma presença diária por influência do entorno. Sua família também tem muitas pessoas que sabem tocar, e cedo ele foi aprender também o violão. “Eu sempre quis ser músico, sempre fui músico”, diz. Antes mesmo de saber o que precisava fazer para se tornar um, já sabia que era isso que o motivava. A sua caminhada ajudou que ele pudesse também conhecer muitas músicas de diferentes formas, seja MPB, rap, samba ou tecnobrega. “Era muito eclético, e por eu ter morado em vários lugares, também tive muito contato”, explica. A própria tradição de violeiros e cantadores de Conquista também o influenciou.

Perceber que podia trabalhar como produtor foi uma forma de levar a música para ainda mais uma parte da sua vida. “Eu sempre fui curioso. Eu já tinha noção do que era o trabalho de produtor, porque sempre fui muito nerd nessas coisas, sempre quis saber história de gravação, vídeo de estúdio…Quando você ama muito música, você quer saber como a parada é feita”. Ele teve o primeiro contato com esse mundo ainda na faculdade, quando amigos explicaram para ele como poderia produzir tendo poucos recursos, no próprio computador. Desde então, tem se aventurado como pode e se aperfeiçoado.

Ele é conhecido em muitos lugares por Cozinhando Sample, apesar de seu nome como produtor ser ALIBI, se inspirando no produtor Madlib e fazendo junção com as próprias iniciais. O Cozinhando pegou porque foi adotado inclusive nas redes sociais, e também porque o músico começou mesmo sampleando as músicas. Como ele mesmo admite, a comparação é boa. “A música e a comida têm muitos paralelos”, diz. E também deixa claro, sobre o trabalho: trata-se de separar os ingredientes, preparar tudo, realizar os cortes, misturar, desenvolver o sabor. Depois, só resta degustar.

O prazer com a música

Tocar no Zezinho e no Ruela começou a partir de uma brincadeira com os amigos, uma vontade de fazer algo de que gostavam juntos. “A tia do Zezinho endossou, e aí começou a encher, encher, encher… até que encheu muito”, ri. Nesse momento, no carnaval do ano passado, eles perceberam que precisavam se organizar para criar um bloco, em que as pessoas realmente pudessem ir sem dar problema para eles. É o que vai acontecer no dia 16 de fevereiro. “Gostamos de tocar o que a gente gosta de ouvir. Acho que isso fez dar certo”, diz.

Parte dos amigos resolveu formar um grupo, o JJ, para que pudessem se profissionalizar e passar a cobrar para tocar em outros lugares. Até então, tocavam no Zezinho de graça, só pra ver algo que sentiam faltar nas saídas em Juiz de Fora. “Juiz de Fora é muito carente de rolê de rua, eu sentia muita falta. Existe pouco incentivo para isso”, diz. E desde então, foram sendo chamados para cada vez mais coisas, e pela primeira vez ele passou a ganhar dinheiro por tocar. Agora, faz cada vez mais planos – quer também se aventurar no jazz, aprender mais bateria, escrever e lançar suas músicas autorais.

Mas não deixou de fazer música por prazer hora nenhuma – tanto no que diz respeito à parte de instrumentista quanto também de produtor. Alguns de seus lançamentos, como a produção em “Maré de azar” e também em “20 anos nunca mais”, são provas disso. “É trabalho, às vezes é chato e cansativo. Mas tem um momento que é aquele que todo mundo conhece, quando tem algo especial com alguma coisa, seja jogando bola, escrevendo ou transando, em que você entra em um estado de hiper concentração que você não tá nem mais pensando, você só tá existindo, fazendo aquilo. Essa é a melhor sensação do mundo. Você só está existindo no agora e pra isso”.

Música é feita em grupo

Durante a conversa, surgem muitos nomes – gente com quem ele já trabalhou, com quem ele aprendeu, que o incentivou, e também pessoas que ficaram no caminho entre Belém, Vitória da Conquista e Juiz de Fora. Tem o Set e o Everton, que o incentivaram a entrar na música, o Igor e o Daniel, que começaram o samba com ele, a Marina, que o convidou para fazer uma trilha de música pela primeira vez, o Baapz, que o chamou para produzir música indie, a mãe e o pai, que escutavam música em casa. Álvaro não esquece de quem passa, nem das suas referências. É absorvendo um pouco de cada um que ele cresce e se coloca no mundo: como quem é capaz de reconhecer todas essas pessoas e buscar o que elas têm de melhor para si.

Para ele, o fim nunca é o lançamento. Confessa que tem até um pouco de dificuldade nisso, acaba sempre procrastinando para divulgar o que faz. “Teve uma vez que descobriram que eu fiz a trilha sonora de um filme, e até amigos meus não sabiam que eu fazia”, diz. Sua meta para 2023 é mudar um pouco isso, mas à sua maneira. “Quero lançar as minhas coisas sem ligar para número, like, pensando só no que eu gostaria de ver e mostrar”.

A música que ele faz e na qual acredita também é assim: feita a muitas mãos, compartilhada por quem gosta, experimentada como a melhor das comidas. “Música é uma coisa que você tem que fazer com a galera. Porque você tem que fazer pros outros. Tem que fazer pra ti também, mas é pros outros. Quando você faz sozinho, é igual viver. Você fica mais fechado para críticas, pra mudança”, diz. Em sua visão, a música é uma coisa do momento. E arremata: “Você tem que ter convicção das suas ideias, mas não pode ficar preso nelas”.

 

Elisabetta Mazocoli

Elisabetta Mazocoli

Elisabetta Mazocoli é uma repórter formada pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e pós-graduanda em Escrita e Criação pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Escreve a coluna "Sem lenço, sem documento", que conta a história de artistas, artesãos e pessoas que trabalham com cultura em Juiz de Fora, mas que nem sempre são conhecidos pelo grande público. Também escreve matérias de cidade, educação, saúde, cultura e diversos outros temas. É autora do livro-reportagem "Do lado de fora: dez perfis de mulheres anônimas", escrito como Trabalho de Conclusão de Curso, e se interessa por jornalismo literário. No tempo livre, escreve e lê literatura, se interessa por produções audiovisuais, viaja, cuida de gatos e aprende línguas. [email protected] LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/elisabetta-mazocoli/

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